Danos morais: existe caráter pedagógico ou o punitivismo descansou?
22 de agosto de 2024, 10h00
Neste trabalho será debatido qual espaço tem o dano moral no Brasil. A subjetividade pode ser um impeditivo do debate, mas não o suficiente para não tê-lo.
No Brasil, a palavra dano moral serve para representar o dano aos múltiplos interesses da pessoa humana. [1] Esses interesses são, sobretudo, imateriais. Assim, o dano deve ser identificado não pelo bem sobre o qual incidiu, mas pela natureza final do prejuízo por ele determinado (SANTINI,1997, P.35)
No plano do direito, a necessidade de reparação de danos havidos tem se assentado na consciência dos povos, diante de exigências naturais da própria vida em sociedade. Mas algumas questões têm, nesse campo, provocado infindáveis discussões, em especial cita-se os valores oriundos da indenização por dano moral [2]
Assim, se torna inevitável a busca pelo sentido da subjetividade humana de julgar. O que se discute é se essa violação aos direitos da personalidade são passiveis de um valor reparatório acima do aplicado no Brasil.
Esses bens, danos morais, são imateriais e inerentes à qualidade intrínseca do ser humano.
Caráter pedagógico
Em primeiro lugar, tem-se avistado um nevrálgico diário de fracasso econômico da advocacia, e cabe estabelecer os seus motivos, prognósticos e debate útil. Ademais, há uma contraposição nos pensamento divergentes entre o significado do dano moral.
A uma, um motivo fonte desta indefinição é o excesso de subjetivismo. Como descobrir o que o outro sente? ou saber quanto o próximo foi prejudicado? Como identificar o tamanho do prejuízo emocional de alguém?
Dentro desta linha, se faz observar o princípio da proporcionalidade, comumente definido como aquilo que está entre o início e o fim, ou seja, tudo que o torna intermediário, medido na medida.
Entretanto, se questiona novamente qual a proporcionalidade estampada no direito nacional? Por que tanto subjetivismo?
Há, em muitos casos concretos, o disparo de pensamentos divergentes sobre quais resultados serão efetivamente entregues ao advogado. Assim, hipoteticamente, mais de um resultado pode se tornar válido e, com isso, a arbitrariedade nasce.
Caminhando sobre o tema, pode-se definir os direitos da personalidade como um conjunto de prerrogativas que visa à projeção do ser humano e seus prolongamentos. [3] Essas prerrogativas parecem ameaçadas pela arbitrariedade de se decidir, a qualquer modo, a decisão de como “acordei hoje”.
Indenização por negligência, malícia ou dolo
Não por acaso, traz-se a torna o conceito utilizado nos Estados Unidos, chamados de punitive damages. Eles podem ser definidos como: “indenização outorgada em adição à indenização compensatória quando o ofensor agiu com negligência, malícia ou dolo” [4]
Dentre os objetivos que se aparelham ao trabalho estão:
Soma adicional acima da remuneração, para a vítima dos danos sofridos, concedida com a finalidade de punir o réu e de adverti-lo a não fazer de novo, além de intimidar os outros com o exemplo
Assim, a indenização punitiva é definida como:
“[…] a indenização, não compensatória ou nominal, conferida com intuito de punir alguém por sua conduta ultrajante e dissuadir o ofensor e outros como ele de condutas similares no futuro” (Restatement (Second) of Torts § 908, 1979, Os danos morais, muitas da vezes pode ser visto como uma punição a práticas abusivas. [5]
Dessa forma, os defensores do caráter punitivo da indenização por danos morais invocam a chamada “teoria do valor do desestímulo”, segundo a qual, na fixação da indenização pelos danos morais sofridos, deve o magistrado estabelecer um valor capaz de impedir/dissuadir práticas semelhantes, assumindo forma de verdadeira punição criminal no âmbito cível. [6]
No que diz respeito às funções do instituto em questão, o seu propósito principal, na origem da maioria das jurisdições que o utilizam, sempre foi identificado com o intuito de punir o ofensor da conduta e dissuadir ou desestimular este ofensor e terceiros de agir desta mesma forma. [7]
A condição moral do individuo deve ser de igual monta à condição material. [8] Ocorre que no Brasil o dano moral punitivo descansou. Encontra-se em um estado de latência eterna.
Compreender-se-á o trabalho do advogado, que deve ser defendido quando há irregularidades. De acordo com o exposto, a subjetividade do dano moral tem causado uma relação de não causalidade com a responsabilidade civil.
Questiona-se como um juiz vai saber se a pessoa se sentiu bem ou mal em sua esfera intima? Portanto, não se trata de uma critica a magistratura, mas sim uma reflexão sobre o instituto e como ele vem sendo aplicado.
Utiliza-se, neste momento, a frase de Sobral Pinto, quando se aduz que a advocacia não é profissão para covardes [9], mas se não é para covardes, também não é para advogados que se tornam quase que hipossuficientes.
