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CNJ mantém no Plenário Virtual caso de infração funcional de cartorário com Alzheimer

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17 de fevereiro de 2025, 9h56

O conselheiro Pablo Coutinho Barreto, do Conselho Nacional de Justiça, manteve na pauta do Plenário Virtual um recurso sobre o registro de prática de infração funcional grave por parte de um oficial cartorário, já aposentado, que tem doença de Alzheimer. A decisão foi tomada 30 minutos após o protocolo da petição, no início deste mês de fevereiro.

Idoso carimbando documento

Para o relator, filha do cartorário não comprovou que ele já era incapaz quando foi aberto o processo administrativo

A filha e curadora do cartorário pretendia levar a análise do caso para uma sessão presencial. Ela alegava que isso lhe daria “plena oportunidade de expor seus argumentos” contra a sanção imposta.

Segundo ela, a questão é de alta complexidade e relevância, o que demandaria um debate “de forma síncrona”, para que a análise fosse aprofundada.

Mas Barreto não viu “qualquer particularidade” que justificasse a retirada do recurso da pauta virtual. O conselheiro explicou que o julgamento feito desta forma busca garantir “a razoável duração do processo e a celeridade de sua tramitação”, sem violar o direito da parte de apresentar seus argumentos.

Ele ainda apontou que, conforme o Regimento Interno do CNJ, não é possível fazer sustentação oral em recursos administrativos.

Histórico

O homem de 78 anos era oficial cartorário desde 1992. Ele atuava no 2º Cartório de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos, Civil de Pessoas Jurídicas e Tabelionato de Protestos de Letras e Títulos de Catanduva (SP).

Em 2023, ele passou a enfrentar um processo administrativo. Segundo a denúncia, ele teria deixado de comparecer ao cartório e delegado funções de seu cargo à sua filha, oficial substituta, pelo menos desde 2019.

O juiz Lucas Figueiredo Alves da Silva, da 1ª Vara Cível de Catanduva, suspendeu as atividades do oficial e determinou que metade de sua renda líquida fosse depositada em uma conta bancária especial.

A punição máxima era a perda do cargo. Mas o cartorário já havia se aposentado em 2024. Isso porque, desde 2014, ele estava, sem saber, com a doença de Alzheimer, que se manifesta aos poucos e avançou ao longo do processo administrativo.

Mesmo assim, o juiz prosseguiu com o processo devido ao impacto financeiro da decisão. Caso fosse absolvido, o cartorário receberia a metade da sua renda que estava depositada na conta especial. Com a condenação, o valor foi entregue ao interventor no cartório, indicado pelo magistrado.

Em junho do último ano, Alves da Silva condenou o homem por “inassiduidade e subdelegação dos serviços”, determinou a perda do posto que já estava vago e ordenou que ficasse registrada a prática de infração funcional grave.

A filha recorreu contra esta última determinação. Ela argumentou que uma pessoa incapaz é inimputável e, portanto, não comete infrações.

A Corregedoria-Geral da Justiça de São Paulo manteve a decisão por entender que o oficial não comunicou sua doença ao órgão e não comprovou sua incapacidade à época das acusações — ou seja, não apresentou documento médico referente ao período entre 2014 e 2023.

A decisão da Corregedoria destacou que a incapacidade civil do cartorário só foi constatada pela perícia em 2023. Além disso, em 2021, ele renovou sua carteira nacional de habilitação, o que não seria possível para alguém com demência em grau avançado.

Em novo recurso, desta vez ao CNJ, a filha, representada pelo escritório Tourinho Leal Drummond de Andrade Advocacia, apresentou exames que demonstravam que o pai começou a ter problemas cognitivos em 2014.

Os advogados reforçaram que uma pessoa diagnosticada com Alzheimer não poderia ser considerada culpada por atos administrativos.

A defesa ainda ressaltou que o Estatuto do Idoso exige participação do Ministério Público no processo, o que não ocorreu.

Em dezembro de 2024, Barreto, relator do caso no CNJ, manteve a decisão da Corregedoria paulista. De acordo com ele, o Estatuto do Idoso prevê a atuação do MP somente em prol de pessoas idosas em situação de risco. Para o conselheiro, não ficou comprovado que o oficial estava nestas condições.

“Não se verifica ter havido flagrante ilegalidade na decisão questionada que justifique a atuação do Conselho Nacional de Justiça, que, nos termos de sua firme jurisprudência, intervirá apenas excepcionalmente diante de questões de interesse geral”, assinalou.

A filha recorreu ao Plenário do CNJ. A última decisão deste mês garantiu que esse recurso será julgado em sessão virtual.

Clique aqui para ler a decisão
Processo 0008083-92.2024.2.00.0000

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