Incidência de PIS e Cofins sobre taxa Selic: análise do Tema 1.237/STJ
6 de julho de 2024, 13h22
O Tema 1.237, julgado pela 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sob o rito dos recursos repetitivos, trouxe uma decisão significativa quanto à incidência de PIS e Cofins sobre a taxa Selic aplicada na restituição ou compensação de créditos tributários.

A questão central era determinar se os valores oriundos da aplicação da taxa Selic, quando recebidos em face de repetição de indébito tributário, na devolução de depósitos judiciais ou nos pagamentos efetuados decorrentes de obrigações contratuais em atraso, deveriam ser considerados como receita bruta e, portanto, tributáveis.
Os ministros do STJ foram unânimes em decidir pela manutenção da incidência de PIS e Cofins sobre esses valores, entendendo que eles se caracterizam como receita bruta operacional. Esse entendimento foi consolidado na tese firmada ao Tema 1.237, favorecendo a Fazenda Nacional ao assegurar a tributação dos valores restituídos ou compensados.
Contudo, essa decisão diverge do entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema 962, que, em setembro de 2021, decidiu, em repercussão geral, excluir a incidência de IRPJ e CSLL sobre a Selic. O STF argumentou que esses valores não se inserem no conceito de lucro, mas são apenas uma recomposição do patrimônio.
No entanto, o STJ, através do voto do ministro Mauro Campbell Marques, sustentou que, para pessoas jurídicas, os juros remuneratórios, incluindo os juros Selic, devem ser considerados como receita financeira e, consequentemente, parte do conceito mais amplo de receita bruta que integra a base de cálculo do PIS e da Cofins, mesmo que não sejam considerados lucro operacional.
Essa interpretação do STJ, contudo, contraria os entendimentos doutrinários e as decisões anteriores dos tribunais superiores. A verdadeira natureza dos juros remuneratórios não se encaixa no conceito de receita para fins de incidência do PIS e da Cofins, visto que eles têm caráter indenizatório e visam apenas recompor uma perda patrimonial, não representando um acréscimo patrimonial.
O entendimento do STJ no Tema 1.237 baseou-se em diferentes classificações dos juros moratórios, destacando-se aqueles recebidos em face de repetição de indébito tributário e entendendo que eles são considerados como recuperações ou devoluções de custos (indenizações a título de danos emergentes) e, assim, incluídos no conceito mais amplo de receita bruta operacional.
Isto porque o julgado entendeu que todas as receitas financeiras integram o conceito de receita bruta operacional, pois este abrange o conjunto de receitas atreladas às atividades operacionais de uma pessoa jurídica, onde se encontra o lucro operacional.

Apesar do reconhecimento pela relatoria do entendimento firmado pelo STF no RE 585.235/MG, de que a noção constitucional de faturamento (artigo 195, I, ‘b’, da Constituição) deve ser compreendida como receita bruta das vendas de mercadorias e da prestação de serviços de qualquer natureza, excluindo aportes financeiros estranhos à atividade da empresa, o STJ manteve seu entendimento de que os juros de mora ou remuneratórios possuem natureza jurídico-tributária de receita bruta operacional, na medida em que esses rendimentos são receitas financeiras atreladas à atividade empresarial.
Assim, foi consolidado o entendimento de que os juros e a correção monetária auferidos no interesse da atividade principal das empresas devem integrar a base de cálculo das contribuições ao PIS/Pasep e Cofins como receita bruta operacional por serem resultado das atividades empresariais.
Interpretação dos juros moratórios
A análise aprofundada das decisões do STJ e do STF em relação ao Tema 1.237 destaca divergências significativas na interpretação da natureza dos juros moratórios e sua incidência no PIS e na Cofins. O entendimento do STJ no Tema 1.237 baseou-se na classificação dos juros moratórios como receita bruta operacional, incluindo-os na base de cálculo das contribuições ao PIS e à Cofins. Esse posicionamento sustenta que todas as receitas financeiras, incluindo os juros moratórios, integram o conceito de receita bruta operacional, pois estão atreladas às atividades operacionais da pessoa jurídica.
No entanto, a análise da verdadeira natureza dos juros moratórios, especialmente quando calculados pela taxa Selic, revela que esses valores têm como principal objetivo evitar prejuízos ao credor decorrentes da desvalorização do montante devido em razão da demora no seu recebimento. A legislação tributária e a doutrina majoritária reconhecem a natureza indenizatória dos juros de mora, classificando-os como uma forma de recomposição do patrimônio desfalcado, e não como receita financeira.
O STF, ao julgar o Tema 962, determinou de forma clara a exclusão da incidência do IRPJ e da CSLL sobre os juros da Selic, entendendo que esses valores não integram o conceito de lucro, mas são apenas uma recomposição do patrimônio. Esse entendimento está alinhado com a doutrina majoritária, que defende que a verba indenizatória visa apenas recompor uma perda patrimonial, não representando um acréscimo patrimonial.
Além disso, o conceito de receita para fins de incidência do PIS e da Cofins deve ser entendido como a incorporação de valores de maneira positiva, definitiva e irreversível ao patrimônio da empresa, com relação de causalidade com as atividades desempenhadas. Esse entendimento foi pacificado pelo STF através do Tema 69, que excluiu os valores correspondentes ao ICMS das bases de cálculo do PIS e da Cofins.
Portanto, reconhecer os juros moratórios como receita bruta para fins de incidência do PIS e da Cofins desconsidera a natureza indenizatória desses valores e implica uma tributação inadequada. A decisão do STJ no Tema 1.237, ao manter a incidência de PIS e Cofins sobre a taxa Selic aplicada na restituição ou compensação de créditos tributários, baseou-se em uma interpretação equivocada que não leva em conta a verdadeira natureza desses valores.
A correta interpretação do conceito de receita, alinhada com a jurisprudência do STF e a doutrina majoritária, é crucial para garantir um sistema tributário justo e conforme os princípios jurídicos estabelecidos. É essencial entender que a incorporação de valores de maneira positiva é um requisito fundamental para a configuração de receita e, consequentemente, para a tributação adequada das exações envolvidas. Somente assim é possível assegurar a justiça fiscal e a segurança jurídica no sistema tributário brasileiro.
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