STJ decide reavaliar rigor para julgar fundadas suspeitas em ações da polícia
8 de abril de 2025, 20h25
A 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça vai reavaliar o rigor com que tem enfrentado casos em que policiais fazem abordagens baseadas no que entendem como fundadas suspeitas de que alguém está cometendo um crime.

Existência de fundadas suspeitas é uma premissa para validar a abordagem pessoal feita por policiais
Até o momento, a posição do colegiado vem sendo a de que o mero nervosismo do suspeito ao ver a aproximação de policiais ou guardas e o fato de estar em local conhecido como ponto de tráfico de drogas não bastam para revistar alguém.
Essa jurisprudência foi inaugurada pela própria 6ª Turma, na tentativa de evitar que policiais pratiquem abusos em abordagens exploratórias “de rotina”, com base em elementos subjetivos como intuição policial ou preconceitos.
O problema é que decisões do Supremo Tribunal Federal vêm seguindo o caminho oposto, inclusive para reformar acórdãos do STJ que aplicaram essa posição.
A 1ª Turma do STF (formada pelos ministros Cristiano Zanin, Cármen Lúcia, Luiz Fux, Alexandre de Moraes e Flávio Dino) tem decisões validando abordagens policiais motivadas por mero nervosismo ou denúncia anônima, inclusive quando há invasão de domicílio sem autorização judicial.
E a 2ª Turma (ministros Dias Toffoli, André Mendonça, Nunes Marques, Edson Fachin e Gilmar Mendes) já tem decisão no mesmo sentido, no caso de uma pessoa abordada porque estava em “notável ponto de tráfico de drogas”.
Esse cenário gerou debate sobre o tema das fundadas suspeitas nesta terça-feira (8/4), e motivou pedidos de vista do ministro Sebastião Reis Júnior em cinco processos. Ele pretende fazer um levantamento de precedentes do Supremo “para saber exatamente o que está acontecendo”. Isso pode levar a uma nova correção de rota jurisprudencial no STJ.
Fundadas suspeitas em debate
O debate foi motivado por um voto-vista do ministro Og Fernandes em um processo sobre dois homens que foram abordados porque estavam sentados na calçada, usando pochetes, e demonstraram nervosismo ao ver a viatura.
Com base nos precedentes do STF, o ministro concluiu que a ação policial foi bem justificada e validou as provas. Relator, o ministro Antonio Saldanha Palheiro inicialmente votou aplicando a jurisprudência da 6ª Turma, mas se animou a mudar o voto.
Não é a primeira vez que ambos apontam que o mero nervosismo basta como fundada suspeita para justificar a abordagem pessoal, como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico.
“O que é nervosismo?”, indagou o ministro Sebastião Reis Júnior durante os debates. “(Nervosismo) É o que o policial disser que é”, pontuou o ministro Rogério Schietti, crítico desse tipo de justificativa para as abordagens.
“Se eu estou numa rua, vejo a autoridade policial e paro, isso é atitude suspeita? Para o policial, pode ser que sim”, continuou Reis Júnior ao tratar do subjetivismo que a jurisprudência, até então, tentava evitar.
O ministro Saldanha Palheiro apontou que a segurança pública no país está vivendo um momento crucial, de muita sensibilidade política e social, e disse que o tribunal não pode ser instrumento de inibição da atuação policial.
“Dessa polícia atual, (podemos) sim”, disse o ministro Schietti. “Ela comete ilegalidade e abusos todos os dias”, continuou. “Mas nós temos essa polícia”, rebateu Saldanha Palheiro.
“Precisamos orientá-la a agir em respeito ao cidadão. Não podemos autorizar que as pessoas sejam submetidas a todo tipo de abuso”, sustentou Schietti. “Por isso continuamos a carregar a responsabilidade de a segurança pública não avançar”, rebateu Saldanha.
Jurisprudência em transformação
Fato é que o maior rigor do STJ sobre as fundadas razões vem sendo mesmo diluído. Pouco a pouco, a posição da corte vem sendo flexibilizada.
Um bom exemplo está nas abordagens motivadas pela fuga do suspeito ao ver a viatura. Inicialmente, as turmas criminais não consideravam essa atitude como fundada suspeita para a abordagem pessoal. Essa percepção mudou em julgamento da 3ª Seção, em 2024.
Ainda assim, a 6ª Turma vem sopesando bem o relato dos policiais sobre essas fugas. Quando não há elementos de comprovação — como as imagens das câmeras corporais —, as dúvidas são resolvidas a favor dos suspeitos.
Até mesmo a posição sobre a invasão de domicílio em casos em que suspeitos fogem para dentro de casa ao ver a viatura vem passando por transformações graças a decisões do STF validando essas ações policiais.
Veja em quais casos a 6ª Turma vai discutir a questão
Processo | Caso concreto |
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Hc 887.292 | Suspeitos abordados por demonstrar nervosismo ao ver a viatura em local conhecido por tráfico de drogas. |
HC 862.206 | Suspeitos abordados porque foram visto por policiais entregando algo um para o outro. |
HC 862.206 | Suspeitos abordados por policiais porque mudaram de conduta ao ver a viatura. Um passou a soltar pipa, outro sentou-se rapidamente no chão. |
HC 949.818 | Suspeitos abordados por guardas municipais com base em denúncia anônima. |
HC 949.818 | Suspeito abordado porque estava sentado no chão, digitando em seu celular e com uma bolsa preta em mãos. |
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