Opinião

Basileia 1, 2 e 3: papel dos acordos na regulação de riscos, incluindo climáticos

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23 de maio de 2025, 19h35

As pressões exercidas pelos Estados Unidos para enfraquecer a força-tarefa do Comitê da Basileia, dedicada à regulamentação de riscos climáticos, trazem à tona uma discussão que remete diretamente à natureza e à função dos chamados Acordos de Basileia.

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Após sucessivas crises financeiras globais — incluindo a crise do petróleo na década de 1970 —, ficou evidente a necessidade de um conjunto mínimo de regras para reforçar a estabilidade do sistema financeiro internacional. Nesse contexto, o chamado “banco central dos bancos centrais”, o Banco de Compensações Internacionais (BIS — Bank for International Settlements), criou o Comitê de Basileia para Supervisão Bancária (Basel Committee on Banking Supervision — BCBS).

A proposta central sempre foi estabelecer uma base sólida e padronizada para que instituições financeiras pudessem avaliar e gerenciar seus riscos de forma prudencial. Além de favorecer a estabilidade, essa harmonização regulatória buscava assegurar condições mais equitativas de competição entre os bancos internacionalmente ativos, algo essencial diante da crescente internacionalização dos mercados financeiros.

Além das recomendações voltadas à regulação prudencial, o Comitê também publica os chamados Basel Core Principles, princípios essenciais que orientam a supervisão bancária eficaz, sendo amplamente utilizados como referência internacional para avaliação da qualidade da supervisão em cada país. O Banco Central do Brasil é membro do Comitê desde 2009.

Quanto aos Acordos de Basileia, temos hoje três marcos principais

O Acordo de Basileia 1, publicado em 1988, foi o primeiro esforço internacional coordenado para definir um padrão mínimo global de capital para bancos. Seu foco recaiu sobre o risco de crédito, com exigência de um índice mínimo de capital sobre os ativos ponderados pelo risco. Em 1996, esse escopo foi ampliado para contemplar também os riscos de mercado, que passaram a integrar a base de cálculo do capital mínimo exigido.

O Acordo de Basileia 2, publicado em 2004, promoveu um aprimoramento significativo do modelo, com o objetivo de refletir de forma mais precisa os riscos efetivamente assumidos pelas instituições financeiras, especialmente aquelas de maior porte. O novo arcabouço se estruturou em três pilares estruturantes:

  1. cálculo dos requerimentos mínimos de capital para riscos de crédito, mercado e operacional;
  2. supervisão da adequação de capital com base nos processos internos dos próprios bancos; e
  3. reforço à disciplina de mercado por meio de maior transparência e divulgação de informações sobre riscos.

As diretrizes estabelecidas foram posteriormente consolidadas, sobretudo diante das discussões sobre os riscos associados à carteira de negociação (trading book). Basileia II representou um avanço importante ao tornar os requisitos prudenciais mais sensíveis ao risco real e ao dialogar com a sofisticação crescente dos produtos financeiros.

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O Acordo de Basileia 3 surge como resposta direta à crise financeira de 2007/2008. A partir de 2010, o Comitê passou a divulgar um novo conjunto de recomendações voltadas a fortalecer a resiliência do sistema bancário global. A lógica é simples: os bancos precisam ser capazes de absorver choques — sejam internos ao sistema financeiro, sejam oriundos da economia real — sem comprometer a estabilidade sistêmica.

Entre os principais pontos, destacam-se: o aumento da qualidade e da quantidade de capital exigido; a criação de buffers de capital (preservação e anticíclico); regras mais rígidas de alavancagem; e novos parâmetros de liquidez e financiamento estável.

Todas essas medidas visavam a evitar a repetição do que se viu na última crise: risco mal precificado, liquidez escassa, e um efeito dominó de falências com repercussões globais.

Mas, afinal, onde estamos agora?

Desde Basileia 3, o debate tem se expandido para considerar riscos climáticos e fatores ESG. Desde 2020, o Comitê de Basileia vem aprofundando estudos para incorporar os riscos ambientais, sociais e climáticos como parte estrutural da supervisão bancária. A premissa é simples, mas incontornável: risco climático é risco financeiro. E, portanto, deve ser considerado no cálculo de capital regulatório, na alocação de ativos, nos testes de estresse e na exposição setorial dos bancos.

A resistência política a esse avanço evidencia o desconforto que uma regulação climática robusta ainda provoca. No entanto, os riscos não desaparecem por serem impopulares. Negá-los é, em si, uma forma de fragilizar o sistema financeiro.

Avaliar riscos climáticos não é apenas uma exigência regulatória: é condição para a viabilidade econômica em um mundo em transição. Critérios claros, transparentes e uniformes para mensuração e precificação desses riscos são essenciais para a solidez do sistema financeiro internacional e para um crescimento sustentável de longo prazo.

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