Fixação de honorários pelo CPC e o reforço constitucional da valorização da advocacia
13 de junho de 2025, 9h21
No dia 30 de maio, o Supremo Tribunal Federal proferiu decisão de notável relevância para a advocacia brasileira ao julgar o Tema 1.402 da Repercussão Geral.

Na ocasião, a Corte firmou entendimento de que, nas causas em que não estejam envolvidas a Fazenda Pública, a fixação de honorários advocatícios sucumbenciais deve observar, com estrita fidelidade, os parâmetros previstos no Código de Processo Civil de 2015, especialmente os critérios objetivos estabelecidos no artigo 85.
Tal decisão harmoniza-se à jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, notadamente no julgamento do Tema 1.076, que já afirmava a obrigatoriedade de observância desses critérios legais.
Essa reafirmação pelo STF reveste-se de profundo simbolismo institucional. Os honorários advocatícios, muito além de meras quantias pecuniárias oriundas da atuação judicial, possuem fundamento histórico e semântico que remonta à antiguidade.
Origem de ‘honorários’
A palavra “honorários” provém da expressão latina honorarium, que significava uma dádiva oferecida em reconhecimento a serviços prestados, sobretudo nos domínios da oratória e do saber. Na Roma Antiga, o exercício da advocacia era um ofício reservado àqueles dotados de capacidade de persuasão e domínio da retórica, e o exercício da função, a princípio, não envolvia qualquer retribuição pecuniária.
O que o orador recebia da parte defendida era uma “honra”, um reconhecimento público e social pelo serviço prestado à justiça e à ordem. Daí o termo: honorários, como sinônimo de prestígio e deferência.
Hoje, no entanto, os honorários não mais representam apenas distinção simbólica.
Ao longo da história, a advocacia profissionalizou-se, mas essa carga simbólica permaneceu. Hoje, os honorários não são mais apenas um reconhecimento moral, mas sim “verbas de natureza alimentar”, como expressamente reconhece o artigo 85, §14, do Código de Processo Civil.
Verba alimentar
A jurisprudência do STF e do STJ, bem como a legislação vigente, reconhecem sua natureza jurídica de verba alimentar, equiparando-se, para fins de proteção e dignidade, ao salário do trabalhador e à pensão do aposentado. Constituem, portanto, verdadeira fonte de subsistência.

A decisão proferida pelo STF no Tema 1.402 é de significativa importância por reafirmar a centralidade dos honorários na estrutura da profissão e na própria administração da Justiça. Rejeita-se, de modo expresso, qualquer tentativa de relativizar os parâmetros do CPC em nome de supostas “práticas judiciais” ou “critérios de razoabilidade”, que, na prática, comprometem a segurança jurídica e o justo pagamento aos advogados.
Em tempos nos quais se busca relativizar a técnica jurídica sob o argumento da “autonomia judicial”, a Corte reafirma a prevalência da norma legal e o dever obrigação de sua aplicação objetiva.
Nesse contexto, impõe-se recordar o disposto no artigo 133 da Constituição, segundo o qual o advogado é indispensável à administração da Justiça. Não se trata de reserva de mercado ou regra meramente processual, mas do reconhecimento da dimensão pública e constitucional da advocacia, enquanto instrumento de efetivação do acesso à justiça e de paridade de armas entre as partes.
Bem por isso, os advogados fazem jus à remuneração justa e digna, compatível com a responsabilidade técnica ao esforço que exercem.
Defesa de direitos e garantias fundamentais
A presença do advogado no processo é condição de legitimidade do próprio Estado democrático de direito. Sua atuação não se limita à defesa de interesses privados, mas também resguarda direitos e garantias fundamentais, o que promove a efetivação dos direitos e do primado constitucional.
Não se pode deixar de enaltecer o papel ativo e combativo da Ordem dos Advogados do Brasil, cuja atuação institucional foi decisiva para a conquista ora consolidada. Ressalte-se o protagonismo do Conselho Federal da OAB, sob a liderança do presidente Beto Simonetti, bem como da Secional Paulista, capitaneada pelo presidente Leonardo Sica, que vêm atuando com firmeza, coerência e profundidade técnica na defesa da estrita legalidade e valorização da classe.
O trabalho coeso e comprometido da advocacia foi crucial para que o Tribunal da Cidadania, e agora, a Corte Constitucional, reconhecessem a importância de preservar a regra legal como instrumento de valorização da advocacia.
Importa destacar que a sistemática instituída pelo CPC, ao estabelecer critérios objetivos para o arbitramento dos honorários, buscou justamente conferir previsibilidade e segurança jurídica ao exercício da profissão. Rompeu-se, assim, com o subjetivismo que antes caracterizava decisões marcadas por arbitrariedades, travestidas de percentuais e valores ínfimos, desprovidos de fundamentação adequada.
Compensação compatível ao valor da causa
Ao prestigiar a fixação proporcional dos honorários sucumbenciais, a decisão prestigiou a ideia de que a atuação técnica e diligente do advogado deve ser compensada de forma digna e compatível com o valor da causa e a complexidade do labor exercido.
O STF, assim, não apenas consolida o entendimento já firmado pelo STJ, mas resgata os fundamentos históricos, jurídicos e constitucionais da profissão.
Honrar os honorários advocatícios é, em última instância, honrar a própria Justiça. É reconhecer que sem advocacia forte e valorizada, não há democracia efetiva nem garantia de direitos.
Trata-se de uma vitória não apenas da advocacia, mas do próprio sistema de justiça, que depende de regras claras, respeito aos precedentes e previsibilidade para todos os seus operadores.
A valorização dos honorários advocatícios é, em última análise, a valorização da Justiça. Honorários dignos significam incentivo à atuação responsável, combativa e ética. Ao reafirmar o que o STJ já havia pacificado, o Supremo Tribunal Federal sinaliza que a equidade não pode ser instrumento de flexibilização indevida da legalidade, tampouco pretexto para desvalorizar a essencialidade da advocacia.
Que essa decisão sirva de marco definitivo na consolidação de uma cultura jurídica que respeite a legalidade, a técnica e o papel essencial da advocacia.
A valorização dos honorários não é um privilégio corporativo; é uma exigência republicana.
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Referências
Estatuto da Advocacia e da OAB
Código de Ética e Disciplina
Supremo Tribunal Federal — Tema 1.402 da Repercussão Geral
Superior Tribunal de Justiça — Tema 1.076 dos Recursos Repetitivos
Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015), artigo 85
Constituição Federal, artigo 133
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