Mea culpa

Responsabilidade por populismo também passa pela atuação do Judiciário

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29 de novembro de 2023, 20h38

As consequências do populismo no cenário jurídico brasileiro nortearam a discussão do painel “Democracia, ideologia e populismo”, que aconteceu na manhã desta quarta-feira (29/11), na 24ª Conferência Nacional da Advocacia Brasileira. Para Lenio Streck, membro da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB, já não há a aplicação de leis e a Constituição. O que existe são teses, enunciados e súmulas, chamados de precedentes, em uma equivocada importação do sistema do common law para o Brasil.

Uarlen Valerio/CFOAB
Lenio Streck em painel sobre democracia e populismo na 24ª Conferência da Advocacia
Lenio Streck em painel sobre democracia e populismo na 24ª Conferência da Advocacia

Os painelistas analisaram de forma pormenorizada esse fenômeno e suas consequências. “Mostramos que a responsabilidade pela democracia e por suas crises também passa pelo Judiciário, pelo Ministério Público”, comentou Streck.

Baseado em Steven Pinker, o jurista afirma que os golpes de Estado não são mais feitos com quarteladas, mas são encaminhados de maneira sutil. “O alerta que toda a bancada deixou para que possamos combater isso é cuidar do Judiciário, de quem diz por último o que é direito. Deixamos isso muito claro, há nisso uma responsabilidade da sociedade”, elucidou.

Streck conduziu sua fala para um ponto importante que influencia a saúde do Judiciário: a jurisprudencialização. “Cada vez mais, o Direito brasileiro está sofrendo um certo imperialismo por parte das decisões judiciais. O que é o Direito no Brasil, então? É a Constituição? Ou são as teses e enunciados feitos em workshops?”, provocou. De acordo com ele, a reação dos presentes confirmou que esse é um problema que os advogados sentem no cotidiano. 

Em dado momento, ele pergunta à plateia quem já tinha ganhado um embargo de declaração com base no livre convencimento e todos permanecem calados. Reformulou a pergunta para “e quem já perdeu?”, e alguém gritou: “Todos”. “Isso é muito sintomático. Esse painel foi muito importante pela simbologia também, porque aqui se falou do que as pessoas sentem na carne. Sentimos também que os advogados estão preocupados com uma padronização, essa coisa de coach. Quando critiquei isso, a reação foi bastante positiva.”

A crítica de Streck se confirma com um balanço da audiência dos três dias de conferência. De longe, os painéis que tratavam de marketing, redes sociais e fórmulas para empreender foram os campeões de audiência.

Por fim, o jurista abordou o backlash recente no sistema político brasileiro. “Quando o parlamento não concorda com o STF, dá o troco. E quando o STF não concorda com o parlamento, mesmo quando a lei não é inconstitucional, assim a declara”, afirmou, em linhas gerais. “Trata-se de um sério problema de desenhos institucionais. E que é agravado pela inteligencia artificial, que provoca a fragilização da aplicação do Direito.”

Promovida pelo Conselho Federal da OAB e pela seccional mineira da Ordem, a conferência teve como tema “Constituição, Democracia e Liberdades”. Foram 50 painéis com temas variados, especialmente sobre questões atuais do país. Ao longo do evento, a OAB recebeu cerca de 400 palestrantes e 20 mil profissionais.

Uarlen Valerio
Mesa sobre Democracia, ideologia e populismo na 24ª Conferência Nacional da Advocacia
Mesa sobre democracia, ideologia e populismo na Conferência Nacional da Advocacia

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