STF suspende análise sobre indenizações a filhos separados de pais com hanseníase
12 de fevereiro de 2025, 9h58
Um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes interrompeu nesta terça-feira (11/2) o julgamento em que o Plenário do Supremo Tribunal Federal discute se deve ser aplicado o prazo prescricional de cinco anos para pedidos de indenização contra o governo federal feitos por pessoas separadas de seus pais acometidos de hanseníase (doença antigamente conhecida como lepra) no século passado.

Estado brasileiro adotou, entre décadas de 1920 e 1970, política de separar pessoas com hanseníase dos filhos
A sessão virtual havia começado na última sexta-feira (7/2), com fim previsto para esta sexta (14/2).
Antes do pedido de vista, três ministros haviam se manifestado. Dias Toffoli e Alexandre de Moraes consideraram que tais pedidos de indenização são imprescritíveis. Já Flávio Dino sugeriu que o prazo prescricional de cinco anos seja aplicado, mas comece a ser contado somente após o julgamento.
Contexto
Causada por uma bactéria, a hanseníase provoca manchas e lesões na pele, falta de sensibilidade e danos aos nervos.
O Decreto 20.910/1932 estabelece que qualquer direito ou ação contra governos prescreve em cinco anos a partir da data do fato de origem. Uma entidade de defesa dos atingidos pela hanseníase pede que esse prazo seja afastado para os pedidos de indenização dos filhos separados de pais com hanseníase.
A partir de 1920, o Estado brasileiro adotou uma política pública de tratamento da hanseníase, que previa a internação e o isolamento compulsório dos enfermos. Os filhos dessas pessoas eram separados dos pais e enviados a instituições de internação de crianças ou deixados com parentes ou adotantes.
Cerca de 16 mil crianças foram separadas dos pais com hanseníase. Somente em 1976 o Ministério da Saúde deu fim à política de segregação.
O movimento autor da ação aponta grave violação de direitos humanos. Depoimentos de filhos separados indicam danos psíquicos e sociais (depressão, angústia, medo, incapacidade para o trabalho, dificuldade nas relações interpessoais), abusos dentro das instituições públicas, formação educacional precária, etc.
Voto do relator
Toffoli, relator do caso, considerou que os pedidos de indenização contra a União pelos filhos separados de pessoas atingidas pela hanseníase não prescrevem. Ele foi acompanhado por Alexandre.
O magistrado constatou que, além da violência da separação forçada, as crianças e os adolescentes “sofreram sistematicamente maus tratos, abusos e preconceito, que ocasionaram danos de difícil reparação”.
Isso já foi reconhecido pelo próprio Estado brasileiro. A Lei 11.520/2007, que teve origem em uma medida provisória, estabeleceu uma pensão mensal especial às pessoas atingidas pela hanseníase e submetidas à internação compulsória em hospitais-colônia até 1986.
Mais tarde, a Lei 14.736/2023 ampliou o número de pessoas que podem ser beneficiadas: incluiu aquelas submetidas a isolamento domiciliar e em seringais, além dos filhos privados de liberdade.
Mas o relator explicou que a ação vai além das previsões dessas leis: “A despeito da instituição de pensão mensal vitalícia aos filhos das pessoas atingidas pela doença, não se oportunizou ferramenta legal que permitisse outra forma de indenização àquelas pessoas que assim escolhessem, como assegura o direito à opção”.
Para o ministro, a exigência do prazo prescricional de cinco anos nesses casos é “faticamente inconcebível”, pois, à época da separação forçada, os filhos eram crianças e adolescentes, sujeitos às mais diversas violações.
“Considerar, no presente caso, que incidiria o prazo prescricional quinquenal previsto no decreto para tal é esvaziar, por absoluto, o conteúdo desse direito”, assinalou.
O magistrado lembrou que grande parcela dos filhos separados já tem idade avançada. Por isso, ressaltou que as ações individuais movidas por eles devem tramitar de forma “absolutamente prioritária”.
Divergência
Dino propôs que os pedidos de indenização baseados nas leis de 2007 e 2023 prescrevam no prazo de cinco anos, contado a partir da publicação de cada uma dessas normas. Com relação às ações propostas especificamente pelos filhos separados dos pais, ele sugeriu que o prazo prescricional comece a ser contado a partir da publicação da ata de julgamento.
Dino reconheceu que os filhos sofreram violações de direitos fundamentais ao longo de décadas, mas entendeu que afastar completamente a regra do decreto de 1932 “resultaria em insegurança jurídica e na proliferação de demandas tardias”.
Assim, ele considerou mais adequado ajustar o prazo de prescrição e implementar um período de transição “que evite prejuízos excessivos tanto à administração pública quanto aos beneficiários da medida”.
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