Alberto Youssef pede que STF reconheça suspeição de Moro e anule condenações da 'lava jato'
25 de junho de 2025, 16h45
O doleiro Alberto Youssef pediu nesta segunda-feira (23/6) ao ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, o reconhecimento da suspeição do ex-juiz Sergio Moro e a anulação dos atos da “lava jato” praticados contra ele.

Alberto Youssef foi grampeado clandestinamente em cela na PF
Preso na primeira fase da “lava jato”, em 2014, Youssef celebrou acordo de colaboração premiada que foi a base de boa parte das acusações do caso.
A defesa de Youssef, comandada pelos advogados Antonio Figueiredo Basto, do Figueiredo Basto Advocacia, e Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, do Almeida Castro, Castro e Turbay Advogados Associados, argumenta a Toffoli que, em 2010, Sergio Moro se declarou suspeito para julgar o doleiro no caso Banestado.
“Considerando o já exposto na fl. 312, especialmente que o inquérito parece movido pela discordância quanto à prévia delação premiada entre MPF e Alberto Youssef, e ainda especificamente que este julgador homologou o acordo de delação premiada do MPF com Alberto Youssef, reputo mais apropriado que o inquérito prossiga com outro juiz. Assim, declaro-me suspeito por motivo de foro íntimo, para continuar no inquérito”, disse Moro na ocasião (Representação Criminal 2007.70.00.007074-6).
“Tal decisão, porém, foi completamente ignorada pelo magistrado no início da operação ‘lava jato’, ao observar o potencial daquelas investigações para sua promoção pessoal”, sustentam os advogados, citando ordens do ex-juiz de prisão preventiva e buscas contra o doleiro, além de sentenças condenatórias posteriores.
Grampo ilegal
Alberto Youssef foi grampeado clandestinamente em sua cela na Polícia Federal. As gravações começaram já no dia da sua prisão, em 17 de março de 2014, e só pararam no mês seguinte, quando o próprio doleiro encontrou o grampo ilegal, segundo apurou a revista eletrônica Consultor Jurídico.
Advogados ouvidos pela ConJur confirmam que, após a instalação da escuta, todos os presos da “lava jato” eram encaminhados para a cela de Youssef. O objetivo era usar qualquer menção a pessoas ou empresas para justificar pedidos de busca e apreensão, quebra de sigilos ou prisões.
Lavajatistas argumentaram que o grampo estava inativo. E, com o acordo de colaboração, a defesa de Youssef deixou o assunto de lado. Dez anos depois, porém, o doleiro descobriu que, “ao contrário do afirmado pela Polícia Federal e avalizado pelo ex-juiz Sergio Moro, o aparelho de escuta estava em pleno funcionamento, e áudios foram ilegalmente captados, fatos que foram dolosamente omitidos dos réus, suas respectivas defesas e da imprensa nacional”.
Como destacou a ConJur, integrantes da “lava jato” se mostraram, já em 2015, preocupados com a possibilidade de atos da autodenominada força-tarefa serem anulados após a revelação de métodos “pouco ortodoxos” adotados nas investigações.
“A afirmação realizada no chat, no sentido de negar a investigação e se recusar a realizar a devida apuração dos fatos, deixa clarividente o rompimento de todos os procuradores com suas atribuições constitucionais e a opção pela manutenção a qualquer custo — independente das nulidades, arbitrariedades e clandestinidades — da operação ‘lava jato’, ainda que praticando investigações de modo criminoso. É inacreditável que nenhuma voz do grupo tenha destoado e se insurgido, restando incontroverso o comprometimento e cumplicidade da FT-LJ como um todo”, dizem os advogados.
Instrumentalização de Youssef
A defesa ainda ressalta que Youssef foi um colaborador instrumentalizado por Moro e por procuradores para “atingir nomes cada vez mais próximos à cúpula do Partido dos Trabalhadores (PT), enquanto alvo político a ser perseguido por esses agentes públicos, em benefício de seus projetos particulares de poder”.
Entre os petistas acusados pela “lava jato” por meio do doleiro estão o presidente Lula, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e o ex-tesoureiro do partido João Vaccari Neto.
