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Supremo valida prova obtida em busca domiciliar feita por guarda municipal

1 de outubro de 2024, 17h53

Por Tiago Angelo

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Buscas feitas por guardas municipais não são ilegais se devidamente justificadas, de acordo com o entendimento da 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal, que considerou válidas as provas obtidas por guardas municipais em uma busca domiciliar.

Fachada do Supremo Tribunal Federal, sede do STF

Alexandre considerou provas válidas; Zanin divergiu, mas ficou vencido

Prevaleceu o voto do ministro Alexandre de Moraes, relator do caso. Ele foi acompanhado pelos ministros Flávio Dino, Cármen Lúcia e Luiz Fux, enquanto o ministro Cristiano Zanin ficou vencido. Para ele, a Guarda Municipal não tem a atribuição de fazer busca pessoal e domiciliar.

No caso concreto, o acusado teria dispensado entorpecentes embalados ao avistar os agentes municipais. Posteriormente, os guardas foram até a residência do suspeito e ingressaram no domicílio. Lá, foram encontradas drogas diversas e em grande quantidade.

A 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça havia entendido que a dispensa das drogas não justificava a busca subsequente e que a Guarda Municipal não tem a atribuição de atuar ostensivamente. Dessa maneira, o colegiado do STJ anulou as provas.

Flagrante permanente

Alexandre votou para cassar o acórdão do STJ. De acordo com ele, o tráfico de entorpecentes é classificado como crime permanente, de forma que aquele que o comete continua em estado de flagrância.

O magistrado sustentou seu argumento dizendo que traficantes com frequência levam pequena quantidade de droga, e depois voltam para pegar mais no local em que elas estão armazenadas. A posição do ministro é a de que o acusado continuou em situação de flagrância ao buscar mais drogas na residência, o que justificou a busca.

“Encontrado o entorpecente na sacola, nós estamos em flagrante permanente. Eles vão até a casa, pegam um pouco e vendem. O combate a esse tráfico se dá no flagrante permanente”, disse ele ao justificar a validade das provas.

O ministro também criticou o STJ. Para ele, a corte superior está descumprindo decisões do Supremo ao anular provas obtidas em buscas feitas por guardas municipais.

“Mesmo com reiteradas decisões nossas, o Superior Tribunal de Justiça continua, em alguns casos idênticos, desrespeitando o posicionamento majoritário do Supremo Tribunal Federal.”

Divergência

Zanin foi o único a divergir dos colegas. Para ele, guardas municipais não têm o “poder irrestrito” de policiamento ostensivo e investigativo, mas o de salvaguardar o patrimônio público.

“As Guardas não têm atribuição para realizar buscas pessoais ou domiciliares. Na minha visão, a possibilidade de flagrante delito por guardas municipais em delitos previstos na Lei de Drogas pressupõe que a identificação da prática do crime não envolva qualquer diligência investigativa.”

No caso concreto, segundo o ministro, a Guarda Municipal atuou com fins investigativos, fora de seu escopo de atuação, e deveria ter informado à Polícia Militar, em vez de ela mesma fazer as buscas.

“Para chegar nessa situação, foi necessário que a Guarda Municipal realizasse diligência que, ao meu ver, não poderia ter sido realizada. Se havia uma situação envolvendo drogas, a Guarda Municipal deveria ter chamado a PM, e não ela própria ter ido na casa da pessoa.”

Tema controverso

O tema é controverso dentro do próprio Supremo. Em agosto de 2023, o Plenário da corte decidiu que as Guardas Municipais integram o Sistema de Segurança Pública (Susp).

Há ministros, no entanto, que entendem que, apesar do reconhecimento, as Guardas Municipais têm um escopo de atuação bem definido, que não inclui abordagens e buscas pessoais.

Em outubro do ano passado, por exemplo, o ministro Edson Fachin, que integra a 2ª Turma, entendeu que reconhecer que as Guardas integram o Susp não autoriza que elas extrapolem sua competência, que é a de proteger bens, serviços e instalações do município.

Na ocasião, o ministro manteve a absolvição de uma pessoa que foi abordada e revistada por guardas municipais e processada por tráfico de drogas.

Especialistas consultados pela revista eletrônica Consultor Jurídico em 2023 também entenderam que considerar a Guarda Municipal como integrante do Susp não autoriza a abordagem e revista.

Já no STJ, há consenso entre as turmas criminais sobre a nulidade de provas obtidas em busca pessoal e domiciliar feita por guardas municipais. Em setembro do ano passado, a 3ª Seção da corte, que reúne os ministros dos colegiados criminais, reafirmou que a atuação da Guarda Municipal se restringe à proteção de bens, instalações e patrimônios do município.

RE 1.468.558