Inteligência artificial e privacidade: atuação da autoridade francesa de proteção de dados
16 de junho de 2024, 6h38
No último dia 10 de junho, a Commission Nationale de l’Informatique et des Libertés (CNIL), autoridade francesa de proteção de dados pessoais, publicou considerações sobre como o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD) viabiliza o uso da inteligência artificial (IA) de forma inovadora e responsável [1].

Este artigo busca apresentar o andamento recente do tema na França, com o caráter informativo para situações semelhantes enfrentadas no Brasil. Não há o intuito de importar posicionamentos ou decisões estrangeiras, considerando as realidades jurídicas distintas.
A informação sobre a CNIL demonstra que a IA é objeto de estudo e regulamentações em outras jurisdições, como também ocorre no Brasil, tendo em vista que a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) recentemente apresentou propostas de alteração do substitutivo ao Projeto de Lei nº 2338/2023 sobre IA no Brasil [2].
As manifestações da CNIL buscam garantir segurança jurídica no contexto europeu, considerando o Regulamento Inteligência Artificial (EU AI Act), aprovado em março pelo Parlamento Europeu [3]. Como as disposições serão adotadas de forma escalonada nos próximos meses, a CNIL busca antecipar a articulação entre a IA e o RGPD, independentemente do EU AI Act. Para isso, a CNIL realizou consulta pública e listou recomendações práticas sobre a IA [4].
A consulta pública versou, dentre outros pontos, sobre o legítimo interesse como base legal. A CNIL pontuou que se trata da base legal frequentemente utilizada para o desenvolvimento da IA. Por isso, avaliações de riscos devem ser realizadas.
Por meio de condições específicas, os direitos relacionados aos dados pessoais podem ser protegidos, e o tratamento de dados pessoais deve ocorrer de forma responsável. A consulta é voltada especialmente para as técnicas de web scrapping, que se se relaciona ao acesso e à coleta de bases de dados significativas e difusão da IA em open source [5], que se refere ao compartilhamento e a colaboração comunitária, em linhas gerais.
No caso das recomendações práticas, a CNIL criou uma página específica, com informações e diretrizes sobre os seguintes pontos:
- o regime jurídico aplicável;
- a definição de finalidade;
- a determinação da qualificação jurídica dos atores;
- a licitude do tratamento na definição da base legal e na reutilização dos dados pessoais;
- a realização de análise de impacto quando necessária;
- a proteção de dados no design do sistema;
- a proteção de dados com a coleta e gestão dos dados pessoais;
- a base legal do legítimo interesse para desenvolver um sistema de IA, relacionado ao open source e ao web scrapping; (ponto em consulta publica);
- as informações sobre os dados pessoais;
- o respeito e a facilitação do exercício dos direitos relacionados;
- o registro dos dados pessoais;
- a garantia da segurança do desenvolvimento de um sistema de IA [6]

Intersecção prática
A coexistência harmônica entre regulamentos e/ou leis de IA e de dados pessoais é esperada pela intersecção prática. Como dados pessoais são necessários para o desenvolvimento e aprimoramento da IA, as diretrizes complementares fortalecem a proteção de indivíduos, da coletividade e, nos casos de relações de consumo, de consumidores.
Desse modo, a atuação da CNIL para esclarecer a articulação entre os dados pessoais, protegidos pelo RGDP, e a IA, que passa a ter nova regulamentação pelo EU AI Act, é essencial para a garantia da segurança jurídica. Em momentos de transições, como no caso de novas leis e/ou de regulamentos, a atuação dos órgãos reguladores é enriquecida pela contribuição viabilizada por meio de consultas públicas, como a CNIL e a ANPD realizam em diferentes contextos jurídicos.
[1] CNIL. Intelligence artificielle : la CNIL poursuit ses travaux pour une IA innovante et respectueuse de la vie privée. Disponível em: < https://www.cnil.fr/fr/intelligence-artificielle-la-cnil-poursuit-ses-travaux>. Acesso em 10 jun 2024.
[2] GOV.BR. ANPD apresenta propostas de alteração do substitutivo ao PL 2338, sobre inteligência artificial. Disponível em: <https://www.gov.br/anpd/pt-br/assuntos/noticias/anpd-apresenta-propostas-de-alteracao-do-substitutivo-ao-pl-2338-sobre-inteligencia-artificial >. Acesso em 11 jun 2024.
[3] PARLAMENTO EUROPEU. Regulamento Inteligência Artificial: Parlamento aprova legislação histórica. Disponível em: < https://www.europarl.europa.eu/news/pt/press-room/20240308IPR19015/regulamento-inteligencia-artificial-parlamento-aprova-legislacao-historica>. Acesso em 11 jun 2024.
[4] CNIL. Intelligence artificielle : la CNIL poursuit ses travaux pour une IA innovante et respectueuse de la vie privée. Disponível em: < https://www.cnil.fr/fr/intelligence-artificielle-la-cnil-poursuit-ses-travaux>. Acesso em 10 jun 2024.
[5] CNIL. Intelligence artificielle : la CNIL poursuit ses travaux pour une IA innovante et respectueuse de la vie privée. Disponível em: < https://www.cnil.fr/fr/intelligence-artificielle-la-cnil-poursuit-ses-travaux>. Acesso em 10 jun 2024.
[6] CNIL. Le fiches pratiques IA. Disponível em: < https://www.cnil.fr/fr/les-fiches-pratiques-ia>. Acesso em 11 jun 2024.
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