Mesmo sem fixar políticas, Poder Judiciário deve atuar em tragédias climáticas, diz Barroso
13 de maio de 2024, 20h40
Embora não caiba ao Poder Judiciário elaborar políticas públicas de enfrentamento às mudanças climáticas, magistrados podem atuar na proteção de direitos, na destinação de recursos e na determinação para que o Executivo e o Legislativo não sejam omissos quanto à proteção do meio ambiente.

O ministro Luís Roberto Barroso participa da cerimônia de abertura d0 J20
Foi o que afirmou nesta segunda-feira (13/5) o presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça, ministro Luís Roberto Barroso. Ele participou do J20, encontro de representantes das Supremas Cortes dos países do G20, que ocorre até esta terça (14/5) no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Após a reunião, fechada ao público, Barroso lembrou a jornalistas que o CNJ assinou recomendação para que tribunais repassem à Defesa Civil do Rio Grande do Sul e outras entidades assistenciais valores depositados como pagamento de prestações pecuniárias — tipo de pena que estipula que o condenado pague valores em dinheiro, que podem ser direcionados a vítima, familiares ou entidades. Em uma semana, R$ 106 milhões foram transferidos para o estado, segundo o ministro. O Rio Grande do Sul vive estado de calamidade devido a enchentes.
Outras atuações importantes do Judiciário quanto à proteção do meio ambiente, segundo Barroso, foram as decisões do STF de proibir a União de contingenciar valores do Fundo Clima e de garantir dotação orçamentária e liberação de recursos do Fundo Amazônia.
“O Judiciário pôde ajudar com essas contribuições. Mas não se salva o mundo da mudança climática com decisões judiciais. O Judiciário não é o protagonista dessa história, embora possa proferir decisões pontuais e importantes”, afirmou o presidente do STF.
Histórico de atuação
Luís Roberto Barroso ressaltou que não cabe ao Judiciário traçar as grandes políticas públicas de enfrentamento da mudança climática, mas ao Executivo e ao Legislativo. Porém, as cortes constitucionais do mundo vêm mudando um pouco o seu papel e intervindo mais nessa matéria.
Há três razões para isso, apontou o ministro. A primeira é a percepção de que a proteção do meio ambiente é uma questão de direito fundamental. “Quem olha o que está acontecendo no Rio Grande do Sul vê que um dos principais direitos fundamentais está em risco, que é o direito à vida. As pessoas estão morrendo por conta da mudança climática.”
O segundo motivo é a política, que muitas vezes se move por objetivos de curto prazo. Por outro lado, os danos ambientais demoram um tempo para serem produzidos. Assim, faltam incentivos para políticos tomarem medidas que podem ser impopulares porque envolvem mudanças de estilo de vida e de fontes de energia, citou Barroso.
Já a terceira razão é que a mudança climática vai afetar mais dramaticamente as futuras gerações, que não estão representadas pelos atuais políticos. Dessa maneira, um dos papeis do Judiciário é “zelar pelos direitos de quem não tem voz nem voto atualmente”, declarou o magistrado.
Fake news
A proliferação de notícias falsas relacionadas à tragédia do Rio Grande do Sul “é uma derrota do espírito”, de acordo com Barroso. “É uma perversão da alma alguém fazer maldades com uma situação que já é, em si, tão gravosa para as pessoas.”
Ele afirmou ser preciso combater a desinformação com legislação e educação midiática. E disse que as plataformas digitais têm a obrigação de limitar a propagação desse conteúdo.
“É claro que ninguém deseja censura privada, mas ninguém pode viver do incentivo do mal. E a verdade é que, muitas vezes, a desinformação, o sensacionalismo, a teoria conspiratória trazem mais engajamento do que a fala racional e moderada. Portanto, por vezes, as plataformas têm um incentivo na difusão do ódio, em lugar de tentar difundir um pouco de racionalidade. Em um momento sensível, como esse que o Rio Grande do Sul está vivendo, nós precisamos de uma solidariedade geral, inclusive das plataformas digitais”, avaliou o presidente do Supremo.
Evento do G20
O encontro de representantes das Supremas Cortes dos países do G20, fórum de cooperação econômica internacional que reúne as 19 maiores economias do mundo, a União Europeia e a União Africana, teve início na manhã desta segunda, no TJ-RJ.
Barroso abriu a reunião com agradecimentos aos presentes e apresentou o tema da primeira sessão do encontro, “Promoção da cidadania e da inclusão social pelo Poder Judiciário”, fechada ao público externo. O encontro desta segunda-feira foi restrito às delegações e aos representantes do Judiciário brasileiro.
O ministro fez um relato de iniciativas do STF e do CNJ para promover a diversidade de gênero no Judiciário. Ele falou também do Pacto Nacional do Judiciário pela Linguagem Simples, com o objetivo de tornar as decisões judiciais mais acessíveis à sociedade, e sobre a promoção de direitos sociais. “Assim, convido os representantes das cortes de diferentes partes do mundo a enriquecerem o debate, trazendo exemplos de iniciativas sobre esses aspectos.”
O papel da comunicação clara com a sociedade para garantir direitos e promover confiança no Judiciário pautou a fala da maioria dos participantes. Representantes de nações como França, África do Sul, México e Itália, entre outros, compartilharam as experiências lideradas pelas Supremas Cortes de seus países nesse sentido. Informativos, podcasts, programas de televisão e diálogos com estudantes foram alguns dos exemplos citados como iniciativas para explicar as principais decisões das cortes e aproximá-las dos cidadãos.
A maioria dos representantes compartilhou exemplos dos esforços feitos em seus países para ampliar a participação feminina no Judiciário e falou da preocupação com a inclusão social de grupos vulneráveis, como indígenas e a população LGBTQIA+. Foi demonstrada a visão comum de que as Supremas Cortes precisam ser representativas e refletir o que se expressa na sociedade, sem perder de vista que as decisões não devem ser populares, mas respeitar as leis e tradições jurídicas de cada nação. Com informações da assessoria de imprensa do STF.
Encontrou um erro? Avise nossa equipe!