TJ-SP anula cláusula que não responsabilizava instituição de pagamento por fraudes
27 de maio de 2025, 14h31
Qualquer cláusula que isente o fornecedor de arcar com os efeitos nocivos decorrentes de sua própria atividade, mesmo que fora das relações de consumo, deve ser considerada nula. Assim, a 22ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo anulou uma cláusula de chargeback (ou de retenção de valores) no contrato entre uma instituição de pagamento e uma empresa de venda de ingressos. O colegiado também confirmou a necessidade de devolução dos valores retidos.

TJ-SP anulou cláusula que isentava instituição de pagamento por possíveis fraudes nas compras
O chargeback é um mecanismo pelo qual o usuário pode contestar determinada compra à instituição de pagamento (tipo de estorno). Uma cláusula de retenção de valores define que, em situações do tipo, o vendedor (quem contratou a instituição de pagamento) não receberá os valores — ou seja, ele é responsabilizado por fraudes nas transações.
Na ação, a bilheteria on-line alegou que a instituição de pagamento reteve de forma indevida os valores de algumas transações eletrônicas contestadas pelos titulares dos cartões, com apontamentos de possíveis fraudes. A ré afirmou que isso estava previsto em cláusula “firmada livremente entre as partes”.
Em primeira instância, a instituição de pagamento foi condenada a restituir a quantia de R$ 623,8 mil à bilheteria.
Ao recorrer, a ré alegou que não é responsável pelas compras não reconhecidas e que a autora se responsabilizou por tal risco quando assinou o contrato. A empresa de tíquetes também apresentou recurso pedindo a anulação da cláusula de chargeback.
Garantia de segurança é dever
O desembargador Roberto Mac Cracken, relator do caso no TJ-SP, indicou que a instituição de pagamento é responsável por promover todas as medidas necessárias para proteger “os interesses daquele que se utiliza dos seus serviços”.
Ele também explicou que os meios de pagamento são alvo constante de estelionatários. É comum “a ocorrência de ilícitos por meio de transações na rede mundial de computadores, realizadas com a utilização de cartões de crédito”.
Por isso, é dever da ré garantir a segurança não só dos compradores, mas também do vendedor, que paga pelo serviço por meio de uma quantia fixa e do repasse de um percentual sobre cada transação. O magistrado ressaltou que a instituição de pagamento é quem tem as informações necessárias para investigar eventual fraude.
Mac Cracken observou que a ré não apresentou documentos para demonstrar a existência das contestações de compras on-line. Já a autora não conseguiria comprovar isso, pois não recebeu as supostas reclamações.
Na visão do relator, a cláusula de retenção de valores, que isenta a ré da responsabilidade por fraudes, aparenta ser potestativa. Cláusulas potestativas são aquelas que submetem os efeitos de um contrato ao puro e livre arbítrio de uma das partes e, por isso, são consideradas inválidas.
Ele também viu na cláusula de chargeback indícios de autotutela — que é a possibilidade de uma parte tomar medidas de forma unilateral para proteger seus interesses. Isso também não é admitido pela legislação, afirmou o relator.
Clique aqui para ler o acórdão
Processo 1093817-29.2022.8.26.0100
Encontrou um erro? Avise nossa equipe!