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Em recurso só da defesa, exclusão de vetor negativo reduz a pena-base proporcionalmente

4 de setembro de 2024, 18h52

Por Danilo Vital

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É obrigatória a redução da pena-base quando o tribunal de segunda instância, em recurso exclusivo da defesa, afasta a circunstância judicial negativa reconhecida na sentença.

Redução da pena deve ser proporcional de acordo com o peso dado ao vetor negativo pelo juiz que sentenciou

Essa redução deve ser proporcional, de acordo com o peso que foi dado ao vetor negativo pela sentença. Isso, no entanto, não impede que o juiz faça a reclassificação de fatos já valorados negativamente pela decisão, enquadrando-os como outra circunstância judicial, nem que ele reforce a argumentação para acrescentar a valorização negativa feita pelo juiz.

A conclusão é da 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, que fixou tese sob o rito dos recursos repetitivos. O tema foi resolvido por maioria de votos.

A controvérsia se insere nos casos em que o réu é condenado em primeiro grau, com o aumento da pena-base por causa do reconhecimento de alguma circunstância judicial negativa.

Essas circunstâncias estão previstas no artigo 59 do Código Penal: culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos, circunstâncias, consequências e comportamento da vítima.

O juiz as analisa e estabelece a pena-base conforme seja suficiente para reprovação e prevenção do crime. Ou seja, não há um critério matemático de majoração.

A dúvida é o que acontece quando, no recurso exclusivo da defesa, o tribunal afastar uma ou mais circunstâncias negativas: deve-se reduzir a pena-base ou seria possível mantê-la?

O tema já foi decidido pela 3ª Seção do STJ em 2021. A conclusão foi de que a pena-base base deve obrigatoriamente ser reduzida de maneira proporcional. Essa foi a posição foi mantida, com alguns esclarecimentos.

A seguinte tese foi aprovada pelo colegiado:

É obrigatória a redução proporcional da pena-base quando o tribunal de segunda instância, em recurso exclusivo da defesa, afastar a circunstância judicial negativa reconhecida na sentença. Todavia, não implica reformatio in pejus a mera correção da classificação de fato já valorado negativamente pela sentença para enquadrá-lo como outra circunstância judicial, nem o simples reforço de fundamentação para manter a valoração negativa de circunstância já reputada desfavorável na sentença.

Limites do recurso

A redação final da tese foi sugerida pelo ministro Rogerio Schietti e encampada pelo relator, Sebastião Reis Júnior. Votaram com eles os ministros Reynaldo Soares da Fonseca e Daniela Teixeira, além do desembargador convocado Otávio de Almeida Toledo.

A manifestação do ministro Schietti esclareceu que a tese não engessa a análise do tribunal de apelação, quando o recurso é apenas da defesa. Os desembargadores podem identificar que um vetor negativo valorado na sentença, por exemplo, como conduta social negativa seja corrigido no acórdão para constar como mau antecedente.

Na apelação, o tribunal também pode qualificar a motivação dada para a valoração negativa — ou seja, pode acrescentar argumentos novos.

O voto trouxe um exemplo: se a defesa recorre contra o aumento da pena pela culpabilidade do réu, o tribunal só pode analisar tudo que diga a respeito a essa vetorial da dosimetria da pena.

Isso significa que ele pode manter a culpabilidade ou alterar seu enquadramento. Porém, se decidir excluir esse vetor negativo, não pode aumentar o peso dado a outros vetores para compensar a dosimetria e manter a pena inalterada.

Redução proporcional

Da mesma forma, explicou o ministro Rogerio Schietti, não se busca evitar que o juiz dê peso maior a determinadas circunstâncias negativas em relação a outras.

Nesse cenário, a redução proporcional da pena no caso de exclusão de um desses vetores negativos significa que ela deve ser feita na mesma medida em que foi aumentada pelo juiz na sentença.

Como exemplo, o ministro citou a situação hipotética de uma pessoa condenada por roubo à pena mínima de 4 anos de reclusão, aumentada em 1 ano pela culpabilidade e 6 meses pelas consequências do crime.

Se o tribunal, ao analisar o recurso exclusivo da defesa, afastar a circunstância negativa da culpabilidade, a pena deve ser reduzida em 1 ano, pois foi esse o peso dado pelo juiz na sentença.

“Trata-se de decorrência do efeito devolutivo da apelação, em suas dimensões vertical — de profundidade — e horizontal — de extensão”, explicou o ministro Schietti.

“A profundidade do efeito devolutivo do recurso está dentro dos limites da matéria impugnada. O tribunal de apelação pode analisar tudo que for pertinente à solução da questão, mas apenas dentro dos limites horizontais do que foi impugnado no pedido recursal.”

Dificuldades práticas

Ficaram vencidos os ministros Messod Azulay e Joel Ilan Paciornik. Para eles, não caberia a fixação de tese sobre o tema, para resumir uma regra matemática de proporcionalidade para cada vetor negativo, pois é viável e comum que exista a preponderância de vetores.

“A tese, caso mal interpretada, pode levar tribunais ao equivoco de afastar possibilidade de reclassificação de circunstância judicial em vetor diverso do que apontado pelo juiz de primeiro grau”, destacou o ministro Messod.

Em voto-vista, o ministro Joel destacou que há situações em que o juiz, ao prolatar a sentença, não esclarece o valor dado a cada circunstância judicial negativa considerada, o que dificultaria a análise na apelação.

“Identifico que tribunais podem encontrar dificuldades práticas na aplicação da tese proposta”, alertou, ao aderir à divergência.

REsp 2.058.970
REsp 2.058.971
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