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'Precedente não é escolha filosófica ou ideológica, é a única alternativa', afirma Barroso durante evento

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9 de setembro de 2024, 18h18

Para o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luís Roberto Barroso, o Poder Judiciário só tem uma escolha na busca por efetividade, isonomia, segurança jurídica e eficiência: a obediência aos precedentes.

Luís Roberto Barroso

Ministro Barroso fez a palestra de abertura de evento sobre precedentes sediado no TST

Essa fala foi proferida na palestra de abertura do VI Encontro Nacional sobre Precedentes Qualificados, organizado pelos tribunais superiores em Brasília e sediado pelo Tribunal Superior do Trabalho.

No evento, Barroso falou sobre a ascensão institucional do Judiciário no mundo pós-Segunda Guerra, na função de habilitado a resolver conflitos e garantir direitos. E sobre como no Brasil esse fenômeno se intensificou devido à larga abrangência da Constituição de 1988.

O resultado foi a expressiva judicialização, que faz com que o país tenha em trâmite quase 85 milhões de processos. A massificação das demandas levou à necessidade de encontrar saídas tecnológicas e processuais — e é nessa última categoria que emergem os precedentes.

“Vamos ter de abrir mão de alguns conceitos arraigados para aprender a trabalhar com o precedente. Não é uma escolha filosófica, nem ideológica, é a única alternativa que existe para uma jurisdição de qualidade, entregue a tempo”, disse o presidente do STF.

A construção desse sistema de precedentes ainda é nascente no Brasil e alvo de críticas como as do colunista da revista eletrônica Consultor Jurídico Lenio Streck, no sentido de que eles não podem nascer para vincular, mas se tornar vinculantes a partir da interpretação.

Em sua fala, o ministro Barroso defendeu os precedentes pelas vantagens na busca por segurança jurídica, isonomia e eficiência. E ressaltou que seu uso exige que os juízes reavaliem a importância do livre convencimento motivado.

“A observância dos precedentes exige um pouco de renúncia das próprias convicções, o que é, talvez, o capítulo mais difícil na vivência brasileira, em que o princípio da livre convicção sempre foi potencializado. O juiz decide de acordo com a própria consciência e pronto”, disse o magistrado.

“Observar precedentes significa, muitas vezes, registrar que, ressalvada a opinião pessoal, é esse determinado entendimento o dominante. É assim que funciona a vida civilizada: é preciso abrir mão da individualidade e ceder ao coletivo, quando imposto por vontade majoritária.”

Juiz artesão

Barroso ainda defendeu o uso das ferramentas tecnológicas potencializadas pela inteligência artificial e repetiu previsões de que o próximo passo é permitir a automação para resumir ações e fazer minutas de decisões.

O presidente do STF disse que o tema exige um olhar sem preconceitos e com respeito à premissa de que o juiz pode até delegar a atribuição de minutar uma decisão, mas nunca a responsabilidade por tomá-la.

“O juiz continua responsável pelo julgamento adequado da causa. Mas vai simplificar imensamente a vida se pudermos ter uma forma de produção de minutas com uso da inteligência artificial”, opinou ele.

Outro ponto abordado em relação à agilidade que o uso de precedentes confere à prestação jurisdicional é relacionado à produção artesanal de votos, que Barroso considera incompatível com o momento atual do Judiciário.

“Temos uma tradição latina de enciclopedismo. Sempre que alguém vai decidir alguma coisa, é preciso mostrar que estudou muitas outras”, exemplificou ele. “É bonito, mas o mundo não comporta mais o investimento nesse tipo de enciclopedismo. Precisamos ser um pouco mais breves e pragmáticos.”

Atuação em cooperação

Na abertura do evento, o presidente do TST, ministro Lelio Bentes Corrêa, afirmou que o sistema de precedentes emerge como uma perspectiva de dar supremacia aos direitos que o legislador constituinte buscou garantir.

Assim, construir os pilares para que o Judiciário atue em um sistema de precedentes exige a cooperação das instâncias com ampla participação e visão central nos casos concretos em discussão.

“Na Justiça do Trabalho, constata-se que a atuação cooperativa do primeiro e segundo graus, considerando o grande volume de assuntos e os desdobramentos das ações trabalhistas, é imprescindível para a tutela dos direitos e garantias fundamentais.”

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