Propostas de alteração na Lei da Propriedade Industrial pelo PL 2.210/2022
15 de maio de 2024, 7h02
A redução do tempo de exame tem sido a tônica das demandas da sociedade e, como consequência, das medidas administrativas protagonizadas pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) nos últimos anos, especialmente no que tange ao combate ao backlog de patentes.

Desde 2019, com a publicação das Resoluções 240/2019 e 241/2019 e inauguração do “Plano de Combate ao Backlog de Patentes”, o tempo médio de análise de patentes de invenção foi notavelmente reduzido. Estatísticas do projeto apontam que o contingente inicial de 147.217 patentes à espera de exame técnico, em meados de 2019, foi reduzido para 2.459, de acordo com dados publicados em maio de 2024.
Não obstante a efetividade do projeto, é consenso que o tempo médio de exame de patentes, que hoje gira em torno de seis anos, deve ser reduzido para que o INPI se equipare a outros escritórios internacionais de propriedade industrial considerados eficientes. Esse esforço depende necessariamente do aumento do orçamento destinado ao Instituto, que seria plenamente alcançado se aprovada sua autonomia administrativo-financeira, ensejando a ampliação de sua estrutura, do número de examinadores e das políticas públicas de fomento à inovação.
A nova política de fomento à indústria brasileira, anunciada pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) no início deste ano, prevê investimentos no INPI para a melhoria de processos internos e a contratação de servidores com a finalidade de reduzir o tempo médio de exame de patentes para dois anos, até o final de 2026.
No âmbito legislativo, a diretoria do INPI teve participação significativa na nova versão, inicialmente de relatoria do senador Jacques Wagner, do Projeto de Lei 2.210/2022 (PL 2210), que recentemente ganhou um substitutivo e passou à relatoria do senador Hiran Manuel Gonçalves.
O PL 2.210 original tinha como principal objetivo instituir o “pedido provisório de patente”, que permitiria ao titular ou interessado iniciar o processo de depósito de patente, sem obrigatoriamente dispor de todos os documentos necessários ao exame definitivo. Feito o depósito da patente provisória, o depositante teria um prazo de 12 meses para apresentar eventuais documentos remanescentes e complementar o escopo da patente conforme necessário, antes que o pedido preliminar fosse convertido em patente definitiva e destinado a exame.

A finalidade do pedido de patente provisória era facilitar que inventores e titulares de patentes que ainda dependessem de testes e ajustes finais pudessem utilizar o pedido provisório para garantir a prioridade sobre os elementos fundamentais da invenção, enquanto finalizavam o desenvolvimento do invento.
Entretanto, a proposta do “pedido provisório de patente” foi abandonada no texto do substitutivo do PL 2.210, apresentado no dia 18 de abril de 2024 à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE).
A nova proposta de alteração dos artigos 32 e 33 da Lei nº 9.279/1996 (Lei da Propriedade Industrial — LPI) muda a estratégia anterior e, ao invés de criar um instituto, procura abreviar o processo de concessão de patentes já existente.
Prazo para análise
O artigo 33 da LPI atualmente em vigor prevê que o pedido de patente será analisado somente após requerimento do depositante, que deve ocorrer em até 36 meses do depósito, sob pena de abandono do pedido. Nesse interregno, é permitido ao titular realizar alterações para melhor esclarecer ou definir o escopo do pedido de patente, desde que as alterações propostas estejam contidas na matéria inicialmente revelada no pedido.
Ao contrário da proposta de “pedido provisório de patente”, que permitiria ao depositante aditar o escopo da patente no período de um ano, o modelo atual possibilita ao depositante realizar alterações apenas no escopo de proteção já requerido inicialmente até o requerimento de exame.
A principal alteração proposta pelo substitutivo do PL 2.210 é o ingresso do pedido de patente na fila de exame no momento do depósito. Ou seja, não é mais necessário ao depositante requerer o início do exame no prazo de 36 meses.
Embora a alteração simplifique o procedimento, a proposta tem sido alvo de críticas de alguns setores da indústria, principalmente em razão da provável redução de prazo para que o depositante altere o escopo da patente e da falta de previsibilidade quanto à data de início de exame, visto que ainda não há um posicionamento do INPI quanto à forma como o depositante será cientificado do início do exame.
A possibilidade de promover alterações ao escopo de patentes depositadas é de suma importância a alguns setores da indústria, como é o exemplo da indústria farmacêutica, que comumente deposita pedidos de patente junto ao INPI e requer o registro sanitário à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de forma concomitante e utiliza do prazo de 36 meses para realizar melhorias no escopo da patente, muitas vezes com base na análise realizada pela Anvisa.
Com as alterações propostas pelo substitutivo ao PL 2.210, o prazo de que dispõe o depositante para realizar emendas ao escopo da patente será provavelmente abreviado, criando empecilhos a essa dinâmica. Por outro lado, as alterações beneficiam o registro de inventos já concluídos ou em estágio final de desenvolvimento, com a redução do tempo médio de exame.
