Opinião

Debate para transparência na relação médico-indústria pela nova resolução do CFM

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17 de setembro de 2024, 20h48

Recentemente, o CFM (Conselho Federal de Medicina) publicou a Resolução nº 2.386/2024 com o objetivo de conferir mais transparência nas interações entre a classe médica e a indústria farmacêutica, de insumos e equipamentos médicos para, desta forma, prevenir conflitos de interesse que possam influenciar decisões médicas.

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Médico preenche formulário em prancheta

Iniciativas para aumentar a transparência da relação médico-indústria não são novidade. Globalmente, a iniciativa pioneira foi o Sunshine Act, norma norte-americana de 2010 que obriga fabricantes de medicamentos, insumos e produtos para saúde a informarem pagamentos em favor de médicos e hospitais de ensino.

Já no Brasil, os Projetos de Lei 204/2019 e 7.990/2017, ainda em tramitação no Congresso, visam a estabelecer um marco regulatório voltado às interações entre médico e indústria, carecendo de legislação federal que verse sobre o assunto. Em âmbito estadual, Minas Gerais instituiu dinâmica similar por meio das Leis estaduais nº 22.440/2016 e nº 22.921/2018.

Conteúdo da norma

A Resolução CFM nº 2.386/2024 segue a mesma lógica inaugurada com o Sunshine Act, com a diferença de que, em decorrência do escopo de atuação do CFM, as obrigações e vedações são direcionadas apenas aos profissionais médicos.

São considerados vínculos entre o profissional e indústria, sujeitos ao reporte: contratos formais de trabalho; prestação de serviço ocasional e/ou remunerado; realização e participação em pesquisas para desenvolvimento de novos produtos; convite ou contratação mediante remuneração para fazer divulgação da empresa como palestrante remunerado; atuação como palestrante (speaker); e participação na Comissão Nacional de Incorporação Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec) e de conselhos deliberativos similares.

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Por outro lado, os médicos estão expressamente dispensados de reportar: rendimentos e dividendos decorrentes de seus investimentos em ações ou cotas de participação em empresas do setor de saúde, contanto que se trate de uma relação puramente financeira; amostras grátis de medicamentos e/ou produtos regularizados na Anvisa recebidos das empresas do setor; e benefícios recebidos por sociedades científicas e entidades médicas.

Procedimento, prazo e sanções

Pela nova norma, os vínculos devem ser reportados por meio da plataforma CRM-Virtual do Conselho Regional de Medicina em que estão registrados. Os médicos devem informar o nome da respectiva empresa ao CRM aplicável, no prazo de 60 dias contados do recebimento do respectivo benefício. O término do vínculo também deve ser informado.

O descumprimento das obrigações estabelecidas pela Resolução CFM nº 2.386/2024 poderá ensejar a aplicação de penalidades disciplinares (que variam desde advertência até cassação do exercício profissional) ao profissional pelo respectivo CRM, ou em caso de cassação, pelo próprio CFM.

A fim de possibilitar um período para os profissionais de saúde se adaptarem a esta nova dinâmica, a Resolução CFM nº 2.386/2024 prevê um prazo de 180 após sua publicação para entrar em vigor, de modo que passara viger efetivamente a partir de março de 2025.

A nova norma instituída representa um importante avanço na regulação das relações entre médicos e indústria. Cabe destacar, contudo, que, em razão da nova obrigação imposta aos médicos por meio da Resolução CFM nº 2.386/2024 carecer de autorização legal específica, a expectativa é de que a resolução seja alvo de questionamentos sobre a sua legalidade.

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