Teoria do domínio do fato embasa condenação de recrutador de ‘mulas’
14 de setembro de 2024, 8h22
Um homem não foi surpreendido com um grama sequer dos 18,2 quilos de cocaína que seriam levados à Europa em um navio de cruzeiros, a partir do Porto de Santos (SP), mas a teoria do domínio do fato embasou a sua condenação por tráfico internacional de drogas.
A pena aplicada foi de 11 anos, quatro meses e três dias de reclusão, em regime inicial fechado, sendo vetada a possibilidade de recorrer em liberdade.
A cocaína estava escondida nas bagagens de outras três pessoas (duas mulheres e um homem). Durante inspeção de rotina, ela foi descoberta por agentes da Polícia Federal no momento em que os viajantes embarcariam no navio Costa Diadema com destino a Barcelona, na Espanha, em 18 de abril de 2022.
O homem estava supostamente sozinho, separado das duas mulheres. A PF elaborou dois autos de prisão em flagrante distintos.
“G.L.H. foi o autor intelectual dos delitos de tráfico de droga, na medida em que detinha o domínio do fato delituoso, ou seja, decidiu quando, como, onde e quem iria participar do envio da elevada quantidade de cocaína ao exterior, além de ter fornecido os meios materiais para a prática do crime”, sentenciou o juiz Roberto Lemos dos Santos Filho, da 5ª Vara Federal Criminal de Santos.
Após a prisão em flagrante dos três passageiros surpreendidos com entorpecentes em suas malas, que eram iguais, a PF deu sequência às investigações e pediu à Justiça ordem para quebrar seus sigilos telemáticos. Uma perícia nos aparelhos revelou que eles mantiveram contatos com o homem.
Com essa prova, o julgador se convenceu de que o trio estava sendo “coordenado” pelo réu na viagem internacional que faria de navio.
Denunciado pelo Ministério Público Federal por tráfico e associação para o tráfico, o homem negou os crimes. Ele alegou que apenas intermediou a contratação do cruzeiro para os autuados, enviando-lhes documentos de viagem. E disse também que sequer conhecia as mulheres, cujos contatos lhe foram passados por um amigo, responsável pela venda dos pacotes turísticos.
Relação de subserviência
Para o julgador, ficou caracterizada a relação de subserviência dos viajantes em relação ao acusado, “de sorte que a este deve, também, ser atribuído o domínio do fato em relação às ações ilícitas perpetradas”.
Lemos justificou o réu como autor intelectual porque ele “arquitetou mentalmente a estrutura do delito com o objetivo de permitir sua operacionalização”.
Embora a PF tenha apreendido cocaína na bagagem do homem (6,7 quilos) e nas malas das mulheres (11,4 quilos), o julgador ponderou que a tentativa do envio da droga ao exterior configurou um crime único. “Entender de modo contrário seria incorrer em bis in idem.”
Em relação ao pedido do MPF para o homem ser também condenado por associação para o tráfico, o juiz anotou inexistirem nos autos provas suficientes de que ele mantivesse “estabilidade e permanência”, como exige o tipo penal desse crime, na reunião firmada com o trio preso em flagrante. Desse modo, o julgador absolveu o réu por esse delito.
O MPF também requereu, em função do envolvimento do acusado no esquema e sua possível interferência nas investigações, sua prisão preventiva, que foi deferida.
Processo 5005702-66.2022.4.03.6104
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