Justiça dos EUA julga caso de preso que teve seu cabelo rastafári raspado
28 de junho de 2025, 8h26
A Suprema Corte dos Estados Unidos aceitou julgar o caso de Damon Landor, um prisioneiro que teve o cabelo raspado à força por carcereiros, apesar de seus votos religiosos de não cortar suas tranças rastafári. A corte decidirá se autoridades prisionais podem ser responsabilizadas pessoalmente por violar a liberdade religiosa de um preso.

Suprema Corte vai decidir caso de prisioneiro que teve cabelo raspado à força
Por quase duas décadas, Landor cumpriu sua promessa de não cortar o cabelo — um “voto de Nazireu”. Quando chegou a uma penitenciária no estado de Louisiana, em 2020, para cumprir uma pena de cinco meses por posse de drogas, suas tranças rastafári caíam até perto dos joelhos.
Ao saber que iriam raspar seu cabelo, Landor explicou aos carcereiros que era praticante da fé rastafári e lhes entregou uma cópia de uma decisão de 2017 do Tribunal Federal de Recursos da 5ª Região. A sentença dizia especificamente que cortar o cabelo de praticantes de rastafári é uma violação das proteções federais ao livre exercício da religião.
Os carcereiros riram e jogaram os papéis no lixo. Chamaram o diretor do presídio, levaram Landor para outra sala, algemaram-no em uma cadeira e rasparam seu cabelo, de acordo com os autos do processo.
Landor moveu uma ação indenizatória em um tribunal federal. Ele processou o Departamento de Correições do estado, o presídio e seu diretor — este em sua “capacidade individual e oficial”.
Em contextos jurídicos nos EUA, “capacidade individual” se refere à pessoa que age como um cidadão privado, enquanto “capacidade oficial” se refere à pessoa que age como representante de uma entidade governamental ou corporativa.
O prisioneiro acusou os réus de violar a lei Religious Land Use and Institutionalized Persons Act (RLUIPA), aprovada pelo Congresso em 2000 — em parte para fortalecer o direito à liberdade religiosa dos prisioneiros. Porém, ele não teve sucesso em sua tentativa de responsabilizar pessoalmente o diretor do presídio.
O juiz federal criticou duramente o tratamento que autoridades carcerárias deram a Damon Landor, mas concluiu que a lei (RLUIPA) não permite processar autoridades em suas “capacidades individuais” por danos. É possível processá-las em suas “capacidades oficiais” — ou seja, o presídio paga o pato.
Um colegiado de três juízes do Tribunal Federal de Recursos da 5ª Região foi pelo mesmo caminho. A decisão dos magistrados, em Landor v. Louisiana Department of Corrections and Public Safety, diz:
“Condenamos enfaticamente o tratamento que Landor sofreu. Ainda assim, permanecemos vinculados à nossa decisão anterior de que, de acordo com a lei, ele não pode buscar indenização pecuniária de funcionários em suas respectivas capacidades individuais”.
Quando a corte recusou o pedido para levar o julgamento para seu tribunal pleno, seis juízes discordaram. Em voto vencido, o juiz Andrew Oldham citou um precedente de 2020 da Suprema Corte. Essa decisão declara que a Religious Freedom Restoration Act (RFRA) permite a indivíduos processar autoridades federais, em suas “capacidades individuais”, para obter indenização por danos.
O voto vencido dos juízes do tribunal de recursos afirma que as duas leis (RLUIPA e RFRA) devem ser interpretadas em conjunto. “Essas leis objetivam proteger o livre exercício da religião nas prisões e, assim, a responsabilização financeira das autoridades públicas é necessária para conter a má conduta governamental.”
O Departamento de Justiça dos EUA (DOJ) protocolou uma petição na Suprema Corte em que apoia a causa do prisioneiro. O DOJ cita dois outros precedentes do tribunal: a decisão em Sossamon v. Texas estabeleceu que indenização monetária não é a reparação adequada em ações contra o Estado; e a decisão em Tanzin v. Tanvir estabeleceu que, sob a lei RLUIPA, a reparação apropriada pode incluir indenização por danos em ações judiciais contra autoridades públicas, em suas “capacidades individuais”.
Questão limitada
A questão apresentada aos ministros da Suprema Corte é exatamente se a Justiça pode responsabilizar civilmente uma autoridade pública, em sua “capacidade individual”, em ações de indenização por danos.
Na Suprema Corte, Landor tem uma chance de ganhar a causa. O fato de o tribunal ter aceitado julgar o caso já é uma indicação de que tende a mudar as decisões das cortes inferiores. Porém, mais do que isso, os ministros construíram nos últimos tempos um histórico de decisões em favor de entidades religiosas.
Com ressalvas, no entanto. Uma: essas entidades religiosas beneficiadas eram cristãs. Outra: a corte engavetou, pelo menos por enquanto, um pedido de socorro de um devoto hindu que declara ter sido erradamente condenado por abuso sexual.
Talvez a corte queira resolver primeiro o caso de Landor, que só será julgado no próximo ano judicial. Com informações adicionais de Washington Post, The Hill e do site SCOTUSblog.
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