Jurisprudência defensiva

STJ vai reavaliar veto ao uso de reclamação em casos de teses vinculantes

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23 de setembro de 2024, 8h55

O Superior Tribunal de Justiça vai reavaliar se a reclamação constitucional pode ser utilizada contra o descumprimento das teses vinculantes que fixa, por meio dos julgamentos de recursos repetitivos.

STJ sede prédio

STJ adotou jurisprudência defensiva para evitar explosão do número de reclamações constitucionais

Previsto no artigo 102, inciso I, alínea “l”, da Constituição, a reclamação permite a preservação da competência e da autoridade das decisões dos tribunais, sempre que forem informados pelas partes de algum desrespeito ou descumprimento legal.

A posição no STJ até agora é de vetar esse uso para discutir a aplicação errada ou mesmo a não aplicação das teses vinculantes. Trata-se de jurisprudência defensiva adotada pelos colegiados.

Foi o que levou a Comissão de Jurisprudência a sugerir a edição de uma súmula sobre o tema:

A reclamação constitucional não é instrumento adequado para o controle da aplicação dos entendimetnos firmados pelo Superior Tribunal de Justiça em recursos especiais repetitivos

A proposta foi feita à Corte Especial, que reúne os 15 ministros mais antigos do STJ. Na última quarta-feira (18/9), eles deram indícios de que podem rever essa orientação.

O julgamento da súmula foi suspenso por pedido de vista da ministra Nancy Andrighi. Enquanto isso, os demais se comprometeram a selecionar processos que possam suscitar o debate, para uma reavaliação no STJ.

Distorção no sistema

Como mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico, a posição do STJ cria uma distorção no sistema: o tribunal fixa posição e exige seu cumprimento, mas abre mão de fazer qualquer tipo de controle sobre isso.

Essa postura defensiva decorre do fato de que admitir o uso da reclamação significaria receber e julgar cada descumprimento de precedente, o que aumentaria ainda mais o volume de processos.

Esse entendimento é alvo de críticas dos próprios ministros e de especialistas como o constitucionalista, Lenio Streck, colunista da ConJur, que vê uma violação da Constituição praticada pelo STJ.

Tanto é assim que o próprio Supremo Tribunal Federal aceita o uso da reclamação contra o desrespeito de suas teses firmadas em controle de constitucionalidade e com repercussão geral reconhecida.

A existência dessa classe processual é uma criação do STF, com base na doutrina dos poderes implícitos (implied powers), delineada na Suprema Corte dos Estados Unidos. Ela só passou a constar “no papel” a partir da Constituição de 1988.

Assim, o STF tem usado a reclamação até para esclarecer a extensão do conteúdo da decisão paradigma (função integrativa) e para exercer um novo juízo sobre casos já julgados.

Esse cenário é o que levou os ministros da Corte Especial do STJ a se oporem, inicialmente, à aprovação da súmula sobre o tema, apesar da jurisprudência.

Chegou o dia

A primeira a se manifestar foi a ministra Isabel Gallotti, que ponderou que “vai chegar o dia que vamos ter que ter alguma forma de exercer controle sobre a aplicação dos repetitivos”.

Uma das possibilidades citadas por ela é a de admitir a reclamação constitucional por um critério de relevância do desrespeito à tese.

“Se for uma coisa flagrantemente contrária à ratio (razão de decidir) do precedente, penso que deveria caber a reclamação, sim”, disse. “Está havendo uma aplicação totalmente distorcida dos repetitivos e nós não temos instrumento para verificar isso.”

Em seguida, o ministro Raul Araújo classificou como “paradoxal” o fato de o STJ admitir reclamação quando a decisão afronta acórdãos em recursos especiais “comuns” e, mas não quando trata de repetitivos.

Já o ministro Luis Felipe Salomão disse que passou a reavaliar o tema a partir da jurisprudência do Supremo. “Podemos, por razões defensivas, fazer o que estamos a fazer, mas sabemos que, em algum momento, isso terá que receber um reexame de nossa parte.”

Membro da comissão de jurisprudência, o ministro Sebastião Reis Júnior disse que a proposta de súmula somente aplicou a jurisprudência pacífica e ponderou que a recusa poderia abrir o caminho para o aumento de reclamações.

“Não sei se houve a diminuição desse tipo de ação. Com essa possibilidade de rediscutir o tema, acho que isso vai dar corda que a reclamação volte a ser usada”, afirmou.

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