Ranking de inconstitucionalidade

Supremo registra maior taxa de inconstitucionalidade desde 2021

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23 de junho de 2025, 8h15

* Reportagem publicada no Anuário da Justiça Brasil 2025, lançado na última quarta-feira (11/6), no STF (clique aqui para assistir ao evento na íntegra). A versão impressa está à venda na Livraria ConJur (clique aqui). Acesse a versão digital pelo site do Anuário da Justiça (anuario.conjur.com.br).

De cada cem ações de controle de constitucionalidade julgadas em 2024 pelo Supremo Tribunal Federal, 72 foram consideradas inconstitucionais. Trata-se da maior taxa de inconstitucionalidade registrada desde 2021. Se considerarmos o número de dispositivos legais considerados em desacordo com as disposições da Constituição, a taxa de desconformidade sobe ainda mais: 79% das normas analisadas foram declaradas inconstitucionais.

Ilustração criada por João Spacca | @joao.spacca

Sinal de que União, estados e municípios continuam legislando mal. Os campeões na produção de artigos fora das quatro linhas são os estados, que produziram 117 normas irregulares, seguidos pela União (28) e pelos municípios (15). Enquanto apenas 50% dos dispositivos federais analisados foram vetados, nos municípios as inconstitucionalidades chegam a 94% do total de questionamentos. Chama a atenção também a grande quantidade de normas administrativas questionadas: 97, das quais 95 foram declaradas inconstitucionais.

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Fonte: Anuário da Justiça com dados do STF

Os dados foram compilados no Ranking de Inconstitucionalidade, levantamento feito por este Anuário de Justiça, com dados do STF obtidos via Lei de Acesso à Informação. Foram 1.041 ações analisadas em 2024 (volume 14% menor que as 1.216 analisadas em 2023), com 260 delas analisadas no mérito. Destas, 186 foram julgadas procedentes, no todo ou em parte, e 74 improcedentes. Em 2023, 378 ações chegaram ao julgamento de mérito, um volume 31% maior que em 2024.

Novamente, a União – representada pelo governo federal, seus ministérios e pelo Congresso Nacional – figurou como a principal parte nos processos julgados pela Suprema Corte. Pernambuco, Distrito Federal e Pará puxaram a lista de estados com a maior proporção de legisla-ções derrubadas.

Para o levantamento, foram consideradas ações diretas de inconstitucionalidade (ADI), diretas de inconstitucionalidade por omissão (ADO), declaratórias de constitucionalidade (ADC), além das arguições por descumprimento de preceito fundamental (ADPF).

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Fonte: Anuário da Justiça com dados do STF

O fim da pandemia pode ser uma das explicações diretas para a redução no volume de decisões. “Entre 2020 e 2024, o STF viveu uma espécie de ‘jurisdição de emergência’”, explica Sayoanara Mihalache, do Perman Advogados, que atua diretamente na Suprema Corte. “A pandemia exigiu respostas rápidas e o Supremo passou a ser muito demandado, especialmente por meio de ADPFs e ADIs que questionavam políticas públicas ou a omissão do Executivo. Era um cenário de muita instabilidade.”

Alguns julgamentos de controle concentrado ocorridos em 2024 na corte levantaram debates na mídia maiores que suas próprias teses jurídicas. Em um desses casos, concluído em maio, os ministros decidiram pela legalidade da Lei das Estatais, sancionada em 2016 e que estabelece uma série de critérios técnicos para a seleção de diretores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de suas subsidiárias. A maioria de oito a três derrubou uma liminar do ministro Ricardo Lewandowski (já aposentado da Suprema Corte durante o julgamento em Plenário), e definiu que a lei atende ao princípio da eficiência, diminuindo casos de corrupção e potenciais conflitos de interesse na administração pública.

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Fonte: Anuário da Justiça com dados do STF

“Os dispositivos em questão não só foram editados em atenção a reclamos da sociedade brasileira, mas também em função de padrões de governança pública e, de modo especial, da governança das estatais no mundo todo”, escreveu André Mendonça, autor da tese vencedora.

CAPA - Anuário da Justiça Brasil 2025, BR25, Brasil 2025

Capa da nova edição do Anuário da Justiça Brasil 2025

Em outro dos julgamentos de repercussão, em abril, o Plenário formou unanimidade para rejeitar a tese de que as Forças Armadas do país são um “poder moderador” da Constituição. A interpretação, que alimentou pedidos de golpe militar por parte dos apoiadores de Jair Bolsonaro antes e depois das eleições de 2022, foi derrubada pelos dez ministros que seguiram o voto do relator, Luiz Fux: “A missão institucional das Forças Armadas na defesa da pátria, na garantia dos poderes constitucionais e na garantia da lei e da ordem não acomoda o exercício de poder moderador entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário”, apontou o ministro.