Danos morais no campo afetivo
Coleciono a este trabalho uma reportagem do portal Migalhas que idealiza e concretiza o que tem acontecido nos tribunais brasileiros:
Homem receberá R$ 2 mil após perder velório de avó por voo atrasado. A 7ª turma recursal Cível do TJ/SP manteve decisão que indenizou um passageiro em R$ 2 mil após ele perder o velório de sua avó devido a um atraso em voo. O colegiado negou a majoração da indenização, considerando o valor proporcional à capacidade econômica do autor e ao preço da passagem. [10]
Afinal, quanto custa se despedir de um parente? Quanto custa oferecer um adeus a sua avó? Estaria alguém disposto a mudar este paradigma? Há falta de sensibilidade e experiência de vida? A punição descansou.
As hipóteses de dano moral indenizável a serem vistas na seara afetiva é de suma importância. O fio condutor do afeto é de supra importância para a sociedade. Aliás, se o dano moral é a afetação ou o transtorno a bens extrapatrimoniais, se tem algo que se coaduna com ele é o afeto humano.
O dano se coaduna com a dignidade humana, pois muitas das vezes a atinge. Segundo Rosenvald, aproximar o modelo jurídico do dano moral com o princípio da dignidade humana é um exercício indispensável para todos que verdadeiramente queiram construir um direito civil constitucional. [11]
Afeto ao seguimento do trabalho, inclui-se nele uma crítica ao “mero dissabor” cotidiano como resposta a não interposição pedagógica do dano moral. Por certo, as demandas frívolas devem ser evitadas, entretanto, esse argumento não contribui para um direito humanizado constitucional onde se é dado àquilo que se é devido.
Afirma-se que não há dano moral quando o interesse existencial é protegido juridicamente, mas a violação se deu em uma intensidade mínima e compatível com aborrecimentos do cotidiano. [12] O que é aborrecimento do cotidiano?
Por sua vez, no dano material é possível estreitar o valor a ser designado, mas no dano moral não, é preciso um juízo de probabilidade, proporcionalidade e razoabilidade, o que o torna mais complexo.
Assim, é possível surgir o cabimento por dano moral a partir da violação da dimensão social da pessoa humana. Anota-se que alguns direitos da personalidade são feridos como forme de crime permanente, trazendo o código penal a baila. São eles a precariedade encontrada nas favelas, as pessoas em situação de rua, entre outros problemas estruturais.
Em suma, dano moral justo não é enriquecimento ilícito capaz de criar ao autor da lide um projeto de vida pela indenização, significa apenas oferecer o que se deve.
Conclusão
Nesta discussão, procurou-se reforçar a importância do caráter punitivo dos danos morais. Isso porque o argumento de enriquecimento ilícito não convém e nem convence. O valor de dano moral equivalente a um telefone é enriquecimento ilícito? Fica o questionamento.
Fica, aqui, a defesa aos advogados.
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Bibliografia
https://www.migalhas.com.br/quentes/412842/homem-recebera-r-2-mil-apos-perder-velorio-de-avo-por-voo-atrasado
Bittar, Carlos Alberto. Reparação civil por danos morais, 4ª edição.
[1] https://ler.amazon.com.br/?asin=B098TPNGBD&_encoding=UTF8&ref=dbs_p_ebk_r00_pbcb_rnvc00
[2] Reparação civil por danos morais, 4ª edição. Carlos Alberto Bittar. 2021. Editora Foco.
[3] Caderno da EMERJ – Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro
[4]https://www.tjsp.jus.br/download/EPM/Publicacoes/ObrasJuridicas/rc14.pdf?d=636680468024086265
[5] https://www.scielo.br/j/seq/a/CB74rdVxpgddGSZBbnz9nDK/
[6] https://www.sedep.com.br/artigos/o-carater-punitivo-da-indenizacao-por-dano-moral-nos-eua/
[7] https://www.scielo.br/j/seq/a/CB74rdVxpgddGSZBbnz9nDK/
[8]EBOOK https://www.amazon.com.br/gp/product/655515330X/ref=ox_sc_act_title_1?smid=A1ZZFT5FULY4LN&psc=1&asin=B098TPNGBD&revisionId=ec357978&format=3&depth=1
[9] https://www.conjur.com.br/2022-dez-02/sheyner-yasbeck-asfora-dia-advocacia-criminal/#:~:text=%22A%20advocacia%20n%C3%A3o%20%C3%A9%20profiss%C3%A3o,dezembro%2C%20Dia%20da%20Advocacia%20Criminal.
[10] https://www.migalhas.com.br/quentes/412842/homem-recebera-r-2-mil-apos-perder-velorio-de-avo-por-voo-atrasado
[11]https://ler.amazon.com.br/?asin=B098TPNGBD&_encoding=UTF8&ref=dbs_p_ebk_r00_pbcb_rnvc00
[12] https://ler.amazon.com.br/?asin=B098TPNGBD&_encoding=UTF8&ref=dbs_p_ebk_r00_pbcb_rnvc00
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