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Redução da base de cálculo para equipamentos industriais e implementos agrícolas em SP

3 de maio de 2025, 15h22

Por Aurélio Longo Guerzoni, Guilherme Musskoff

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O Convênio ICMS nº 52/1991, editado pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), prevê a redução da base de cálculo nas operações com equipamentos industriais e implementos agrícolas, com vigência prorrogada até 30/4/2026 [1].

As mercadorias objeto do incentivo fiscal foram arroladas nos Anexos I e II, com discriminação por item, descrição e classificação segundo a Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM).

Embora tenha sido internalizado pelo Estado de São Paulo, nos termos do Decreto nº 33.921/1991 e do Regulamento do ICMS (RICMS/2000), a aplicação deste convênio vem sendo restringida pelo fisco.

Há registros de autuações motivadas pela presunção de que a atividade econômica desenvolvida pelo adquirente não teria natureza industrial ou agrícola, o que impediria a aplicação do benefício fiscal. Confira-se, por exemplo, o seguinte caso:

“O agente fiscal apurou que a autora vendeu as mercadorias para clientes não industriais, baseado no SINTEGRA […]. Assim, correto o AIIM, na medida em que as vendas de produtos não faziam jus […]” [2].

Acreditamos, contudo, que essa prática é indevida.

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Máquina agrícola, plantão, agronegócio, fazenda

Pela interpretação literal imposta pelo artigo 111, caput, do Código Tributário Nacional (CTN), para hipóteses de benefícios fiscais, cabe ao fisco apenas verificar se as mercadorias objeto da redução constam de um dos anexos do Convênio.

Há decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que corroboram esse entendimento, como o acórdão proferido pela 2ª Câmara de Direito Público no julgamento da Remessa Necessária nº 1004845-11.2014.8.26.0053:

“Verifica-se […] que os equipamentos comercializados pela autora deveriam apenas estar incluídos no Anexo I para fazer jus a redução pleiteada do imposto, não havendo previsão legal de vinculação do benefício à efetiva comprovação do uso […]” [3].

A norma alcançada por essa técnica interpretativa promove segurança jurídica, ao assegurar a aplicação do benefício nos exatos termos do Convênio, sem ampliação para mercadorias não incluídas em seus anexos, nem restrição por juízo de valor do fisco.

Aliás, a interpretação teleológica do Convênio ICMS nº 52/1991 igualmente conduz a uma aplicação objetiva do benefício fiscal, prescindindo de qualquer juízo de valor por parte do fisco.

Sim, pois ao arrolar as mercadorias nos anexos e discriminá-las por NCM, o legislador já considerou, de forma prévia e objetiva, a natureza industrial ou agrícola, dispensando a necessidade de comprovação quanto à destinação do item.

Parece compartilhar desse entendimento a Coordenação da Administração Tributária (CAT), que, por meio da Decisão Normativa nº 03/2013, alterou o seu posicionamento, o qual antes exigia, inclusive, a destinação do bem ao ativo imobilizado, cuja contabilização sugere o emprego industrial do equipamento:

“Os adjetivos ‘industriais’ e ‘agrícolas’, como ocorre com a maioria dos termos, podem comportar mais de um significado. […] Ou seja, […] pode ou não ser considerado industrial, dependendo do conteúdo semântico que seja atribuído a esse adjetivo” [4].

A norma alcançada por essa técnica fundamenta a fruição do benefício no potencial de uso industrial ou agrícola da mercadoria, de modo que ele deve ser concedido com base nessa presunção, e não pela comprovação individualizada da destinação final.

Entendimento do TJ-SP e a persistência do fisco

Também existem decisões do TJ-SP que corroboram essa linha interpretativa, a exemplo do acórdão proferido pela 11ª Câmara de Direito Público no julgamento da Apelação nº 0022959-83.2012.8.26.0053:

“Ocorre que a própria Administração Tributária alterou visceralmente sua orientação a respeito da matéria. […] Os equipamentos […] de utilização também doméstica e não apenas industrial, passaram a fazer jus à redução de alíquota do imposto” [5].

Esse entendimento também contribui para a operacionalização do benefício, pois não cabe ao alienante fiscalizar os adquirentes quanto ao uso das mercadorias, que podem ter destinos diversos, conforme o momento e as necessidades subjetivas.

Apesar disso, o fisco parece persistir em restringir a fruição do benefício, especialmente quando se depara com mercadorias cujas descrições no NCM são por ele consideradas genéricas, sobretudo aquelas que começam com o termo “outras”, conforme indica, por exemplo, a Resposta à Consulta Tributária nº 23877/2021:

“[…] entendemos que, caso a mercadoria em questão efetivamente corresponda ao enquadramento em epígrafe e seja de uso industrial, as operações com tal mercadoria farão jus à redução de base de cálculo […]” [6].

Diante desse cenário, em que o fisco desconsidera o entendimento da própria CAT e ainda inexiste orientação consolidada pelos tribunais, mostra-se essencial uma análise criteriosa quanto à fruição do benefício para cada mercadoria a ser comercializada, a fim de avaliar os riscos e as oportunidades envolvidos.

 


[1] Convênio ICMS nº 226/2023: prorroga as disposições de convênios ICMS que dispõem sobre benefícios fiscais.

[2] Ação Anulatória nº 1009825-98.2014.8.26.0053. 3ª Vara de Fazenda Pública da Comarca de São Paulo – SP. Contestação do Estado de São Paulo: fls. 435 – 447.

[3] Remessa Necessária nº 1004845-11.2014.8.26.0053. TJ-SP. 2ª Câmara de Direito Público; Relator: Claudio Augusto Pedrassi; Data do Julgamento: 01.10.2019; Data de Registro: 02.10.2019.

[4] Decisão Normativa CAT nº 03/2013: ICMS – Operações com máquinas, aparelhos e equipamentos industriais e máquinas e implementos agrícolas.

[5] Apelação Cível nº 0022959-83.2012.8.26.0053. TJ-SP. 11ª Câmara de Direito Público; Relator: Aroldo Viotti; Data do Julgamento: 19.04.2016; Data de Registro: 27.04.2016.

[6] Resposta à Consulta Tributária nº 23877/2021. Disponibilizado no site da SEFAZ em 07.08.2021.