Lei que impõe vagões femininos no metrô de Salvador é suspensa
24 de junho de 2025, 20h57
A validade da Lei municipal de Salvador 9.835/2025, que instituiu vagões exclusivos para mulheres no sistema metroviário da cidade, é analisada pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça da Bahia. Enquanto não há julgamento definitivo do mérito, o colegiado suspendeu a eficácia da legislação. A Procuradoria-Geral da capital baiana interpôs agravo interno para reformar essa decisão, que ainda será apreciado.

Lei dos vagões femininos em Salvador foi promulgada em março deste ano
A Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos (ANPTrilhos) ajuizou ação direta de inconstitucionalidade, com pedido liminar, em face do prefeito Bruno Reis (União). A entidade pleiteia a declaração de inconstitucionalidade da lei, sancionada em 28 de março deste ano, alegando que ela extrapola o âmbito de Salvador, porque o metrô abrange o município vizinho de Lauro de Freitas.
A ANPTrilhos apontou na inicial que o artigo 22, inciso XI, da Constituição Federal estabelece a competência privativa da União para legislar sobre trânsito e transporte, o que representaria o fumus boni iuris, ou seja, a probabilidade do direito, um dos dois requisitos da tutela de urgência. Quanto ao segundo requisito, o do periculum in mora (perigo da demora), ele estaria evidenciado pelo prazo exíguo para o sistema metroviário se adequar à lei.
A autora da ação argumentou que as mulheres representam 51% dos passageiros e a destinação de vagões femininos nos horários de pico matutino e vespertino, bem como a orientação e fiscalização do seu uso, criaria problemas operacionais. Segundo ela, isso geraria impacto no equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão, pois demandaria maior número de agentes de segurança e possível necessidade de mais trens no sistema.
Liminar
“Observo que a Lei Municipal nº 9.835/2025 aparentemente invade a competência do Estado da Bahia para legislar sobre transporte público intermunicipal, ao impor regras de organização e funcionamento do Sistema Metroviário de Salvador e Lauro de Freitas (SMSL)”, destacou o desembargador José Cícero Landin Neto, relator da ADI. Ele concedeu a liminar para suspender a eficácia da legislação até o julgamento do mérito.
Conforme o julgador, a presença cumulativa dos requisitos da plausibilidade do direito invocado e do perigo de dano irreparável ou de difícil reparação autorizam a concessão da medida cautelar em sede de controle concentrado de constitucionalidade. No caso específico do fumus boni iuris, o relator anotou que a implementação da lei em curto prazo “tende a causar graves transtornos à operação do sistema metroviário”.
De acordo com Landin, a norma impugnada produziria “impactos significativos no planejamento operacional, na alocação de recursos humanos e materiais, e no equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão”. A fim de instruir a ADI, o relator determinou a notificação do prefeito e do presidente da Câmara Municipal de Salvador para prestarem informações no prazo de 30 dias.
Agravo
Para reformar a decisão que concedeu a liminar, a Procuradoria-Geral de Salvador interpôs agravo interno. Ela rebateu os argumentos da ANPTrilhos, defendendo a constitucionalidade da lei municipal. Além disso, sustentou que a associação autora “não é entidade de classe e não se enquadra no rol de legitimados à propositura de ação direta de inconstitucionalidade”.
Conforme a agravante, a alegação de ausência de interesse local, em razão da suposta abrangência regional do sistema metroviário, não é idônea a macular a constitucionalidade da norma, pois ela delimita expressamente que a reserva de espaço às mulheres nos vagões se restringe ao território do município do Salvador. Além disso, a lei tem por objetivo a prevenção e proteção de situações de risco ao público feminino.
“É evidente, pois, que a norma impugnada não ultrapassa as fronteiras da competência municipal, nem tampouco viola norma constitucional. Há, isso sim, concretização de direitos constitucionais fundamentais”, frisou a procuradora Daniela Bomfim. Segundo ela, combater o assédio e a violência sexual no transporte público é medida necessária e proporcional para a preservação da segurança e liberdade das usuárias do sistema.
A agravante também refutou a existência de perigo de dano irreparável, destacando que a autora não apresentou dados técnicos. “As exigências da norma impugnada não demandam intervenções estruturais complexas ou investimentos vultosos de pronto, mas, isso sim, medidas organizacionais e operacionais que podem ser implementadas com razoável facilidade e sem os impactos genericamente afirmados.”
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