Morte do arrendador/parceiro outorgante e (im)possibilidade dos sucessores exercerem retomada
18 de fevereiro de 2025, 11h23
A morte do arrendador ou parceiro outorgante traz consigo uma série de implicações jurídicas, dentre as quais encontra-se o direito de retomada do imóvel rural por parte de seus sucessores. Por essa razão, à luz da legislação pátria e da doutrina especializada, o presente artigo objetiva analisar a (im)possibilidade de os herdeiros exercerem esse direito.

O jurista alemão Rudolf Von Ihering, autor da teoria objetiva da posse, afirma que “um dos motivos pelo qual o jurista se distingue de todo outro homem está na diferença radical que estabelece entre as noções de posse e de propriedade” [1]. Inspirado nas lições do renomado jurista, nosso Código Civil prevê, em seu artigo 1.196, o conceito de possuidor como “todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade”.
Ademais, quando se fala da posse envolvendo imóveis rurais, é impossível não mencionar as previsões do Estatuto da Terra e de seu decreto regulamentador. Nesse sentido, o § 5º do artigo 92 do Estatuto da Terra, prevê que “a alienação ou a imposição de ônus real ao imóvel não interrompe a vigência dos contratos de arrendamento ou de parceria ficando o adquirente sub-rogado nos direitos e obrigações do alienante”.
O Decreto nº 59.566/1966, ao tratar da sucessão causa mortis, dispõe em seu artigo 23 o que segue:
“Art. 23. Se por sucessão causa mortis o imóvel rural for partilhado entre vários herdeiros, qualquer deles poderá exercer o direito de retomada, de sua parte, com obediência aos preceitos deste Decreto; todavia é assegurado ao arrendatário o direito à renovação do contrato, quanto às partes dos herdeiros não interessados na retomada.”
Ainda quanto à morte daquele que cede a posse do imóvel rural, o doutor em Direito e autor do livro A Parceria Agrícola no Direito Brasileiro, João Sidnei Duarte Machado, afirma que “não se dará a rescisão, entretanto, em face da morte do outorgante, pois seus herdeiros se sub-rogam nos direitos e obrigações contratuais” [2].

Na mesma linha, outro renomado jurista agrarista, Wellington Pacheco Barros, ensina que “se houve mudança na titularidade do arrendador por causa mortis, e o imóvel rural for partilhado entre vários herdeiros, surge para cada um deles o direito autônomo de retomar seu quinhão no mesmo prazo de 6 meses antes do vencimento do contrato determinado…” [3]. É o que também leciona Vilson Ferretto ao afirmar que os sucessores poderão exercer o direito de retomada, obedecidos o prazo do contrato e os requisitos legais para o exercício do direito [4].
Assim, o direito de retomada se transmite aos sucessores conjuntamente ao dever de respeitar os contratos vigentes, bem como a prévia notificação a ser recebida pelo arrendatário até seis meses antes do término do contrato. O que há, portanto, é a sub-rogação dos direitos e deveres do arrendador/parceiro-outorgante falecido aos seus herdeiros.
Por fim, não se pode perder de vista que, por mais que haja a transferência da propriedade após o registro do formal de partilha, não assiste aos transmitentes o direito de frustrar a posse daquele a detém legitimamente. Caso isso ocorra, o arrendatário ou parceiro-outorgante, possuidores legítimos, poderão se valer dos interditos possessórios.
Desse modo, conclui-se que a morte do arrendador/parceiro outorgante não extingue os contratos vigentes, mas, ao contrário, transfere aos herdeiros o direito de retomada, desde que observados os prazos e formalidades legais. A sub-rogação dos direitos e obrigações garante a continuidade das relações jurídicas, preservando tanto os interesses dos sucessores quanto dos arrendatários/parceiros outorgados e, principalmente, a função social da terra.
[1] In Teoria Simplificada da Posse. São Paulo: Editora Pillares, 2.005. Pag. 07-37.
[2] Machado, João Sidnei Duarte. A Parceria Agrícola no Direito Brasileiro. Porto Alegre. Fabris, 2004, pág. 468 e 469.
[3] Barros, Wellington Pacheco. Curso de Direito Agrário. Editora Livraria do Advogado, 9ª ed, pág 124.
[4] Ferreto, Vilson. Contratos Agrários: Aspectos Polêmicos, Editora Saraiva, 1ª Ed., 2009, pág 57.
Encontrou um erro? Avise nossa equipe!