Em parecer, o advogado e ex-professor de Direito Processual Penal da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Geraldo Prado afirma que o acordo de colaboração premiada de Youssef foi firmado em circunstâncias que violaram o devido processo legal. Por isso, todos os atos contra o doleiro devem ser anulados.
“O que está em risco, quando não se declara a nulidade de acordos penais obtidos sob coação psicológica, é a legitimidade do sistema de justiça criminal, da mesma forma que essa legitimidade é afetada quando se permite que juízes suspeitos decidam as causas penais. O imputado, indevidamente pressionado, sem dúvida alguma é o prejudicado imediato, mas um sistema penal sob o estado de direito não pode ser tolerante com abusos e violações de direitos fundamentais”, diz Prado.
A defesa ainda menciona decisões do Supremo que reconheceram o conluio entre Moro e procuradores contra Lula, Dirceu e Marcelo Odebrecht, resultando na anulação dos atos praticados contra eles na “lava jato”.
História
Em 17 de março de 2014, foi deflagrada a primeira fase da “lava jato”, com a prisão preventiva de Alberto Youssef. Três dias depois, a mando do então juiz Sergio Moro, foi preso o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa.
Após meses encarcerado, e com medo de que suas filhas também fossem para a prisão, Costa firmou, em agosto daquele ano, o primeiro acordo de colaboração premiada da “lava jato”. No mês seguinte, foi a vez de Youssef — mesmo tendo voltado a cometer crimes após celebrar um termo de delação premiada no “caso Banestado”.
A colaboração premiada, para pessoas físicas, havia sido criada menos de um ano antes, com a Lei das Organizações Criminosas (Lei 12.850/2013). Já a Lei Anticorrupção (12.846/2013) estabeleceu o acordo de leniência, destinado às empresas.
A “lava jato” foi turbinada pelos acordos de leniência e de colaboração premiada. O caso, que começou com suspeitas de lavagem de dinheiro por meio de um posto de gasolina em Brasília, cresceu por causa das delações de Paulo Roberto Costa e Youssef — eles foram os primeiros a mencionar irregularidades na Petrobras.
A partir dali, diversos outros investigados resolveram colaborar com a Justiça, seja pela possibilidade de receber uma punição mais branda — já que a regra era a condenação a altas penas —, seja por medo de ficar preso preventivamente por tempo excessivo, prática corriqueira da “cultura lavajatista”.
Ao mesmo tempo, diversas empreiteiras, como Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa, firmaram acordos de leniência para poder continuar em operação. Por meio deles, as empresas se comprometeram a pagar pesadas multas.
Porém, os acordos de colaboração premiada firmados na “lava jato” têm cláusulas que violam dispositivos da Constituição — incluindo direitos e garantias fundamentais —, do Código Penal, do Código de Processo Penal e da Lei de Execução Penal (Lei 7.210/1984). Isso foi o que apontou levantamento feito pela ConJur.
Após decisões dos ministros Dias Toffoli e André Mendonça, do STF, os acordos de leniência da “lava jato” serão revisados. Advogados das empreiteiras reclamam da reclassificação de situações como as doações eleitorais, que foram descritas como propina e corrupção, aumentando muito as multas e inviabilizando as atividades das companhias.
A “lava jato” minou as bases da política brasileira. A ex-presidente Dilma Rousseff sofreu impeachment por supostas violações a regras financeiras, mas o motivo oculto foram as acusações de corrupção na Petrobras. O presidente Lula foi condenado em processo apressado e impedido de se candidatar ao cargo em 2018 — ele liderava as pesquisas de intenção de voto. E a demonização da política abriu as portas para extremistas de direita. Um deles, Jair Bolsonaro, foi eleito presidente.
Os dois principais atores da autodenominada força-tarefa, Moro e o então procurador Deltan Dallagnol, deixaram, respectivamente, a magistratura e o Ministério Público Federal para ingressar formalmente na política. Moro virou ministro da Justiça e Segurança Pública de Bolsonaro, o principal opositor ao PT, e posteriormente foi eleito senador pelo União Brasil do Paraná. Dallagnol elegeu-se deputado federal pelo mesmo estado, mas teve seu mandato cassado.
PET 13.015
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