Articulista que usa do humor para criticar pessoa que exerce cargo público, sem a intenção de difamar, injuriar ou caluniar tal autoridade, não abusa da liberdade de expressão. Com base nesse entendimento, a 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro negou recurso do ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) contra a Infoglobo, que publica o jornal O Globo.
Cunha — que está preso preventivamente desde outubro e foi condenado a 15 anos e 4 meses de prisão pelo juiz federal Sergio Moro — moveu ação contra a editora devido a um artigo do colunista Arnaldo Jabor, publicado n’O Globo em 18 de março de 2014.
No texto, Jabor, de forma sarcástica, cita o acirramento das tensões entre PT e PMDB para dizer que esta legenda “é a salvação da democracia; suja, mas muito nossa”. Tal “reabilitação” do país, segundo o cineasta, passaria por figuras como José Sarney, Renan Calheiros e Cunha.
“O Eduardo Cunha, que era o ‘coisa ruim’, virou ‘coisa linda’, pois ele é um técnico, um expert tenaz em acochambramentos e perfídias brasilienses. Antes, nossas revoltas eram desorganizadas, sem rumo. Edu nos devolveu o orgulho e consolidou um projeto de militância”, ironiza Jabor no artigo.
Mas Cunha não achou graça e foi à Justiça. De acordo com ele, o texto feriu seus direitos de personalidade. O pior, para ele, foi ter sido chamado de “coisa ruim”. Isso porque tal termo, entre os evangélicos, como ele, representa o diabo, responsável por todos os males do mundo. Dessa forma, o peemedebista pediu indenização por dano moral.
A ação foi negada em primeira instância, e o ex-presidente da Câmara dos Deputados recorreu. No TJ-RJ, o relator do caso, desembargador Marco Aurélio Bezerra de Melo, disse que quem lê o texto logo conclui que se trata de uma “crônica lírica e humorística”. Além disso, o magistrado destacou que, conforme o artigo, o que é “pérfido” e dado a “acochambramentos” é a política brasiliense, e não Cunha.
Com fundamento na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, Melo afirmou que o fato de o texto criticar alguém não gera o dever de indenizar. Na visão do desembargador, isso só ocorre quando o autor abusar do direito de informar ou tiver a intenção de ofender ou humilhar certa pessoa — o que não ocorreu no caso de Jabor e Cunha, a seu ver.
O relator também apontou que, por ocupar cargo público à época da publicação do texto, Cunha estava sujeito às críticas da sociedade. Especialmente por ele já ser alvo de denúncias relacionadas à operação “lava jato”, que culminaram com seu afastamento da Presidência da Câmara, a cassação de seu mandato, sua prisão preventiva e consequente condenação.
Dessa maneira, Marco Aurélio Bezerra de Melo votou por negar a apelação de Eduardo Cunha. Os demais integrantes da 16ª Câmara Cível do TJ-RJ seguiram seu entendimento.
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Apelação 0409114-02.2014.8.19.0001