As medidas provisórias perderão eficácia se não forem convertidas em lei no prazo de 60 dias, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes. Se tal decreto não for editado, porém, as relações jurídicas constituídas durante a vigência da MP continuarão a ser regidas por ela.
Com essa fundamentação, a 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) reconheceu a tempestividade de recursos administrativos interpostos por uma entidade voltada à formação profissional de estudantes em Minas Gerais e suspendeu as multas aplicadas a ela.
Consta dos autos que o Centro de Integração Empresa-Escola de Minas Gerais (CIEE-MG) foi alvo de dois autos de infração, contra os quais recorreu em defesa apresentada à Superintendência Regional do Trabalho — que, em seguida, enviou notificações de multas à entidade, recebidas em junho de 2021. O CIEE contestou as multas em recurso administrativo protocolado no dia 21 de outubro do mesmo ano.
Porém, a seção de multas do órgão vinculado ao Ministério do Trabalho entendeu que o recurso foi interposto fora do prazo e, por isso, ele foi rejeitado. O CIEE, por sua vez, sustentou que, naquela data, ainda estava em vigor a Medida Provisória 1.045/2021, por meio da qual o governo federal instituiu, em meio à crise da Covid-19, o programa emergencial de manutenção do emprego.
Editada em 27 de abril de 2021, a MP suspendia todos os prazos para interposição de recursos ou pagamento pelo prazo de 180 dias, a contar de 28 de abril. Ou seja, na visão do CIEE, o recurso foi apresentado dentro dos seis meses previstos pela medida provisória.
Ocorre que, posteriormente, em 1º de setembro, a MP foi rejeitada pelo Senado. Diante disso, a Superintendência Regional do Trabalho sustentou que, como a medida provisória rejeitada não produz efeitos para além do período de sua vigência, o prazo para recurso administrativo havia sido retomado em 2 de setembro e expirou em 4 de outubro de 2021.
Em sua defesa, o CIEE invocou o §3º do artigo 62 da Constituição. Tal dispositivo estabelece que, caso uma MP seja rejeitada, o Congresso Nacional deve editar decreto legislativo disciplinando as relações jurídicas decorrentes da medida. Só que isso não foi feito pelos parlamentares. Assim, para a entidade, as relações constituídas durante a vigência da MP continuariam regidas por ela. E isso incluiria a suspensão, por 180 dias, do prazo para interposição do recurso.
Com base nessa argumentação, o CIEE pediu que a Justiça do Trabalho
reconhecesse a tempestividade dos recursos administrativos, mas o pedido foi negado em primeiro grau. A relatora do caso na 2ª Turma do TRT-3, desembargadora Maristela Íris da Silva, destacou que, no dia 1º de setembro de 2021, a Medida Provisória 1.045 foi rejeitada pelo Senado e não houve a publicação de decreto legislativo regulamentando a sua vigência, conforme determina o artigo 62, §§3º e 11, da Constituição.
"Portanto, considerando que não foi editado o decreto legislativo a que se refere o § 3º do art. 62 da CR/88, as relações jurídicas constituídas no curso da vigência da Medida Provisória, conforme previsto no § 11 do art. 62 da CR/88, permanecem por ela regidas, devendo-se observar o prazo de 180 dias para a interposição do recurso administrativo, nos termos do art. 21 da Medida Provisória 1.045/2021", fundamentou a relatora.
Diante disso, ela reconheceu a tempestividade dos recursos administrativos interpostos pelo CIEE e suspendeu as multas aplicadas à entidade, assim como a inscrição delas em dívida ativa. A decisão foi unânime e contou com os votos dos desembargadores Lucas Vanucci Lins e Gisele Macedo.
Atuaram na defesa do CIEE as advogadas Juliana Maria Cunha Reis e Shirley Neri de Aguiar Oliveira.
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Recurso 0010273-53.2023.5.03.0186