Responsabilidade de terceiros e honorários na execução fiscal: da jurisprudência do STJ
24 de junho de 2025, 21h37
A responsabilização de terceiros em execuções fiscais, especialmente de sócios e administradores, constitui prática corriqueira na atuação fazendária, muitas vezes sem a devida apuração individualizada da responsabilidade tributária nos moldes do artigo 135 do Código Tributário Nacional, em especial das pessoas listadas no Inciso III do referido dispositivo, isto é, os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado. Nesses casos, é frequente a utilização da exceção de pré-executividade como instrumento processual idôneo para suscitar a ilegitimidade passiva do coexecutado indevidamente incluído no polo passivo, notadamente por se tratar de matéria de ordem pública e cognoscível independentemente de garantia do juízo.
Acolhida a exceção e reconhecida a ilegitimidade do coexecutado, extingue-se a relação processual quanto a ele, sem que haja condenação direta da Fazenda Pública. Ainda assim, o afastamento da sujeição passiva à dívida tributária representa inegável efeito patrimonial concreto, pois impede a constrição de bens do excluído. Nesse contexto, há no meio jurídico relevante controvérsia quanto ao critério de fixação dos honorários advocatícios sucumbenciais: se devem ser fixados com base nos critérios objetivos do artigo 85, §§ 2º e 3º, do CPC, tendo em vista o proveito econômico obtido, ou se, como decidiu o Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema Repetitivo 1.265 (14/05/2025), a fixação deve ocorrer por equidade, nos termos do § 8º do mesmo artigo, sob a justificativa de ausência de valor econômico mensurável.
A aplicação generalizada da equidade nesses casos suscita debate relevante à luz da interpretação sistemática promovida pelo novo CPC. O código estabelece como regra a fixação dos honorários com base em percentual sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou do valor da causa. O legislador optou por prestigiar a objetividade na fixação de honorários como forma de conferir previsibilidade, segurança e proporcionalidade na remuneração do trabalho advocatício. O uso da equidade é previsto apenas em situações excepcionais, como causas de valor irrisório ou inestimável.
No julgamento do Tema 1.076, o STJ reforçou essa leitura restritiva ao distinguir “valor inestimável” de “valor elevado”, enfatizando que o § 8º do artigo 85 do CPC não pode ser banalizado. A exclusão de sócio, ainda que não envolva bens bloqueados, representa a liberação de responsabilidade sobre dívida certa e quantificável — podendo ser interpretado como um benefício econômico mensurável. A fixação de honorários excessivos contra a Fazenda Pública, receio comumente apontado na análise da matéria, foi enfrentado no mesmo julgamento. O relator destacou que o próprio § 3º do artigo 85 já prevê percentuais escalonados de 1% a 20%, mecanismo apto a impedir enriquecimento sem causa e onerosidade desproporcional.
Implicações práticas e perspectivas de superação
A consolidação da tese firmada no Tema Repetitivo 1.265 do Superior Tribunal de Justiça, ao determinar a fixação de honorários advocatícios por equidade nos casos de exclusão de coexecutado por ilegitimidade reconhecida em exceção de pré-executividade, revela a preocupação do Tribunal com a proporcionalidade na condenação da Fazenda Pública, sobretudo em execuções fiscais de alto valor. Parte-se da premissa de que, não havendo condenação pecuniária nem bloqueio de bens, o proveito econômico obtido pelo excluído não seria mensurável com precisão suficiente para aplicação dos critérios objetivos previstos nos §§ 2º e 3º do artigo 85 do CPC. Tal diretriz visa, ademais, a evitar enriquecimento indevido por parte da defesa, resguardando o erário de condenações potencialmente excessivas quando a controvérsia gira em torno exclusivamente da legitimidade passiva.

Por outro lado, sob uma análise sistemática da legislação processual, notadamente à luz do princípio da legalidade e da coerência normativa do Código de Processo Civil, é recomendável que a aplicação do § 8º do artigo 85 não ocorra de forma automática. O reconhecimento da ilegitimidade passiva do coexecutado, embora não configure condenação direta, representa inegável efeito patrimonial concreto ao afastar sua sujeição à dívida exequenda — o que, em muitos casos, é plenamente mensurável.
Ademais, a adoção generalizada da equidade pode acarretar efeitos colaterais indesejados, como a redução dos custos de manutenção de terceiros no polo passivo, o que, inadvertidamente, poderia estimular a Fazenda Pública a facilitar a inclusão e prolongar a permanência de coexecutados sem a devida apuração individual de responsabilidade, confiando na resistência processual da parte adversa. Diante disso, com o devido respeito ao entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, há de se concluir que as razões do Tema Repetitivo 1.265 não foram as mais adequadas, em especial diante da conjuntura jurídica pertinente ao ramo das execuções fiscais, que ocupam parcela relevante dos acervos de Tribunais Regionais Federais e Tribunais de Justiça.
A equidade deve (ou deveria) ser reservada às hipóteses verdadeiramente excepcionais, nos estritos termos legais, de modo a preservar a segurança jurídica, a justa remuneração da advocacia e a racionalidade e economicidade do sistema processual.
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