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Advogada pediu ajuda para campanha eleitoral a chefes do tráfico, diz PF

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27 de março de 2023, 14h56

A advogada Flávia Fróes, que comanda o Instituto Anjos da Liberdade, esteve na prisão federal de Catanduvas (PR) para pedir apoio de chefes do tráfico de drogas para sua campanha eleitoral a deputada federal em 2022. Concorrendo pelo União Brasil do Rio de Janeiro, ela obteve 1.361 votos e não se elegeu.

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Flávia Fróes pediu ajuda para campanha eleitoral a chefes do tráfico, diz PF
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Ao jornal O Globo, Flávia afirmou que sua principal proposta de campanha era defender os direitos de familiares de presos. Ela também declarou que não recebeu o dinheiro de traficantes para a campanha.

Os pedidos da advogada, feitos em conversa no parlatório da penitenciária, foram gravadas em áudio e vídeo e constam em inquérito da Polícia Federal que apurou a interferência do tráfico e milícia nas eleições de 2022, relevado pelo Globo. Nos presídios federais, todas as conversas entre advogados e clientes são gravadas.

Segundo a investigação, Flávia pediu apoio a Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, chefe do tráfico no Complexo do Alemão, e Fabiano Atanasio da Silva, o FB, que comanda a venda de drogas no Complexo da Penha, ambos na Zona Norte do Rio de Janeiro. Os dois afirmaram que iriam apoiá-la.

A advogada disse a Marcinho VP que iria lutar pelos direitos dos presos. "Eu tô fazendo campanha para ser federal para que a gente efetivamente tenha chance de ter oportunidade de brigar lá em cima, como a gente sempre vem brigando, mas antes com o pires na mão, né."

"Daqui a pouco eu vou perder um advogado e o povo vai ganhar uma parlamentar para defender os direitos do preso", respondeu Marcinho VP.

Além disso, Flávia contou a Marcinho VP que a mulher dele estava apoiando outra candidata, mas pediu que também fosse feita campanha para ela. "Ah, mas dá pra dividir voto, a família é grande pra caramba. Pelo menos 100 votos, só na minha família 100 votinhos sai pelo menos", respondeu o traficante. Conforme a Polícia Federal, o termo "família" refere-se a traficantes da quadrilha de Marcinho VP.

O traficante questiona a advogada sobre quantos votos precisaria para se eleger. Flávia exalta o apoio que o partido vinha lhe dando. "Eles me deram chances reais de ganhar, me deram TV todos os dias, sou a deputada federal que vai ter TV todos os dias, duas vezes por dia, então eu tenho chance com isso", diz.

A advogada ainda perguntou se poderia falar para a família de Marcinho VP que ele a apoiaria. Porém, o traficante resistiu à proposta: "O voto é uma coisa espontânea, cada um vota em quem quer, a minha família tem mais de 100 pessoas, só na Baixada deve ter umas 100."

"Mas posso dizer que tenho seu apoio? Você votaria em mim?", insistiu Flávia. "Pode. Eu votaria, claro que votaria", ele disse.

No mesmo dia, a advogada conversou com Fabiano Atanásio. "Quero seu apoio, da sua família também. Posso dizer que você me apoia? Você vai querer votar em mim?", perguntou Flávia. "Lógico que eu voto pra você (sic)", respondeu o traficante, rindo. Flávia Fróes também pediu apoio a Carlos Eduardo Rocha Freire Barboza, conhecido como Cadu Playboy.

Alegando que não estava conseguindo trabalhar durante a campanha eleitoral, Flávia Fróes pediu dinheiro para Marcinho VP, a título de honorários advocatícios. Ela disse que o valor poderia ser descontado de trabalhos posteriores e solicitou "o valor de um júri". De acordo com a investigação da PF, a advogada já afirmou em entrevista que não faz um júri por menos de R$ 300 mil. Fabiano Atanásio confirmou de que o dinheiro seria repassado a ela e deixou claro que não seria necessário que ela ressarcisse nenhuma quantia.

Outro lado
Flávia Fróes afirmou ao Globo que pediu apoio eleitoral a diversos traficantes. "Minha principal plataforma de campanha era defender os direitos dos familiares das pessoas privadas de liberdade. Nada mais natural do que pedir voto aos familiares, como fiz. Sou, com orgulho, deputada de porta de cadeia, como me intitularam", declarou.

A advogada disse que não recebeu dinheiro do tráfico de drogas para sua campanha. E apontou que o dinheiro solicitado a Marcinho VP era para pagar serviços de advocacia. "Não recebi dinheiro nenhum. Se tivesse recebido, não estaria com dívida de campanha. Na semana passada fui executada em R$ 100 mil por uma gráfica. O partido me deu apenas R$ 150 mil."

Segundo a advogada, o inquérito da PF gerou um processo, na Justiça eleitoral, de inelegibilidade por abuso de poder econômico, que ainda está em tramitação.

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