Transexual barrada em boate por usar roupa feminina será indenizada
19 de maio de 2025, 17h46
As pessoas transexuais têm o direito de receber tratamento em conformidade com a sua identidade social. Com essa fundamentação, a 27ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou a condenação por dano moral de uma casa noturna que barrou o acesso de uma mulher transgênero porque ela vestia roupas femininas. O colegiado ainda elevou o valor da indenização a ser paga pela boate.

Argumentos da boate não foram capazes de convencer os magistrados
Reiterando que foi impedida de entrar na casa noturna por causa de sua orientação sexual, sendo humilhada publicamente, a autora da ação pediu a majoração da verba indenizatória para R$ 20 mil.
A juíza Daniela Almeida Prado Ninno, da 2ª Vara do Foro de Barra Bonita (SP), havia condenado a boate a pagar R$ 4 mil à autora.
A casa noturna, por sua vez, negou qualquer discriminação em relação à orientação sexual da demandante e postulou a reforma integral da sentença.
Em suas razões recursais, o estabelecimento alegou que há normas para o uso de trajes no recinto e que a autora não estava de acordo com tais regras, pois usava “bustiê e minissaia curtíssima”. A boate afirma ter oferecido uma blusa e um shorts, mas ela os recusou.
Segundo o relator das apelações, desembargador Luís Roberto Reuter Torro, ainda que se alegue existir uma “etiqueta de vestimenta” para o local, tal afirmação feita pela empresa ré apenas reforça a versão da autora de que o seu ingresso foi impedido por trajar roupas femininas. Para o julgador, a requerente foi exposta a uma situação vexatória e manifestamente atentatória à sua dignidade.
“Constata-se que o caso em análise enfrenta com seriedade a delicada questão da discriminação contra pessoas cuja identidade de gênero diverge do sexo biológico”, avaliou Torro.
Segundo o magistrado, a situação extrapolou o limite do aborrecimento cotidiano, configurou-se como indubitável preconceito e causou à vítima danos morais puros, ou seja, aqueles decorrentes da própria situação vivenciada.
Por essa razão, o relator negou provimento ao recurso da boate, porque a “sentença analisou corretamente todas as questões discutidas nos autos, mediante criteriosa avaliação dos fatos e das provas”, e deu parcial provimento à apelação da autora, aumentando a indenização para R$ 10 mil.
A ré também deverá arcar com as custas processuais e os honorários sucumbenciais, fixados em 15% sobre o valor da condenação.
De acordo com Torro, o valor de R$ 10 mil guarda em si a devida proporção entre a lesão e a respectiva reparação, leva em conta a condição econômica das partes e atende aos critérios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Além disso, é apto para compensar os dissabores sofridos pela autora e atingir a finalidade punitiva e a função educativa de tal reparação. Os desembargadores Rogério Murillo Pereira Cimino e Dario Gayoso seguiram o relator.
Ingresso condicionado
O episódio ocorreu na madrugada de 5 de março de 2017. Acompanhada de algumas amigas, a autora disse que foi proibida de entrar por estar vestida como mulher.
Um empregado da boate afirmou que ela é homem e, para ingressar no local, deveria estar com trajes masculinos, a menos que exibisse documento provando ser do sexo feminino.
“Proibir que transexual ingresse em determinado local porque as suas roupas não coincidem com o seu sexo biológico viola a livre escolha de gênero, caracteriza preconceito, causa dano moral e gera o dever de indenizar”, sentenciou Daniela Ninno.
Conforme a juíza, a prova testemunhal foi uníssona no sentido de que outras mulheres se vestiam como a autora e não foram barradas, acentuando a discriminação denunciada.
Processo 1002815-65.2017.8.26.0063
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