Comentários sobre honorários de sucumbência e o Tema Repetitivo nº 1.059/STJ
12 de fevereiro de 2024, 17h14
O artigo 85 do Código de Processo Civil dispõe que “a sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor”.
Os honorários de advogado podem ser fixados com fundamento em critérios de sucumbência ou de causalidade. Interessa-nos, para os fins propostos no presente artigo, tratar singelamente a respeito da primeira dessas situações.
O §11º do artigo 85 do CPC
Ao abordar a questão alusiva à fixação dos honorários de sucumbência em sede recursal, o enunciado normativo do artigo 85, §11º, prevê o seguinte:
“O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento”. (Ressalvam-se os grifos)
O Tema nº 1.059 do STJ
O colendo Superior Tribunal de Justiça submeteu a seguinte questão a julgamento pela sistemática dos recursos repetitivos (Tema nº 1.059):
“(im)possibilidade da majoração, em grau recursal, da verba honorária estabelecida na instância recorrida, quando o recurso for provido total ou parcialmente, ainda que em relação apenas aos consectários da condenação”.
O julgamento referido implicou a formulação da seguinte tese:
“A majoração dos honorários de sucumbência prevista no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento ou limitada a consectários da condenação”. (Ressalvam-se os grifos)
Considerações sobre a decisão
Com as devidas vênias, a solução jurídica empregada pela Corte da Cidadania não se afigura consentânea, à vista das balizas normativas e doutrinárias que envolvem a matéria. Nesse sentido deve-se registrar que a verba honorária de sucumbência é titularizada pelo advogado como contraprestação de seu serviço profissional. Assim bem explicitam as seguintes regras previstas no Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil:
“Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência.
(omissis)
Art. 23. Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor”. (Ressalvam-se os grifos)
A percepção dessa verba, cuja natureza é alimentar (Resp nº 1.991.123 – SP), não pode ser indevidamente restringida sem amparo na legislação de regência.
Como afirmado, a norma contida no artigo 85, §11º, do Código de Processo Civil determina, de modo expresso e sem ressalvas, a majoração dos honorários fixados na origem, atrelada à noção de sucumbência, obrigando-se, assim, o vencido diante do vencedor.

Também é clara a norma prevista no artigo 85, §1º do códex instrumental ao expressar que: “são devidos honorários advocatícios da reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente”.
A hipótese de sucumbência recíproca
O entendimento firmado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, além de projetar restrição indevida a direito de estatura constitucional, parece desconsiderar o conceito de “sucumbência recíproca”.
Dito de outro modo, o Código de Processo Civil positivou solução satisfatória para os casos de parcial provimento do recurso, sem necessidade de se afastar a aplicação da regra contida em seu artigo 85, §11º. No nosso entender, para hipóteses tais, deve ser majorada a verba honorária e redistribuída com esteio nos critérios alusivos à sucumbência recíproca, nos termos dos artigos 86 e 87 do multicitado diploma legal, senão vejamos:
“Art. 86. Se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as despesas.
Parágrafo único. Se um litigante sucumbir em parte mínima do pedido, o outro responderá, por inteiro, pelas despesas e pelos honorários.
Art. 87. Concorrendo diversos autores ou diversos réus, os vencidos respondem proporcionalmente pelas despesas e pelos honorários.
§1º. A sentença deverá distribuir entre os litisconsortes, de forma expressa, a responsabilidade proporcional pelo pagamento das verbas previstas no caput”.
Lado doutro, melhor sorte não encontra a afirmação contida no precedente qualificado no sentido de que a majoração dos honorários seria devida nos casos em que o recurso não foi conhecido.
A lição de Rui Portanova
Como dito alhures, os honorários de sucumbência estão atrelados à noção de vencedor e vencido, repita-se: “a sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor”. A condição de vencido, a seu turno, diz respeito à situação jurídica ocasionada pela “procedência do pedido” da parte adversa. A propósito, convém examinar a seguinte lição doutrinária formulada pelo jurista Rui Portanova [1]
“Na linguagem comum, sucumbente é aquele que se sujeita à força que age contra si: estar deitado em baixo, cair debaixo, não resistir, ceder aos esforços de outrem. No processo não é muito diferente, mas o sucumbente processual nem sempre luta. Há sucumbência mesmo na hipótese do requerido reconhecer a procedência do pedido do autor. Costuma-se dar maior atenção ao aspecto pecuniário da sucumbência. É importante ter-se em mente que a sucumbência consiste na situação que surge a partir da desconformidade entre o que pediu o litigante e a decisão contida na sentença.” (Ressalvam-se os grifos)
Ora, a hipótese de não conhecimento do recurso não poderia causar a condenação em honorários de sucumbência, pois nesse caso não houve o exame do mérito do recurso, implausível, portanto, falar-se em vencido ou em vencedor.
Esclarece-se, ademais, que, ao nosso ver, não teria aplicação, em sede recursal, a norma prevista no artigo 85, §10º, do Código de Processo Civil, a seguir transcrita, pois a fase de recursos não se ajusta, nem mesmo por analogia, ao conceito de processo: “nos casos de perda do objeto, os honorários serão devidos por quem deu causa ao processo”.
Conclusão
Diante dessas considerações e realçando as vênias anteriormente oferecidas, os argumentos aqui registrados indicam que a solução normativa empregada pelo legislador não merecia os reparos imprimidos em virtude do julgamento do Tema Repetitivo nº 1.059.
[1] PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. 3 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1999, p. 254-255.
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