Opinião

Reflexão sobre o INSS, o caos e o dano moral previdenciário

Autor

  • é mestre em Direito Constitucional (FDSM) pós-graduado pela EPD-SP e PUC-SP professor de diversos cursos (graduação pós-graduação preparatórios e atualização jurídica) professor titular do Direito Unopar Itajubá coordenador acadêmico da pós-graduação em prática previdenciária da Escola Mineira de Direito (EMD) escritor com mais de 15 livros publicados em várias editoras integrante do Tribunal de Ética e Disciplina (TED) Regional da OAB-MG advogado em Minas Gerais membro da Rede Internacional de Excelência Jurídica tendo integrado a comitiva de pesquisadores brasileiros no 1º Congresso Internacional de Seguridade Social da Faculdade de Direito de Harvard (EUA) em agosto de 2019.

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6 de novembro de 2023, 6h06

Aqui uma necessária e sintética reflexão sobre a fragilizada atuação funcional do INSS na pós-pandemia.

Certo que pouco há para se comemorar.

Um caos previdenciário institucionalizado, desprovido de um plano público e emergencial para a correção de rotas, minimamente necessário para que esse importante órgão federal realize suas relevantes finalidades no cenário nacional, notadamente àquelas inseridas na legislação previdenciária, tanto constitucional quanto infraconstitucional.

É o INSS um importante órgão federal que faz a gestão das prestações previdenciárias do Regime Geral de Previdência Social, o conhecido RGPS, aliás, o maior regime jurídico previdenciário brasileiro e um dos mais complexos do mundo.

Por certo que atua e deve atuar neste terreno de proteção jurídica, vale dizer, tutelar seus filiados trabalhadores em específicas situações de necessidade social. Essa a essência que confere vida a Previdência Social [1] entendida amplamente como uma genuína técnica constitucional de proteção previdenciária, em regra contributiva, solidária, de filiação obrigatória, dentre outros aspectos.

O abrigo, a proteção e a tutela jurídica integram a atividade-fim de qualquer regime previdenciário, sobretudo àqueles que escolheram o bem-estar; a justiça social e a dignidade da pessoa humana como premissas fundantes e consolidadas em textos constitucionais.

Um contexto de otimismo e esperança traçado a partir da Carta Cidadã de 1988 em uma programação de futuro para melhorias, integração e aperfeiçoamento de pactos sociais. Porém, em vias adversas, encontram os trabalhadores brasileiros uma desenfreada e triste crise institucional da autarquia.

Não por menos que o INSS ocupa a surpreendente posição de ser o grande réu da Justiça Brasileira [2].

Enormes filas [3]; atrasos [4]; ausência de servidores [5]; concursos [6]; problemas operacionais [7]; erros nas análises [8], etc., há muito tem sido a rotina do INSS do pós-pandemia, sem um responsável programa público de enfrentamento dos sérios problemas que ocorrem em larga escala e que cada vez mais se propagam em solo pátrio.

 Assim, justificado o rótulo do INSS como um órgão público mergulhado em plena crise institucional e também afirmar que existe um caos previdenciário evidenciado.

A bem da verdade, a correção das mazelas previdenciárias e da comprovada ineficiência do INSS tem ocorrido gradualmente em outro caminho, ou seja, via tutela jurisdicional no debate da emergente tese jurídica do dano moral previdenciário.

Em decorrência de seu papel-mor e constitucional o Judiciário recepciona as teses apresentadas e, se valendo das técnicas do Direito, proclama seus mais diversos resultados, produzindo entendimentos e buscando a tão sonhada paz social.

O dano moral previdenciário tem sido invocado no atual estágio da crise, como uma válida rota de compensação/correção das mazelas do INSS em uma avolumada recepção do Judiciário Nacional, cada vez mais sensível a viabilidade e utilidade da tese ao momento presente.

Casos de suspensão indevida de benefícios [9]; interrupções indevidas [10] ; indeferimentos indevidos [11]; erro de fundamentação na negativa de benefícios [12]; erro do procedimento [13]; maus-tratos no atendimento [14] e várias outras possibilidades têm tido agigantada repercussão jurídica perante os Tribunais Brasileiros, afirmando o recado de sua importante utilidade para corrigir/amparar/compensar os trabalhadores brasileiros frente ao caos institucionalizado pelo INSS.

A tese, de origem doutrinária e aperfeiçoamento jurisdicional, ganha força e visibilidade no cenário pátrio, com grande interesse não só jurisdicional, mas também acadêmico e da literatura jurídica.  

Theodoro Vicente Agostinho um dos idealizadores da tese assevera que: "O dano moral serve para corrigir situação a que o segurado foi submetido pelo INSS. E também deveria ajudar a administração pública a se organizar para prestar um melhor serviço. Bastava primar por uma administração mais competente, treinar com melhor os servidores, e em última análise, respeitar as normas regulamentadoras da Constituição" [15].

Em recentes estudos restou apurado que há precedentes em todo o país a respeito, das mais diversas situações e valores, com uma crescente aparição nos últimos anos, mesmo no período anterior da pandemia, com condenações diversas do INSS e ampla repercussão nacional [16].

Como exemplo, um recente julgado proferido pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região que bem consignou o alcance do dano moral nas relações previdenciárias geridas pelo INSS: "No mais, o relator, desembargador federal Daniel Paes Ribeiro, ao analisar a hipótese, explicou que nos autos foram anexados documentos que comprovam os fundamentos do autor e os prejuízos sofridos por ele diante da suspensão do benefício de natureza alimentar, e, desse modo, devem ser reparados os danos morais pleiteados…Em seguida, o Colegiado deu provimento à apelação do autor e afastou a prejudicial da prescrição, e, no exame, julgou procedente o pedido do requerente, condenando o INSS a reparar o dano moral causado em decorrência da indevida suspensão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço" [17].

Também, um outro precedente demonstra o necessário alcance e utilidade da tese, notadamente quanto a seus aspectos pedagógicos e corretivo, em que houve erro administrativo na análise cadastral, excessiva demora e ainda o falecimento do trabalhador durante o processo, conforme fundamentação crítica apontada pelo julgador: "Embora seja causa externa ao limite objetivo da presente lide, não se pode ignorar que o beneficiário — demandante originário da presente ação — veio a óbito. Questiona-se se com atuação diligente da autarquia, e se não tivesse o autor ficado mais de seis anos sem a percepção do benefício, seu estado de saúde poderia ter sido outro, ou, ao menos, seu sofrimento em busca de tratamento de saúde não poderia ter sido atenuado" [18].

A bem da verdade o caminho de enfrentamento da crise deveria ser outro, contudo, é com a tese do dano moral previdenciário que os pilares da justiça social, dignidade humana e bem-estar, no mínimo estão sendo respeitados, na firmada esperança de que o importante efeito pedagógico da tese possa trazer impacto estrutural nesta visível tempestade previdenciária de perigosos retrocessos.

 


[1] Artigo 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a: (…) CRFB

Autores

  • é mestre em Direito pela Faculdade de Direito do Sul de Minas (FDSM), pós-graduado pela Escola Paulista de Direito (EPD-SP) e pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), professor universitário da graduação, pós-graduação, cursinhos preparatórios e extensão/atualização jurídica, professor titular de Direito na Universidade Norte do Paraná (Unopar Itajubá-MG), coordenador acadêmico da pós-graduação em Prática Previdenciária da Escola Mineira de Direito (EMD), ex-conselheiro da OAB-MG (23ª Subseção), integrante do Tribunal de Ética e Disciplina (TED) Regional da OAB-MG, advogado em Minas e membro da Rede Internacional de Excelência Jurídica.

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