A subvenção para investimento foi objeto de muitos debates judiciais nos últimos anos e, tomou um novo corpo após as decisões do STJ, principalmente por conta da alteração legislativa ocorrida em 29 de dezembro de 2023.
Em um breve retrospecto ao histórico legislativo [1], tivemos em 2017 a publicação da Lei Complementar n° 160, que alterou a Lei nº 12.973/2014, ficando assim definido que os incentivos fiscais de ICMS (subvenção para investimento) são auxílios concedidos por um ente público (estado e Distrito Federal) por meio de leis, convênios e regramentos legais e infralegais, visando esse objetivo: estimular o desenvolvimento de regiões do país, por meio do fomento de negócios locais.
Até então, os incentivos fiscais deixavam de compor a base de cálculo de IRPJ e CSLL, sob a condição do cumprimento de apenas dois requisitos legais, quais sejam: (1) constituição de reserva de incentivo no valor do benefício fiscal e, (2) a não distribuição aos sócios, conforme assim permitia o artigo 30 da Lei n° 12.973/14. Da mesma forma, foi regrada a permissão do seu uso pelos contribuintes somente para absorção de prejuízos e aumento do capital social [2].
Ocorre que, as discussões judiciais sobre o tema se iniciaram, pois, mesmo com tal permissão, a Receita Federal vinha restringindo esse direito do contribuinte através de soluções de consulta [3], na qual passou a exigir requisitos não previstos na Lei, contrariando, inclusive, o §4º do artigo 30 da Lei nº 12.973/2014, o que fez com que diversos contribuintes se sentissem inseguros juridicamente para utilizar a subvenção e, para isso buscaram o acionamento do Poder Judiciário.
Sobre os incentivos fiscais de ICMS, especificamente, duas decisões repercutiram no âmbito jurídico, as quais destacam-se abaixo:
- A primeira decisão proferida pelo STJ se deu no âmbito do EREsp nº 1.517.492, em 2018, que tratou somente sobre o benefício fiscal de crédito presumido de ICMS. Na ocasião, a Corte Superior entendeu que tal benefício tributário não deve integrar a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, destacando ainda, a desnecessidade do cumprimento de nenhum requisito legal. Tal decisão foi proferida com base na interpretação do Princípio do Pacto Federativo, pois os referidos incentivos, não podem ser tributados pela União, haja vista ser desarrazoado submeter os valores dos incentivos fiscais do ICMS à tributação do IRPJ e da CSLL, considerando que os benefícios foram criados justamente para desonerar o contribuinte. Assim, tributar tais valores acabaria por neutralizar parcialmente o benefício em desconformidade ao anseio do legislador estadual.
- Em 2023, sobreveio a segunda decisão do STJ sobre a questão, que foi objeto do Tema 1182, na qual a Corte Superior analisou os demais benefícios fiscais como isenção, redução de base de cálculo, diferimento e entre outros, vindo então, a corroborar o já disposto no artigo 30 da Lei n° 12.973/14, de que os incentivos fiscais poderiam ser excluídos da base de cálculo do IRPJ e CSLL, desde que cumpridos os dois requisitos legais já mencionados anteriormente, mas ainda assim com a ressalva de que a Receita Federal pode realizar procedimento fiscalizatório que, poderá resultar em lançamento do IRPJ e CSLL, quando for verificado que os valores oriundos do benefício fiscal foram utilizados para finalidade estranha à garantia da viabilidade do empreendimento econômico. Portanto, o próprio judiciário abriu margem para a Receita Federaç realizar fiscalizações em face dos contribuintes. Assim, diferentemente da decisão que versou sobre os créditos presumidos, a decisão do Tema 1.182, decidiu, portanto, com base na própria disposição da Lei Complementar 160/2017, que prevê as condicionantes para a exclusão dos incentivos ficais de ICMS sobre a base de cálculo do IRPJ. Logo, infere-se do referido julgado (Tema 1182) de que o Princípio do Pacto Federativo ficou em segundo plano, pois os ministros não quiseram se enveredar por este caminho, ou seja, não decidiram sobre a tributação dos benefícios fiscais de ICMS com base em tal princípio. Na ocasião, o Executivo atuou firmemente junto ao STJ antes do julgamento, sob o argumento de perda de receita para o governo, com o objeto de aumentar a arrecadação. Esses foram os primeiros sinais do que estava por vir.