Em três ADI, os ministros debateram também a reserva de vagas para mulheres em concursos para a segurança pública. Em um dos julgamentos, analisando açõe de Sergipe e Roraima, definiu-se a tese de que a reserva legal para vagas em segurança pública estadual não po e ser interpretada como autorização para impedir que elas possam concorrer à totalidade das vagas oferecidas. Em uma ação do Amazonas relatada pelo ministro Cristiano Zanin, tese parecida foi fixada.

A pauta ambiental debatida apontou para outra característica do xadrez que a corte tem de lidar: o diálogo com o Congresso Nacional, que pode ser considerado omisso ao não deliberar sobre um tema específico. Foi o que aconteceu na ADO 63, movida pela Procuradoria-Geral da República (a instituição que mais teve ações suas julgadas: 80 ao todo).

Por nove votos a dois, o Plenário adotou a tese da PGR de que o Pantanal, bioma que os estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul dividem com o Paraguai e a Bolívia, é um patrimônio nacional e, portanto, deve ser protegido por leis específicas. Constatada a omissão do Congresso Nacional, foi dado prazo de 18 meses para editar tal norma — depois de meados de 2026, o bioma deve ter uma legislação como a Mata Atlântica já possui há quase duas décadas.

“Não ocorre interferência do Poder Judiciário no conteúdo da legislação a ser editada; tão somente acontece o reconhecimento da necessidade do cumprimento do mandamento constitucional a ser realizado em conformidade com a autonomia e independência do Poder Legislativo. Tudo nos exatos limites e determinações da Constituição Federal”, escreveu André Mendonça, o relator da proposta.

Em outra ADO sobre o tema, a corte concluiu que não há estado de coisas inconstitucional na política ambiental de proteção do bioma amazônico. O entendimento dos ministros, ao analisar o caso junto a uma ADPF, é que já está em curso um processo de retomada do efetivo exercício desse dever constitucional, por meio de fiscalização pelos órgãos ambientais competentes.

“As informações apresentadas pela União, especialmente a indicação do restabelecimento do Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia PPCDAm, cuja integralidade foi juntada aos autos, importa na alteração do quadro fá-tico e normativo a afastar, nesse momento, o reconhecimento do atual estado de coisas inconstitucional referente ao desmatamento ilegal da Floresta Amazônica e de omissão do Estado brasileiro em relação à função protetiva do meio ambiente ecologicamente equilibrado”, disse Cármen Lúcia, em voto de abril de 2022, durante o governo Bolsonaro. Apesar disso, o caso — e o acórdão, de 782 páginas — só foi concluído em abril de 2024, quase dois anos depois da primeira votação.

O Supremo tinha, em maio de 2025, 1.027 ações de controle concentrado aguardando julgamento. O relatório de gestão diz que o volume é 36% menor que em 2023, o que pode explicar a redução do ritmo de decisões. “Com isso, a sociedade se beneficia na medida em que mais normas contrárias à Constituição têm a sua eficácia prejudicada, ou, mais normas em consonância com a Constituição têm a sua eficácia confirmada”, justifica o relatório, assinado pelo presidente Luís Roberto Barroso.

ANUÁRIO DA JUSTIÇA BRASIL 2025
19ª Edição
ISSN:
 2179981-4
Número de páginas: 256
Versão impressa: R$ 50, à venda na Livraria ConJur
Versão digital: disponível gratuitamente no app “Anuário da Justiça” ou pelo site anuario.conjur.com.br

Anuário da Justiça Brasil 2025 contou com o apoio da Fundação Armando Alvares Penteado — FAAP.

Anunciaram nesta edição do Anuário da Justiça Brasil:
Adriana Bramante Advogados Associados
Advocacia Amanda Flávio de Oliveira
Advocacia Fernanda Hernandez
Arruda Alvim & Thereza Alvim Advocacia e Consultoria Jurídica
Ayres Britto Consultoria Jurídica e Advocacia
Basilio Advogados
Bergamini Advogados
Bermudes Advogados
Bialski Advogados Associados
Bottini & Tamasauskas Advogados
Bradesco S.A.
Carneiros Advogados
Cecilia Mello Advogados
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Corrêa Advogados
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D’Urso & Borges Advogados Associados
Dias de Souza Advogados
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Fidalgo Advogados
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Gueller e Vidutto – Sociedade de Advogados
Hasson Sayeg, Novaes e Venturole Advogados
Heleno Torres Advogados
JBS S.A.
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Lucon Advogados
Machado Meyer Advogados
Marcus Vinicius Furtado Coêlho Advocacia
Maria Fernanda Vilela & Advogados
Mauler Advogados
Milaré Advogados
Moraes Pitombo Advogados
Moro e Scalamandré Advocacia
Mubarak Advogados
Multiplan
Nelio Machado Advogados
Ordem dos Advogados do Brasil – São Paulo
Palheiro & Costa – Sociedade de Advogados
Pardo Advogados Associados
Perez e Rezende Advogados
Procópio de Carvalho Advocacia
Refit
SOB – Sacramone, Orleans e Bragança Advogados
Tavares & Krasovic Advogados
Tojal Renault Advogados
Warde Advogados

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