Opinião

O artigo da Constituição que os oligopólios não querem que você conheça

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  • é empresário advogado e filantropo brasileiro reconhecido por sua expertise em tributação e sua atuação no mercado de petróleo e combustíveis.

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31 de julho de 2024, 7h16

Em um mercado equilibrado, a concorrência é chave para o sucesso não só das empresas, mas de todo o sistema econômico. Agora, imagine um país no qual grandes empresas são incentivadas a consolidarem seus oligopólios e usar todo seu poderio econômico para combater justamente os pequenos concorrentes. Claramente este não é um caminho para o sucesso econômico e social de qualquer nação.

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A defesa intransigente da concorrência é um pilar fundamental para o desenvolvimento econômico e social de qualquer nação. Não à toa, os formuladores de nossa Carta Magna inseriram em seu texto dispositivos para que monopólios e oligopólios pudessem ser combatidos pelo Estado. No entanto, grupos organizados vêm buscando empurrar matérias legislativas que distorcem o verdadeiro propósito do artigo 146-A da Constituição.

Conforme disposto no artigo 146-A: “Lei complementar poderá estabelecer critérios especiais de tributação, com o objetivo de prevenir desequilíbrios da concorrência, sem prejuízo da competência de a União, por lei, estabelecer normas de igual objetivo”. Ou seja, a Carta Magna indica que o nosso sistema tributário deve ser usado para combater uma variedade de desequilíbrios concorrenciais. Hoje, alguns grupos buscam convencer nossos parlamentares de que empresas que possuem pendências, ainda que discutíveis, com o Fisco são o único desequilíbrio a ser combativo, mas está longe de ser verdadeiro.

A doutrina brasileira reconhece diversos modelos de desequilíbrios, tais como monopólio, oligopólio, concorrência predatória, concorrência desleal e concorrência desleal por prática abusiva de poder econômico. Cada um desses modelos representa um desafio único para a competitividade do mercado, exigindo soluções tributárias específicas e bem delineadas.

Os critérios especiais de tributação são ferramentas poderosas para prevenir ou corrigir essas distorções. A tributação diferenciada deve desestimular a concentração de mercado, coibir práticas abusivas de poder econômico como a prática de preços predatórios, e estimular a inovação de produtos e serviços.

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A construção dessa tributação deve ser feita de forma ponderada, levando em consideração os efeitos econômicos e sociais esperados, além de garantir que não violem os princípios constitucionais tributários, como a igualdade e a capacidade contributiva.

Identificação

O primeiro passo essencial é identificar a existência de concorrência desleal, pois o devedor contumaz pode não necessariamente configurar tal prática. É imperativo que a definição de desequilíbrio concorrencial seja feita pela autoridade competente, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que deve analisar cada caso concreto para determinar a existência de desequilíbrios.

Uma vez identificado um desequilíbrio pelo Cade, medidas tributárias podem ser implementadas, como o aumento de alíquotas de impostos para empresas com participação excessiva de mercado, sanções por abuso de poder econômico ou formas diferenciadas de tributação para outros abusos. O objetivo do artigo 146-A não é definir o que constitui um devedor contumaz ou outras práticas de desequilíbrios concorrenciais. Essas definições dependem de decisões concretas e bem fundamentadas pelo Cade, baseadas na doutrina e jurisprudência existentes.

Por consequência, a lei complementar deve focar no combate aos desequilíbrios concorrenciais previamente identificados pelo Cade. Desviar-se desse foco para atacar empresas, que por diversos fatos históricos possuem discussões complexas e de difícil solução, é não só uma interpretação errônea da Constituição, mas também um desvio das reais necessidades do mercado competitivo brasileiro. A verdadeira defesa da concorrência passa pela aplicação precisa e criteriosa das normas tributárias para garantir um ambiente justo e equilibrado para todos os agentes do mercado.

 

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