E mais, com o argumento de zerar o déficit fiscal no Brasil, o atual governo vem surpreendendo os Contribuintes brasileiros com várias medidas arrecadatórias. E, por óbvio, as subvenções para investimentos não ficaram de fora do radar.
No final do ano de 2023, dia 29 de dezembro, foi publicada a Lei n° 14.789/2023 que versa sobre as novas medidas das subvenções para investimento, trazendo mudanças significativas em seu tratamento, dentre as quais, destacam-se os principais pontos abaixo:
- A partir de 2024 os incentivos fiscais de ICMS (subvenções) passaram a integram a base de cálculo do IRPJ e CSLL e também do PIS e da Cofins;
- Criação de crédito fiscal, ou seja, a empresa que receber inventivos fiscais de algum ente público terá direito a apurar “crédito fiscal de subvenção para investimento”, o qual poderá ser compensado com tributos federais ou ressarcidos, desde que devidamente habilitados na RFB, e cumpridos os requisitos impostos pelos artigos 3°, 4° e 5°da referida lei;
- O cálculo do crédito será sob a alíquota de 25% aplicada sobre os incentivos (subvenções) recebidas pelo contribuinte, desde cumpridos todos os requisitos impostos pelo artigo 7° da referida lei, ou seja, fica limitado a não superar a subvenção obtida;
- Para ser considerada subvenção para investimento, o ente federativo promover ato de concessão, no qual deverá constar condições e contrapartidas de forma expressa, relacionadas à implantação ou expansão de empreendimento econômico;
- O governo pretende controlar a utilização na nova forma, mediante habilitação na SRFB e também da necessidade de ato de concessão do benefício anterior a implantação ou expansão do empreendimento;
- Exclusão da base de cálculo dos juros sobre capital próprio a reserva de incentivos fiscais decorrentes de doações ou subvenções governamentais para investimentos, bem como as ações em tesouraria.
Essas mudanças alteraram de forma significativa o regime anteriormente dado às subvenções, visto que antes os incentivos fiscais de isenção, redução de base de cálculo, diferimento e entre outros, não eram tributados quando o contribuinte lograva cumprir os requisitos determinados pela legislação vigente à época.
Logo, tanto a alteração legislativa como os julgamentos sobre o tema pelo STJ vêm gerando questionamentos relevantes por parte de muitos contribuintes, haja vista que as preocupações residem em, será que as limitações da nova legislação terão o condão de atingir as empresas que usufruem do crédito presumido de ICMS?! O que justifica o entendimento do STJ que, para créditos presumidos deve-se respeitar o Princípio do Pacto Federativo e os demais benefícios fiscais de ICMS não?! Tal questão sobre o Pacto Federativo nos julgamentos do STJ poderia então ser levado ao STF?! Será que a limitação de crédito tributário sob a alíquota de 25% somente após a conclusão da implantação ou expansão, mediante habilitação na Secretaria da RFB de fato ocorrerá?! Será que os entes da federação (estado e Distrito Federal) irão se ocupar de promover os atos concessivos da subvenção estabelecendo expressamente as condições e as contrapartidas a serem observadas?! Entre tantos outros pontos que podem e com certeza vão ser questionados.
De fato, são muitos os requisitos impostos por essa nova legislação e, muitos são também os obstáculos a serem enfrentados pelos contribuintes sobre o tema, pois, chega-se à conclusão de que mais uma vez o Poder Judiciário vai precisar ser acionado para dirimir todas essas ilegalidades e inconstitucionalidades, haja vista o movimento arrecadatório do governo atual.
[1] Há que se considerar também as demais legislações sobre o tema: Lei nº 4.320/64; Lei nº 6.404/76; Decreto-Lei nº 1.598/77.
[2] Observadas as demais disposições legais aplicáveis.
[3] Solução de consulta COSIT nº 145, de 15 de dezembro de 2020; solução de consulta COSIT nº 15, de 29 de março de 2022; Solução de consulta DISIT/SRRF07 nº 7001, de 10 de janeiro de 2023, entre outras.