A previsão legal do pagamento do adicional de periculosidade aos empregados que se utilizam de motocicleta no decorrer de suas atividades laborais foi incluída na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) pela Lei nº 12.997/2014.
Assim, o parágrafo 4º do artigo 193 da CLT dispõe expressamente que “são consideradas perigosas as atividades de trabalhador em motocicleta”. Contudo, o enunciado do mesmo artigo condiciona o enquadramento das atividades laborais como perigosas à regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego.
Portaria do MTE e decisão do TRF-1
Diante da lacuna existente, no ano de 2014, foi editada a Portaria nº 1.565 do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), a qual aprovou a inclusão do anexo 5 na Norma Regulamentadora — NR 16, passando a prever quais as atividades laborais seriam consideradas como perigosas em razão do uso de motocicletas.
Portanto, até os dias atuais, entende-se que é direito do trabalhador dessa área o recebimento de um adicional de 30% sobre o salário percebido, o qual integra todas as verbas de natureza salarial.
Ocorre que o Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em decisão proferida na Ação de nº 0018311-63.2017.4.01.3400, entendeu que a edição da Portaria nº 1.565/2014 não obedeceu a todas as etapas de estudo e regulamentação de normas inerentes à saúde, segurança e condições gerais de trabalho.
Isso porque, segundo o fundamento da decisão exarada, a Portaria nº 1.127/2003, também do MTE, dispõe sobre os procedimentos de regulamentação de normas que versem sobre o referido tema, e que não foram observadas quando da previsão do adicional de periculosidade. Neste trilhar, a referida portaria determina que toda e qualquer norma editada pelo órgão deve observar os procedimentos ali estabelecidos, sob pena de nulidade.
Assim, a decisão do TRF da 1ª Região concluiu que a terceira etapa do procedimento de elaboração da Portaria nº 1.565/2014, a qual versa sobre o adicional de periculosidade em atividades com uso de motocicleta, não foi observada, qual seja, a deliberação ampla e participativa dos segmentos envolvidos, além de se constatar atropelo nos prazos constantes da referida norma.
Ações das empresas e insegurança jurídica
Em que pese o trânsito em julgado da decisão supracitada ter ocorrido desde o 24/9/2021, isto é, não é mais possível a modificação do julgado, até o momento o MTE não se manifestou acerca da decisão, nem reiniciou o procedimento de regulamentação do adicional de periculosidade seguindo as diretrizes constantes da Portaria nº 1.127/2003, ou seja, observando os procedimentos necessários para regulamentar a matéria.
Diante disso, diversas associações vêm ingressando com ações judiciais contra a portaria de nº 1.565/2014 e obtendo decisões favoráveis para a suspensão da eficácia da norma no âmbito de suas representações. Assim, até que sobrevenha nova norma regulamentando o adicional de periculosidade em atividades que possuam o uso de motocicletas, tais entidades estão desobrigadas ao pagamento de tal verba e seus funcionários seguem trabalhando sem o recebimento do adicional que lhe é de direito.
O cenário atual ainda gera bastante incerteza e insegurança jurídica, ao passo que, em que pese haver decisões transitadas em julgado quanto ao tema, que indicam a nulidade da portaria supracitada e a suspensão de seus efeitos, os Tribunais Regionais do Trabalho ainda possuem entendimento de que as decisões não impactam no pagamento do adicional, uma vez que a previsão na CLT é suficiente para concretizar o direito dos trabalhadores.
Neste ponto, o incidente de resolução de demandas repetitivas julgado pelo Pleno do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região, de nº 0000294-39.2022.5.08.0000, aprovou tese jurídica de que o pagamento do adicional de periculosidade em decorrência do exercício da atividade classificada como perigosa pelo artigo 193, parágrafo 4º, da CLT, independe de regulamentação.
Diante desse contexto, é essencial refletir sobre a morosidade e a falta de ação do Ministério do Trabalho e Emprego em promover a revisão da regulamentação do adicional de periculosidade, considerando que apenas em 5/3/2024 o órgão publicou aviso de tomada pública de subsídios para instruir a análise de impacto regulatório da revisão da portaria. Contudo, o que ainda se verifica é uma demora desarrazoada que gera incerteza tanto para os empregados quanto para os empregadores, principalmente considerando que há empregados que seguem exercendo atividades laborais com uso de motocicletas e sem o recebimento do adicional devido.
A insegurança jurídica resultante desta situação é evidente, sobretudo quando observamos a divergência de entendimentos dos tribunais pátrios, o que gera um ambiente de incertezas que prejudica a aplicação uniforme da lei, comprometendo os direitos fundamentais de milhares de trabalhadores.
Portanto, é fundamental que o MTE aja com celeridade para regulamentar, de maneira adequada, o adicional de periculosidade devido nas atividades laborais que demandem o uso de motocicleta, a fim de assegurar os direitos fundamentais dos trabalhadores brasileiros, bem como a fim de que os empregadores tenham clareza quanto às suas obrigações.