A Polícia Militar mata as pessoas certas?
3 de janeiro de 2025, 17h17
A prática de roubos cai, a letalidade policial cresce. Seria então o reconhecimento de que bandido bom é bandido morto. Simples assim. Se fosse verdade. Mas nem sempre o que parece corresponde ao que efetivamente é. Falamos de lógica, uma ciência que tem um princípio bem conhecido. Com a licença do latinório: “post hoc, ergo propter hoc“, algo como “depois disto, logo por causa disto”. É um tipo de falácia, um logro, um engano, uma falsa premissa, cujo efeito enganador é tremendamente eficiente.

Em São Paulo, comemora-se a queda de quase todos os índices de criminalidade. Ao mesmo tempo, o aumento acentuado da letalidade da ação policial fica restrito aos limites acadêmicos e da segunda página “in fine” dos grandes jornais. Quando muito uma chamada “para manter o hábito”. Implicitamente parece difusa pela sociedade a ideia de que “bandido bom é bandido morto” e que as mortes se justificam em prol da segurança pública.
Quando os índices de criminalidade parecem decair, então, a ideia parece se tornar convicção. Isto traz popularidade e cria uma figura de combate implacável contra o crime. Qualquer crítica é afogada, também, pelo fantasma de plantão, o PCC, que de organização criminosa se tornou um ente maligno, praticamente a essência do mal que paira sob tudo e todos.
Se tudo o que falam fosse verdade, o Brasil não teria Estado faz tempo. Só falta dizer que o PCC só acaba com exorcismo (ou quase isto na verdade). Pois bem, se o aumento da letalidade levou ao decréscimo dos índices de criminalidade, forçoso reconhecer que os indivíduos mortos eram os responsáveis pela prática de grande parte dos crimes praticados.
Então, para quem defende a ideia do “bandido bom é bandido morto”, a ação se justifica, os matadores devem ser reconhecidos como legítimos protetores da sociedade. Para muitos, é este policial, de arma na mão e cérebro não se sabe onde (mas podemos adivinhar), o legítimo defensor dos direitos humanos da Sociedade.
Não há relação entre mortes e diminuição da criminalidade
O estudo da lógica como ciência exige um pouco mais de cérebro e menos de fuzis. É que não existe correlação lógica entre as mortes ocorridas e os resultados posteriores que se imputa. A simples constatação de que o aumento da letalidade causa a diminuição da criminalidade implica na consideração de que a solução é definitiva, mas a oscilação dos índices comprova que não.

Tenho um argumento mais sutil, porém poderoso: a queda no índice geral de crimes possui exceções. A primeira é o aumento exponencial de um tipo de crime me específico: o latrocínio, qual seja o roubo onde a vítima acabou morrendo pela ação criminosa ou sofreu lesões graves capazes de causar o perigo de morte. A contradição é evidente. Se a letalidade é a causa inibidora da prática criminosa, jamais teria como consequência o aumento do conhecido latrô, como se diz corredores policiais.
O único dado concreto é que a violência criminosa aumentou tanto quanto a policial. Se a polícia mata mais, os criminosos também. E muito. Concluímos que, ou a letalidade policial é um fator inibitório do crime, ou o caminho está indo para o local errado. Ou a polícia está matando bandidos no varejo e o crime está caindo, ou está morrendo gente que não deveria.
Mas o povo não se perde em minúcias, e lógica não é matéria obrigatória nas escolas. Polícia matou, o crime baixou, porém mais pessoas morreram pela ação criminosa. Sendo assim, é melhor aumentar ainda mais a letalidade, criando-se um círculo vicioso. Quando é necessário se apontar alguma causa, o suspeito de praxe está aí ao lado: o PCC.
Não há nenhuma notícia de que a tal operação escudo tenha causado o desmantelamento do crime organizado na região. Muito menos a tal operação verão (fora de época). Morreram mais de 50 pessoas. Fica a pergunta: mudou alguma coisa? Pois é. E tome discurso, porém, como alguém já disse, “tô nem aí”. Matando, tudo bem, desde que valha um bom discurso e uns votos a mais.
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