Embora o INPI ainda não tenha se manifestado quanto à forma como o depositante será cientificado do início do exame de sua patente, é imprescindível que a notificação seja realizada de maneira confiável, como, por exemplo, mediante a publicação da Revista da Propriedade Industrial (RPI), facultando ao depositante que realize eventuais ajustes ao escopo da patente em um prazo razoável, antes do início do exame.
Em discussões sobre as alterações pretendidas, o INPI também já se pronunciou sobre alterações no modelo de cobrança das retribuições administrativas para exame de patentes. A proposta é para eliminar a taxa referente ao pedido de exame e emissão da carta patente, contemplando a integralidade dos valores na taxa inicial de depósito.
A proposta de alteração onera os depositantes, pois gera um aumento dos valores iniciais a serem despendidos, o que pode vir a prejudicar pequenas empresas ou pessoas físicas que não disponham dos valores iniciais. Além disso, na hipótese de indeferimento do pedido, parte do valor relativo à taxa para concessão da carta patente será perdida.
O substitutivo do PL 2.210 também propõe alterações que invertem a atual lógica de exame de pedidos de registro de marcas pelo INPI, de forma a introduzir um exame de mérito preliminar ao processo de oposição.
O novo modelo parte da premissa de que a maioria dos pedidos de registro de marca depositados não recebem oposição de terceiros e poderiam ter seu exame abreviado por uma análise preliminar de registrabilidade.
Assim que depositado o pedido de registro e preenchidos os requisitos formais para exame, o INPI passará a uma análise de mérito, em estágio preliminar, nos mesmos moldes em que atualmente é realizada. Concluído o exame, o INPI publicará uma decisão de deferimento preliminar ou indeferimento do pedido de registro.
No caso de indeferimento, o titular do depósito poderá recorrer da decisão em até 60 dias, da mesma forma como ocorre no modelo atual. Caso o pedido de registro seja deferido de forma preliminar, inicia-se o prazo de 60 dias para que terceiros apresentem oposição, podendo o depositante se manifestar às razões de oposição no mesmo prazo.
Na ausência de oposição, o titular poderá proceder ao pagamento das taxas de expedição do certificado de registro e primeiro decênio de vigência da marca. Caso haja oposição ao pedido de registro, o INPI realizará nova análise de mérito, limitada às razões de oposição, e proferirá decisão definitiva, mantendo o deferimento preliminar ou indeferindo o pedido de registro.
É importante frisar que a decisão de deferimento preliminar, anterior ao processo de oposição, não confere direito de exclusividade ao titular, pois não equivale à concessão do registro.
Redução do tempo de exame
As alterações na dinâmica de registro parecem ser positivas para reduzir o tempo médio de exame, pois várias marcas não registráveis serão indeferidas de forma sumária pelo INPI, sem que o processo seja estendido para oposição de terceiros. Em uma projeção arrojada, o INPI pretende reduzir o tempo de exame médio de marcas que não recebam oposição ao patamar de dois meses, ao passo que, atualmente, o prazo médio extrapola um ano.
Remanesce dúvida se o INPI conseguirá atingir a meta, haja vista que o ganho de eficiência da autarquia com a mudança proposta se limita aos casos em que o INPI indefere em exame preliminar marca que, caso contrário, seria objeto de oposição e manifestação da depositante até que fosse proferida a decisão administrativa. Nos demais casos, o ganho é marginal.
Por fim, o substitutivo do PL 2.210 também inclui uma previsão ao artigo 217 da LPI, visando a solucionar uma divergência entre o caput do referido artigo e as previsões do Acordo de Madri, que permite ao depositante estrangeiro não constituir procurador local.
Conforme a alteração proposta, quando acordos internacionais afastarem a necessidade de depositantes estrangeiros constituírem procurador local para o depósito de registros no Brasil, o INPI será cientificado da existência de uma ação judicial contra o referido registro e deverá notificar a Organização Mundial da Propriedade Intelectual (Ompi) para que intime o titular a constituir procurador local no prazo de 60 dias. A prima facie, a via sugerida, para que o titular do registro impugnado seja citado, seria provavelmente mais célere do que o envio de uma carta rogatória.
Se bem operacionalizadas pelo INPI, as propostas de alteração do substitutivo do PL 2.210 têm o potencial de conferir algum ganho de celeridade ao exame de patentes e marcas, melhorando a eficiência do sistema de proteção à propriedade industrial no Brasil.
Contudo, ajustes parecem ser necessários de maneira a conferir segurança quanto ao início do exame de mérito, com relação aos pedidos de patentes, preservando o legítimo interesse de usuários que queiram emendar pedidos de patentes para melhor delimitar o invento.
Vale ressaltar, quanto a esse aspecto, que o INPI já vem sendo objeto de críticas por limitar a possibilidade de alterações na patente em grau recursal, nos termos do Parecer PFE/INPI nº 19/2023, sendo importante que a autarquia evite tornar o procedimento administrativo tão engessado e limitado a ponto de desestimular que as empresas adotem o Brasil como primeira jurisdição de depósito para novos pedidos de patente.
Por outro lado, é imprescindível que o INPI tenha o suporte orçamentário para que não reste prejudicada a qualidade do exame mais célere, com um consequente aumento da judicialização das decisões administrativas.
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