Credor não pode ser punido por falta de contraproposta em audiência de conciliação
23 de junho de 2025, 19h17
Ao interpretar as disposições da Lei do Superendividamento (Lei 14.181/2021), a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que o credor não tem obrigação legal de aderir ao plano de pagamento formulado pelo devedor, nem de apresentar contraproposta em audiência de conciliação. Assim, o colegiado deu provimento ao recurso especial de um banco para afastar as sanções do Código de Defesa do Consumidor aplicadas contra ele, que litiga com um consumidor superendividado do Rio Grande do Sul.

Lei busca preservar o mínimo existencial e reinserir o devedor no consumo
Essa decisão vai na mesma direção de uma outra, esta da 3ª Turma do STJ, que também deu ganho de causa a uma instituição financeira em disputa com um consumidor superendividado.
O relator do recurso julgado pela 4ª Turma, ministro Marco Buzzi, ressaltou que a Lei 14.181/2021 trouxe um modelo de enfrentamento do superendividamento, buscando a preservação do mínimo existencial do devedor e sua reinserção no mercado de consumo. No entanto, ele destacou que a norma impõe penalidades apenas nas hipóteses de não comparecimento injustificado do credor à audiência ou de comparecimento de representante sem poderes para negociar — o que não ocorreu no caso.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul havia mantido a decisão que aplicou as penalidades previstas no parágrafo 2º do artigo 104-A do CDC. Segundo o dispositivo, o não comparecimento injustificado do credor ou de seu representante com poderes para transigir gera penalidades como suspensão da exigibilidade da dívida, interrupção dos juros de mora e sujeição compulsória ao plano de pagamento proposto.
Alegando estar em situação de superendividamento, o consumidor ajuizou ação revisional buscando limitar em 30% os descontos de empréstimos bancários em sua conta-salário. Embora tenha sido devidamente representado na audiência, o banco não aceitou a proposta do devedor e não apresentou contraproposta, o que levou o juiz de primeiro grau a aplicar as sanções do CDC, entendimento confirmado pelo TJ-RS. A instituição financeira, então, recorreu ao STJ.
Sem obrigação de acordo
O ministro Buzzi destacou a relevância social e econômica do tema, citando dados que apontam haver mais de 70 milhões de brasileiros inadimplentes, sendo 67% das dívidas contraídas com instituições financeiras. Segundo o Serviço de Proteção ao Crédito Brasil, 42% da população adulta está negativada.
Conforme o relator, porém, ainda que a audiência e o sistema de autocomposição tenham prestígio na lei, não há respaldo para a aplicação, por analogia, das penalidades previstas pelo CDC na hipótese de insucesso da conciliação.
“A ausência de aceitação do plano de pagamento sugerido pelo devedor e a falta de apresentação de contraproposta não geram, como consequência, a aplicação dos efeitos do parágrafo 2º do artigo 104-A do CDC”, afirmou Buzzi. Segundo ele, embora o sistema protetivo do consumidor superendividado dê ênfase à cooperação e à solidariedade, “não há como restringir a liberdade do credor, constrangendo-o a fazer concessões contrárias à sua vontade”.
O relator também lembrou que, se não houver acordo na audiência conciliatória, o CDC prevê uma segunda etapa processual, na qual o juiz pode revisar os contratos e promover a repactuação das dívidas (artigo 104-B). Com informações da assessoria de imprensa do STJ.
REsp 2.188.689
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