Reforma tributária ameaça viabilidade econômica do setor aéreo
30 de junho de 2025, 21h42
A proposta de adoção do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) no Brasil, por meio da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), representa, sem dúvida, um avanço em termos de simplificação e transparência tributária. No entanto, para o setor aéreo, essa mesma reforma surge como uma ameaça concreta à sua viabilidade econômica, à conectividade regional e à isonomia fiscal entre os diferentes modais de transporte.

Atualmente, a aviação civil opera sob um regime diferenciado, com carga tributária efetiva inferior a 10%, considerando isenções e alíquotas reduzidas de PIS/Cofins. Com a adoção de uma alíquota estimada em 26,5%, os efeitos seriam imediatos: aumento no custo das passagens aéreas, redução na demanda — estimada entre 20% e 30% — e desestímulo à manutenção de rotas regionais com pouca atratividade comercial, mas elevado valor social e estratégico. Isso configura, ainda, um possível desrespeito aos princípios constitucionais da isonomia e da capacidade contributiva, já que o transporte aéreo é serviço essencial em um país de dimensões continentais.
Há, portanto, forte questionamento quanto à adequação técnica de uma alíquota padrão. Setores como o aéreo e o educacional, com cadeias curtas de valor e margens reduzidas, são mais penalizados do que segmentos industriais com cadeias longas e maior possibilidade de geração de crédito tributário. A uniformidade pretendida ignora essas disparidades e pode causar distorções econômicas severas.
Alternativas existem e são adotadas por países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE): alíquotas reduzidas para transporte coletivo, crédito presumido para combustíveis e leasing de aeronaves e regimes de transição com degraus mais suaves na elevação da carga. Essas medidas não seriam privilégios, mas sim instrumentos técnicos de calibragem para preservar a neutralidade tributária e evitar desequilíbrios.
Risco de apagão
Do ponto de vista jurídico, a elevação de preços e a consequente queda na demanda também podem ser analisadas à luz dos princípios da livre iniciativa, da razoabilidade e da proporcionalidade. É incompatível com esses princípios impor ao setor aéreo uma carga que triplica ou quadruplica a atual, sobretudo quando grande parte de seus insumos não gera créditos integrais, como combustíveis, arrendamento de aeronaves e serviços internacionais.

Além disso, o Supremo Tribunal Federal já reconheceu, em decisões anteriores, que a tributação excessiva de setores de relevância social pode violar a Constituição. O transporte aéreo, essencial para a integração nacional, não pode ser tratado como simples serviço comercial sujeito a regras que ignoram sua função estratégica.
O setor dispõe, ainda, de mecanismos legais para reagir aos efeitos negativos da proposta: articulação institucional com o Congresso, acordos setoriais com o Comitê Gestor do IBS, planejamento tributário e eventual judicialização, inclusive por meio de ações diretas de inconstitucionalidade, caso reste comprovada a desproporcionalidade da tributação.
A reforma tributária brasileira não pode se concretizar à custa da fragilização de setores essenciais. Se o objetivo é um sistema mais simples e justo, ele precisa, obrigatoriamente, considerar as especificidades de cada segmento econômico. No caso da aviação, ignorar essa necessidade é correr o risco de provocar um “apagão aéreo tributário”, com consequências sociais, regionais e econômicas que o país não pode se dar ao luxo de enfrentar.
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