Licenciamento ambiental: entre a avaliação de impactos ambientais e a avaliação de riscos
26 de abril de 2025, 16h32
Entre a necessidade de desenvolvimento econômico e a proteção ambiental, está presente o licenciamento ambiental como um desafio importante tanto para a gestão pública quanto para a iniciativa privada, que é chamada cada vez mais a integrar na perspectiva dos negócios verdes o viés do uso racional dos recursos naturais, da minimização de impactos ambientais negativos e no asseguramento do desenvolvimento de empresas que gerem riquezas e prosperidade integral, a partir de relações éticas com a natureza e com as pessoas.

Ainda, quando há afetação negativa dos recursos naturais, o que é inevitável, é preciso que se constituam formas menos agressivas na substituição do ambiente natural e na exploração dos recursos e também se avance na regeneração, recuperação e manutenção de ambientes semelhantes que sirvam de testemunhos fieis da natureza original.
Nesse viés, importante destacar que as décadas de estudos e implementação de empreendimentos no Brasil apontam caminhos claros, muitas vezes certeiros sobre o que se fazer em termos de mitigação e compensação de impactos ambientais.
Assim, no mais das vezes, é perfeitamente possível o estabelecimento de um licenciamento ambiental baseado em padrões e em medidas preestabelecidas de mitigação e compensação, que tornem o processo de licenciamento ambiental mais racional, objetivo e eficaz. Uma espécie de linha de produção em que estudos, medidas, ações e compensações possam ser pré ordenados e estabelecidos pelos órgãos ambientais, conferindo previsibilidade integral, segurança técnica e jurídica. Essa é a forma racional que pode transformar o licenciamento ambiental num motor para o desenvolvimento sustentável brasileiro e não, como tem sido muitas vezes, num percalço a ser transposto no meio do caminho de empreendimentos.
Claro que isso não serve para qualquer território e há que se ter tratamento diferenciado quando a situação envolver questões complexas, ausência de conhecimento sobre o território a ser afetado e ainda quando a situação envolver comunidades tradicionais ou vulneráveis e regiões onde os serviços públicos e a presença do estado seja muito precária.
Ainda, uma estrutura e diretrizes bem determinadas e claras quanto ao planejamento do desenvolvimento territorial nos diferentes estados e municípios, além de informações transparentes sobre a disponibilidade dos recursos naturais, humanos e econômicos e infraestrutura, é mais do que necessária para servir como base de estruturação de uma gestão integrada e integral dos territórios ordenando modelos de desenvolvimento em territórios com baixo desenvolvimento e modelos de regeneração em territórios que se desenvolveram de forma desordenada.
Dadas essas premissas, o licenciamento ambiental que olha os empreendimentos de forma individual pode, sim, ser transformado em algo menos burocrático e mais eficiente em todos os sentidos.
Especialmente porque, como foi dito anteriormente, os mais variados tipos de empreendimentos e seus impactos negativos são plenamente conhecidos assim como as medidas usuais e necessárias à mitigação de impactos ambientais. Afinal, são décadas de experiência acumulada e produção de conhecimento técnico-científico aplicado ao licenciamento.
Um tema que surge nessa discussão quanto à racionalidade a ser conferida no licenciamento diz respeito ao gerenciamento de riscos dos empreendimentos. É dizer: situações de acidentes e eventualidades negativas que podem decorrer da instalação ou operação de empreendimentos que não esperados mas que caso aconteçam podem gerar efeitos adversos de grande monta.
O gerenciamento de riscos e o caminho da prevenção a acidentes com adoção de medidas capazes de evitar e conter eventualidades é um tema sensível no licenciamento ambiental porque é preciso a definição de medidas preventivas e controles eficientes para assegurar a proteção adequada, porém dosando adequadamente para que não haja restrições desproporcionais ao risco.
Práticas excessivamente restritivas e que criam medidas de contenção de riscos podem engessar o desenvolvimento sem ganho real para o meio ambiente.
Nesse sentido, um exemplo recente de proporções nacionais ganha destaque no tema do risco. É o caso do licenciamento ambiental da Margem Equatorial no estado do Amapá. Os estudos para avaliação da bacia petrolífera que estão sob aprovação do Ibama apontam o indeferimento do licenciamento ambiental, entre os motivos, em razão de que o empreendedor não apresentou medidas adequadas para o resgate e salvamento de animais marinhos em caso de acidente de vazamento. O Ibama considerou necessários mais detalhamentos sobre a “adequação integral do plano ao manual de boas práticas de manejo de fauna atingida por óleo, como a presença de veterinários nas embarcações e quantitativo de helicópteros para atendimento de emergências”.
Aqui, o gerenciamento do risco em caso de acidente de vazamento de petróleo em alto mar que possa afetar os animais marinhos está exigindo a presença de helicópteros na plataforma de operação que ficará distante, no mínimo, 170 quilômetros da costa. O alto custo da medida de manutenção de vários helicópteros e veterinários, comparado com o risco de acidente, deve ser avaliado e dimensionado com o grau de risco quando se sabe que não são comuns os acidentes com vazamento de petróleo nas plataformas marinhas.
De fato, riscos ambientais inovadores ou emergentes correspondem à probabilidade de ocorrerem eventos incertos — frequentemente inéditos ou raros — que podem gerar consequências ambientais negativas expressivas. Exemplos: possíveis rompimentos de estruturas, vazamentos de substâncias químicas, falhas ligadas a processos tecnológicos, explosões etc.
Os riscos emergentes contam, por definição, com menos previsibilidade e não se enquadram nos padrões consolidados para impactos ambientais negativos comuns.
Do ponto de vista jurídico, o tratamento diferenciado entre impactos ambientais e riscos emergentes deve ser diferenciado, pois um é voltado para o conhecido e certo e o outro, para o incerto e muitas vezes raro.
Logo, não devem ser exigidas as mesmas medidas para a mitigação e para o gerenciamento de riscos cujas medidas de mitigação devem ser compatíveis com a probabilidade da ocorrência do evento e se centrar com maior ênfase na prevenção.
Estimativas sobre a chance de ocorrência e o potencial de dano com dados científicos e ferramentas quantitativas devem permitir uma avaliação dinâmica diante de informações novas ou cenários inesperados.
Cabe a adoção integral do princípio de proporcionalidade, de modo que a severidade das exigências deve ser compatível com a magnitude e a probabilidade do risco, evitando tanto o relaxamento indevido quanto o excesso de rigor apenas teórico e de pouco resultado ambiental efetivo.
A implementação de programas de monitoramento robustos para detectar precocemente sinais de ocorrência do risco e a revisão periódica dos planos e ajuste das ações de controle podem ser muito mais úteis.
Gerenciar riscos ambientais vai muito além de simplesmente aplicar o que já está estabelecido para impactos conhecidos. O tratamento diferenciado, com base na teoria do risco, permite medidas equilibradas, eficazes e proporcionais, assegurando tanto a segurança jurídica quanto a viabilidade de empreendimentos. O equilíbrio, portanto, está em não desconsiderar riscos potenciais, mas também não impor restrições excessivas quando a prevenção e o controle se mostram eficazes e suficientes — construindo, assim, um modelo de licenciamento ambiental robusto e orientado para o desenvolvimento sustentável.
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