Renda ganha e renda gasta
15 de outubro de 2023, 6h00
A renda ganha é tributada (juros, salários, aluguéis, ganhos do capital, vendas, doações que expressam aumentos patrimoniais). Por outro lado, as pessoas jurídicas e físicas gastam na aquisição de bens duráveis e não duráveis e de serviços de produção ou necessários à sobrevivência. É pertinente então falar em renda gasta.

Esses prolegômenos tem sua razão de ser no campo pré-jurídico da tributação, embora ocorram na mente do legislador, como fenômenos informativos do seu labor e ajudam também a crítica jurídica pois são fatos da realidade em face da razão crítica.
O IVA, conhecido há séculos (Impot sur la valeur ajouté na sua primeira aparição) não é nenhuma novidade e adapta-se a países unitários, ou seja, não divididos em Estados, tipo Portugal, França, Itália, etc, sendo mais complexa a sua operação em países federados como os EUA, que nunca cogitaram usá-lo. Lá vige a "sale tax". O estado de Michigan tentou testá-lo e desistiu.
Na Europa, há o modelo alemão de IVA, o exemplo melhor que poderíamos ter seguido, pois lá existem os landers (Estados membros). Alemanha é um estado federal (nada disso foi feito). Estamos nós agora sujeitados a dois IVAs, o estadual (imposto sobre o valor adicionado com o direito de crédito das operações anteriores) e o CBS (contribuição federal sobre bens e serviços igualmente não cumulativo) ambos sujeitos à mesma legislação, com alíquota média de 25%.
O contribuinte final pagará o aumento projetado dos impostos. A propalada reforma do governo sobre os impostos sobre o consumo de bens de serviços aumentará a carga tributária de maneira impactante, afetando o preço de todos os serviços, (71% da economia nacional).
Os serviços de carga e de pessoas, não estritamente municipais, a energia elétrica e a mineração e as telecomunicações estavam sujeitas ao ICMS estadual cuja alíquota máxima era de 18%. Lado outro, os demais serviços além do IOS financeiro, pagavam o ISQN imposto sobre serviços de qualquer natureza ou ISS, para usar a sigla mais conhecida entre 2% a 5%.
As profissões chamadas de regulamentadas (advogados, contabilistas, médicos, odontólogos, engenheiros, eletricista, bombeiros, etc) assim como os contribuintes do ISS passam a pagar no mínimo 25% sobre o preço dos seus serviços. Como as comercializadoras de bens também pagarão o mesmo percentual, resta evidentíssimo o aumento tributário. (Os serviços especialmente deixam de pagar a 5% no máximo para pagar no mínimo 25%. Nem há falar de ICMS que nunca pagaram…). Os demais contribuintes de bens estão no 25%.
Mas tanto o ICMS quanto o ISS eram não cumulativos tinha-se o direito de crédito das operações anteriores. A não cumulatividade no Brasil era a imagem da imperfeição. Continuará a sê-lo? Não sabemos, vai depender da lei complementar. Estamos num quarto escuro e aflitos, sobre o parcial e aparentemente novo regime de tributação, mais gravoso.
Uma coisa é certa. Haverá aumento da carga tributária, que embutida nos preços, será paga, em última análise, pelo consumidor final, nós mesmos!
Sempre segui a teoria didática dos tributos vinculados a uma atuação estatal, mas levo a sério a teoria da renda ganha (capital, trabalho e a combinação de ambos) e a teoria da renda gasta (aquisição de bens e serviços) seja para tê-los, repassá-los ou utilizá-los (noutras palavras, no consumo, na produção ou investimentos).
E por qual razão? Por isso que a teoria distingue melhor a tributação e suas bases de incidências em busca de clareza econômica e de justiça fiscal.
Os ganhos são frutos do capital já possuído, do trabalho, da combinação de ambos ou da sorte. (Ganhos lotéricos e de outros apostas inclusive no mercado financeiro). Nos parece óbvio que cada tipo de ganho, eventual ou permanente (salários, juros de capital aplicado, vg) merece um tratamento fiscal separado e justo.
O mesmo se dá com as despesas. Uma são indispensáveis a ricos e pobres. Outras somente podem fazê-las (itens de luxo ou elevado custo).
Novamente há lugar para políticas diferenciadas de tributação racional.
O imposto sobre a renda (ganha) incide acima de certo limite, em bases correntes ou não, mas com um tipo de acerto anual. O chamado ganho de capital ou ganhou aleatório (loterias e apostas) todavia costumam ser incididas uma só vez, a cada evento extraordinário. Salário é renda e, pois, a partir de certo limite, é incidido regularmente.
As despesas feitas com a renda e sua retenção pelo vendedor de bens e serviços, igualmente sofre tributação, já não pelo imposto de renda ou sobre o capital (ganhos de capital), mas através de impostos sobre a renda gasta no consumo de bens e serviços.
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