As cerca de 200 famílias que estão no assentamento Milton Santos, em Americana (SP), podem continuar em suas casas. A Justiça Federal em São Paulo determinou que a terra onde está o assentamento é do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que não figurou no polo passivo da ação e, por isso, a terra não pode ser devolvida à empresa Usina Ester, que pleiteava a proprieade. Sendo assim, não pode haver reintegração de posse. A decisão foi publicada no dia 16 de maio, encerrando um capítulo de uma discussão judicial que se arrasta há mais de 40 anos.
Os últimos episódios dizem respeito à posse do terreno, hoje chamado Sítio Boa Vista. Em 2005, quando o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) começou a ocupar o sítio, tinha a intenção de fazer um programa de assentamento social autossustentável, a que deu o nome de Milton Santos. Mas percebeu que a sucroalcooleira Usina Ester estava no local, e ajuizou a ação de reintegração de posse.
A primeira instância deu uma liminar em favor da autarquia, e a empresa recorreu ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Depois de uma liminar do relator, desembargador André Nekatschalow, que manteve a propriedade com o Incra, o colegiado cassou a decisão monocrática e determinou a reintegração de posse à Usina Ester.
É aí que a discussão remonta aos anos 70. O terreno pertencia ao Grupo Abdalla, um dos maiores grupos empresariais do país, mas que já não existe mais (a Usina Ester alega que é sucessora do grupo na posse do terreno). Em 1976, o governo federal expropriou o imóvel, com base no Ato Institucional 5/1968, e entregou a posse ao INPS, antiga autarquia da previdência social. No ano seguinte, o INPS passou o terreno ao Iapas, extinta autarquia de pagamentos da previdência.
O INSS nasceu e entrou na história em 1990, quando INPS e Iapas foram fundidos em uma só autarquia previdenciária. Com isso, o terreno passou a ser de posse do INSS. Antes disso, em 1981, o Grupo Abdalla entrou na Justiça pedindo uma indenização à União pela desapropriação do Sítio Boa Vista. Nove anos depois, em outubro de 1990, a Justiça Federal condenou a União a pagar R$ 13,6 milhões ao Abdalla.
Em 2005, o INSS passou o terreno para o nome do Incra, para que pudesse dar início ao seu projeto de desenvolvimento social Milton Santos, ou PDS Milton Santos. A discussão sobre quem é o dono da terra advém dessa reintegração de posse.
Como a decisão do TRF-3 discute se a posse do terreno é do Incra ou da Usina Ester, o INSS entrou com uma Oposição. Alegou que a posse, na verdade, era dele, e o Incra estava apenas ocupando a terra. O pedido foi negado em primeira instância, e o TRF-3 deu nova liminar. Afirmou que há “indícios” de razão ao INSS. A decisão do dia 16 de maio foi uma confirmação dos indícios apontados pelo TRF.
Em decisão interlocutória na ação de reintegração de posse, o juiz federal Maurício Yukikazo Kato escreveu: “Verifico que o INSS não participou da relação processual e, embora esteja sujeito à eficácia natural da sentença, a norma individual e concreta dela originada não lhe é oponível”.
Em outras palavras, o INSS é parte na ação, mas não foi arrolado. Como parte, sofreria os efeitos da decisão. Como não foi arrolado, a restituição do título executivo à Usina Ester, que teria efeitos sobre a propriedade do INSS, não poderia acontecer, já que não participou do processo.
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