É ilícita a prova do crime de aborto obtida pela quebra do sigilo profissional praticado pelo médico que atendeu a autora da conduta. Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça concedeu Habeas Corpus e trancou ação penal contra uma mulher.
Trata-se de uma reafirmação de jurisprudência, com base em precedente do colegiado, julgado em março de 2023. O tema é atual inclusive porque o Supremo Tribunal Federal tem em julgamento a descriminalização do aborto, o qual será reiniciado presencialmente.
No caso dos autos, uma mulher tentou eliminar a gravidez indesejada pela ingestão de cinco comprimidos de medicamento abortivo. Ela passou mal e precisou de em um hospital público. A médica plantonista que a atendeu ligou para a Polícia Militar e fez a denúncia.
A acusada deixou o local presa em flagrante e foi denunciada pelo artigo 124 do Código Penal. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a ação penal porque entendeu que materialidade e autoria do crime estavam demonstradas. A Defensoria Pública paulista levou o caso ao STJ.
Relator, o ministro Antonio Saldanha Palheiro destacou que as provas são ilegais porque decorreram da quebra do sigilo médico garantido aos pacientes. E também pelo fato de a médica ter afirmado que viu, mas não recolheu o medicamento abortivo na paciente.
Ele definiu a situação como de absoluto constrangimento capaz de causar repúdio em qualquer operador do Direito minimamente sensível. “Um hospital tem que ser um centro de acolhimento para a saúde. E assim deve ser o comportamento dos profissionais que o guarnecem e administram”, disse.
Ao acompanhar o relator, o ministro Rogerio Schietti afirmou que houve uma sequência de violações à dignidade da pessoa humana. “Aqui se trata de uma denúncia feita por uma profissional da saúde, uma mulher. Faltou, inclusive, sororidade”, criticou.
O colegiado ainda determinou o encaminhamento do caso para o Conselho Federal de Medicina, para que tome as providências cabíveis. A votação foi unânime.
HC 448.260