GUERRA NAS ESTRADAS

Justiça libera viagens de 4 parceiras da Buser em Caraguatatuba (SP)

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24 de novembro de 2023, 18h44

O que distingue as atividades de transporte público coletivo e de fretamento colaborativo não é a existência de itinerários e valores fixos, mas sim a abertura do serviço ao público e a forma de fixação da remuneração.

roman_babakin/freepik
Ação foi ajuizada por empresa de transporte público coletivo contra as fretadoras

Com esse entendimento, a 2ª Vara Cível da Comarca de Caraguatatuba (SP) validou viagens de ônibus com chegada ou partida no município feitas por quatro empresas intermediadas pela startup Buser. A sentença também revogou uma liminar, concedida anteriormente, que proibia as rés de promover viagens nesses trajetos.

Contexto
A Buser é responsável por uma plataforma digital que conecta pessoas interessadas em uma mesma viagem na mesma data com empresas fretadoras de ônibus.

Na ação, uma empresa de transporte público coletivo tradicional alegou que tais empresas não pagam impostos e não têm as autorizações e permissões necessárias para oferecer seus serviços. Após a Justiça conceder a liminar, a Buser pediu o ingresso na ação como assistente das fretadoras.

A startup defendeu que, na sua plataforma, não há venda de passagem individual a preços fixos em rotas predefinidas, mas apenas reunião de pessoas para formar um grupo de fretamento coletivo. Também alegou que arca com milhares de reais em tributos, sem receber subsídios do poder público.

Por outro lado, a autora alegou que há horários, itinerários e preços constantes, que descaracterizam o transporte privado coletivo de passageiros e transformam a atividade das fretadores em transporte público coletivo.

Fundamentação
A juíza Thais Caroline Brecht Esteves considerou que as alegações e os critérios de distinção entre as atividades adotados pela autora não têm respaldo na Lei da Política Nacional de Mobilidade Urbana, de 2012.

Ela explicou que a autora exerce a atividade de transporte público coletivo, que é acessível a toda a população mediante pagamento individual, com itinerários e preços fixados pelo poder público. Já as rés exercem o transporte privado coletivo, que não é aberto ao público e tem características operacionais exclusivas para cada linha e demanda.

Desde 2018, a lei prevê que o serviço de transporte privado individual só pode ser usado por usuários previamente cadastrados em aplicativos ou outras plataformas de comunicação em rede. Na visão da juíza, isso já é suficiente para caracterizar o serviço da Buser como não aberto ao público.

Divulgação/Buser
Buser protagoniza principais
disputas judiciais sobre o tema

A mesma lógica se aplica a outros apps, como Uber, 99, Cabify e Indriver. Segundo Thais, se o raciocínio da autora prosperasse, todas essas plataformas deveriam ser banidas, pois estariam exercendo atividade de táxi irregular.

A lei de 2012 não diz que o preço constante é característica exclusiva do transporte público coletivo. O inciso VI do artigo 4º apenas determina que, nessa atividade, o preço é fixado pelo poder público. Já no transporte privado coletivo, o preço segue a regra geral da livre pactuação entre as partes.

“O avanço tecnológico tem permitido novas formas de exploração de atividades econômicas lícitas que a toda evidência abalam formas tradicionais de prestação de serviços”, assinalou a magistrada. “Uma empresa que explora a atividade de fretamento colaborativo não pode ser, de modo simplista, definida como uma exploradora de transporte público coletivo irregular”.

Guerra jurídica
O fretamento colaborativo no transporte rodoviário de passageiros vem sendo objeto de disputas judiciais em todo o Brasil nos últimos anos. A maioria dos casos dessa “guerra jurídica” é protagonizada pela Buser.

Unidades federativas como o Ceará e o Distrito Federal têm decisões contrárias à atividade da startup. Por outro lado, a empresa concentra decisões favoráveis em estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Santa Catarina.

No último mês de fevereiro, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região autorizou, em todo o país, as viagens de ônibus fretadas em circuito aberto —  ou seja, com um grupo diferente de pessoas nos trajetos de ida e volta — e proibiu a ANTT de autuar e apreender ônibus de viagens interestaduais intermediadas por plataformas como a Buser.

Especialistas ouvidos pela revista eletrônica Consultor Jurídico já apontaram alternativas para encerrar a polêmica envolvendo a Buser: a revisão da regulação (pela via administrativa ou legislativa) ou a fixação de um entendimento vinculante por parte do Supremo Tribunal Federal.

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Processo 1007116-21.2021.8.26.0126

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