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Senado promulga adesão do Brasil a tratado sobre patentes com microrganismos

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24 de junho de 2025, 16h54

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), promulgou nesta segunda-feira (23/6) um decreto legislativo que introduz no Brasil o Tratado de Budapeste, com regras sobre o depósito de microrganismos para pedidos de patentes.

Microrganismos

Sem adesão ao tratado, microrganismos precisavam ser depositados fora do Brasil para viabilizar patentes

Esses seres microscópicos são muito usados atualmente na produção agrícola, mas também podem ser aproveitados pela indústria farmacêutica, por exemplo.

Pedro Moreira, sócio do escritório Dannemann Siemsen (especializado em Propriedade Intelectual), agente da propriedade industrial e farmacêutico de formação, explica que a incorporação ao tratado “é um marco histórico para o sistema de patentes no país, com potencial de gerar ganhos de eficiência, soberania tecnológica e competitividade global”.

A principal vantagem de incluir o Tratado de Budapeste na legislação brasileira é a redução dos custos e do tempo de envio e depósito de microrganismos para patentes: “A adesão ao tratado tende a reduzir significativamente o tempo e os custos com envios internacionais e trâmites no exterior, promovendo celeridade e economia financeira direta para pesquisadores, empresas e instituições brasileiras que atuam com biotecnologia”, indica Moreira.

Descrição detalhada

Em um pedido de patente, é necessária a descrição completa da invenção que se busca proteger. As orientações precisam ser claras o suficiente para que um técnico da área consiga reproduzir o produto sem esforços desnecessários ou exagerados.

Quando uma patente é concedida a um inventor, o produto não pode ser comercializado por terceiros durante 20 anos. No entanto, o sistema garante que esses terceiros se apropriem do conhecimento da invenção, para estudá-la e colocar algo no mercado após o fim do período de proteção exclusiva, ou mesmo inovar em cima dela de imediato. Quem se apropria de uma informação pode desenvolver um novo produto em cima do conhecimento existente e depositar uma nova patente.

Nos casos em que a invenção envolve material biológico — os microrganismos —, a descrição por escrito não é considerada suficiente para atender a esse objetivo. Por isso, em complemento ao relatório, uma cepa dos microrganismos usados no produto precisa ser depositada em um centro de referência.

Esses centros são chamados de autoridades depositárias internacionais (IDAs, na sigla em inglês). Elas são responsáveis por guardar os microrganismos, conservá-los e torná-los disponíveis ao público mediante solicitação.

As IDAs, para efeitos de patentes, são regulamentadas pelo Tratado de Budapeste, assinado na Hungria em 1977 e em vigor desde 1980. Atualmente, 91 países, além do Brasil, são signatários do pacto.

Pelas regras do tratado, os países são obrigados a reconhecer os microrganismos depositados nas IDAs como parte do procedimento de obtenção de patente. Assim, um depósito em uma dessas autoridades é válido para todos os signatários.

Brasil atrasado

Como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico no último ano, o Brasil estava atrasado na internalização do tratado. Por isso, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) vinha fazendo pressão sobre parlamentares pela aprovação do decreto legislativo.

Mesmo sem a adesão, o INPI já aceitava o depósito de material biológico nas IDAs, ou seja, reconhecia a capacidade dessas autoridades de receber os microrganismos usados nas invenções. Mas, sem o decreto, o Brasil não podia ter centros do tipo em seu território. Assim, os inventores brasileiros (pessoas físicas, empresas ou instituições) precisavam enviar os microrganismos para IDAs de outros países.

Como membro do pacto internacional, o Brasil pode ter um centro depositário reconhecido no mundo todo, que guarda material biológico de forma geral. Parte da coleção pode ser voltada às patentes.

Isso, porém, não é automático. O país precisa sugerir instituições capazes de receber material biológico, para que o conselho do tratado as avalie.

Ao aderir ao Tratado de Budapeste, o Brasil também pode certificar algumas IDAs estrangeiras como preferenciais para depósito de microrganismos. Isso abre espaço para uma parceria entre países, com cobrança de um preço mais barato.

O ganho de tempo é mais uma vantagem. Enquanto o material biológico não é depositado em uma IDA, o inventor não pode pedir a patente ao INPI. Um centro no Brasil aceleraria esse processo.

Esse fator também é importante para pesquisas que importam o material biológico. As cepas precisam passar pela alfândega e pelo controle sanitário do país, que tem restrições rígidas ao transporte de microrganismos, para evitar a entrada de pragas.

Mesmo lacrados e refrigerados, os microrganismos têm um tempo de vida limitado. A depender da demora nos trâmites de importação, esses seres podem morrer e, assim, perder sua utilidade para as pesquisas. Caso isso aconteça, é necessário esperar a vinda de uma nova cepa, o que representa mais gasto de tempo e dinheiro.

Uso amplo

A principal utilização dos microrganismos no Brasil atualmente é na área da agricultura, com os bioinsumos e biodefensivos. Um exemplo é o tratamento de cana-de-açúcar para a produção de combustível e outros ativos, além de bioplásticos.

Os microrganismos são usados no lugar de produtos químicos para controlar pragas, aprimorar a colheita e aumentar a produtividade agrícola.

Eles também podem ser utilizados pela indústria farmacêutica, em pedidos de patentes para vacinas ou medicamentos, embora isso ainda não aconteça.

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