STF reconhece repercussão geral em tema de relatórios do Coaf por encomenda
19 de junho de 2025, 7h50
O Plenário do Supremo Tribunal Federal vai decidir se os órgãos de investigação podem requisitar relatório de inteligência financeira (RIF) diretamente ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sem autorização judicial.

Plenário do STF vai se debruçar sobre constitucionalidade do compartilhamento de RIFs do Coaf produzidos “por encomenda”
O STF reconheceu a repercussão geral do tema, em julgamento encerrado em 7 de junho. A relatoria é do ministro Luís Roberto Barroso.
Com isso, o Plenário vai se debruçar sobre um tema que vem dividindo a jurisprudência brasileira: a validade dos RIFs produzidos “por encomenda”, a pedido de Ministério Público ou delegados de polícia.
Trata-se de um desdobramento da tese firmada pelo próprio Supremo em 2019, quando concluiu que é constitucional o compartilhamento de informações pelos órgãos de inteligência (Coaf e Receita Financeira), para fins penais, sem autorização judicial.
Cisão jurisprudencial
Ao interpretar as teses do STF, o STJ inicialmente entendeu que, quando a informação é obtida pelo caminho inverso (por iniciativa do órgão de investigação), é necessário passar pelo crivo do juiz antes.
Os acórdãos do STJ passaram a gerar reclamações constitucionais levadas ao STF sob a alegação de descumprimento da tese fixada em 2019. O resultado foi uma cisão jurisprudencial.
A 1ª Turma do Supremo vem validando o compartilhamento por encomenda, enquanto a 2ª Turma vem invalidando, apesar de haver indícios de que essa questão pode ser unificada, como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico.
Mais recentemente, a 3ª Seção do STJ, que reúne os integrantes das duas turmas criminais, decidiu que, até que o Supremo unifique posição, os RIFs por encomenda serão entendidos como ilegais.
O STF também vai decidir se o compartilhamento de dados pressupõe a instauração de procedimento formal de investigação, outro tema decidido pelo STJ de maneira menos favorável aos investigadores.
Para requisitar essas informações, não basta que os delegados tenham instaurado procedimento preliminar ao inquérito (VPI) ou que os promotores estejam analisando notícia de fato — ambos representam investigação prévia para saber se vale a pena ou não apurar um suposto crime.
Delimitação da controvérsia
Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos artigos 5º; X; XII; XXXVI e 129; VI; VII; VIII; e IX, da Constituição Federal, as seguintes hipóteses:
(i) saber se o Ministério Público pode requisitar dados às autoridades fiscais, sem autorização judicial; e
(ii) saber se o compartilhamento de dados fiscais pressupõe instauração de procedimento de investigação penal formal.
Lavagem de dinheiro equina
O recurso extraordinário em que o Plenário do STF vai decidir a questão foi interposto pelo Ministério Público Federal exatamente contra um acórdão da 5ª Turma do STJ, que aplicou essa orientação.
O réu é acusado de participar de esquema na importação de equinos e teve seu nome citado em colaboração premiada em 2015. O inquérito foi instaurado em 2018 para apurar o crime de evasão de divisas, já com a juntada de um RIF do Coaf.
Esse relatório foi solicitado pelo MPF para saber se haveria movimentação financeira atípica em relação ao suspeito e às pessoas jurídicas nas quais aquele participa. Os dados levantados ainda serviram para pedir quebra do sigilo bancário.
Na petição do recurso, o MPF alega que o STJ tem dado contornos restritivos à tese vinculante firmada no Tema 990, em 2019. Nas contrarrazões, a defesa pontua que o que não se admite é que informações sejam requisitadas ao bel-prazer do órgão, em pescaria probatória.
Importância dos RIFs do Coaf
O tema é de extrema relevância graças à importância que os relatórios de inteligência financeira ganharam na rotina das investigações brasileiras — o que abre exatamente o debate sobre a ocorrência de fishing expedition.
A ConJur já mostrou que, em dez anos, o número de RIFs por encomenda aumentou 1.300%. No ano passado, o Coaf entregou uma média de 51 relatórios por dia aos órgãos habilitados.
Já a Folha de S. Paulo publicou que, em 2024, foram registrados 13.667 pedidos de RIFs ao Coaf pelas polícias civis, número 114% maior que os 6.375 feitos em 2021.
Para advogados consultados pela ConJur, a posição vigente no STJ de vetar os RIFs por encomenda não proíbe, nem dificulta o uso desse tipo de informação nas investigações: apenas estabelece um controle judicial prévio e necessário.
O risco é de transformar o imenso banco de dados do Coaf em um repositório de dados à disposição dos investigadores, com informações que, inclusive, não representam prova, mas apenas indica onde obtê-las — são como “mapas de calor”.
RE 1.537.165
Encontrou um erro? Avise nossa equipe!