O ano de 2025 marca os 25 anos da Lei de Responsabilidade Fiscal. Embora não tenha conseguido cumprir todas as expectativas, a LRF não foi apenas um marco jurídico, ela representou um divisor de águas institucional. Expressou o amadurecimento do Estado brasileiro ao vincular a ação governamental à responsabilidade intergeracional. Ao impor limites e disciplinar a gestão fiscal, a LRF consolidou o princípio de que o equilíbrio das contas públicas não é obstáculo, mas fundamento para políticas públicas sustentáveis.
É nesse contexto simbólico e institucional que se insere o Projeto de Resolução do Senado nº 8, de 2025, apresentado pelo senador Renan Calheiros, que visa a fixar o limite da dívida consolidada da União em quatro vezes a sua receita corrente líquida (atualmente está em mais de sete vezes). O projeto estabelece um prazo de 15 exercícios financeiros para que esse limite seja cumprido, com uma trajetória de ajuste definida e mecanismos de responsabilização política e transparência ativa.
A medida não apenas corrige uma lacuna histórica — a ausência, até hoje, de limite para a dívida da União, diferentemente do que já ocorre com os estados e municípios —, como também representa um gesto político de reverência ao espírito da LRF. Afinal, já em 2000, o então presidente da República encaminhou proposta de limite da dívida federal, que nunca chegou a ser convertida em norma. Retomar essa agenda é, portanto, mais que um avanço técnico; é a reafirmação de um compromisso.
Regras fiscais no exterior
No plano internacional, o debate sobre regras fiscais também evoluiu. Após a crise financeira global de 2008, surgiram novas gerações de regras — mais flexíveis, mais sofisticadas, mas também, como alertei em artigo publicado na revista Interesse Público¹, menos transparentes e mais difíceis de acompanhar pela sociedade e mesmo pelo Parlamento. A busca de equilíbrio entre simplicidade, flexibilidade e efetividade se tornou o grande desafio do desenho das novas normas fiscais. No mesmo texto, apontei que regras bem desenhadas exigem não apenas limites claros, mas instituições independentes para monitorar e dar publicidade ao seu cumprimento.
O projeto atualmente em análise no Senado vai nessa direção. Ele adota uma regra clara (limite da dívida em função da receita), com um horizonte de médio e longo prazo, e prevê mecanismos de prestação de contas e de exposição pública em caso de descumprimento. Tais elementos contribuem para reforçar a credibilidade do arcabouço fiscal brasileiro e podem ampliar o espaço para políticas públicas mais eficazes, mediante a redução dos prêmios de risco e o aumento da confiança dos agentes econômicos.
Spacca
Novo arcabouço fiscal
É importante observar que a fixação de um limite para a dívida da União não conflita com o novo arcabouço fiscal (Lei Complementar nº 200/2023), mas o complementa. Se o arcabouço regula a dinâmica do resultado primário e os limites de crescimento do gasto, o projeto em discussão cria uma âncora de longo prazo, voltada à sustentabilidade da dívida. Trata-se, portanto, de uma medida sistêmica, que completa a arquitetura fiscal brasileira com um novo pilar de estabilidade.
Ao aprovar tal proposta, o Senado estará não apenas cumprindo uma obrigação constitucional há muito negligenciada, mas também prestando uma homenagem efetiva à LRF, no ano de seu 25º aniversário. E, mais do que isso, sinalizará que o Brasil está disposto a alinhar-se às melhores práticas internacionais em matéria de governança fiscal, com realismo, prudência e respeito às gerações futuras.
¹ LIMA, Edilberto Carlos Pontes. Nova geração de regras fiscais: solução ou novos problemas? Revista Interesse Público, ano 22, n. 119, p. 211-221, jan./fev. 2020.
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