Opinião

Restituição do indébito via precatório decorrente de mandado de segurança

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25 de maio de 2023, 19h19

A repetição do indébito tributário decorrente de sentença proferida em mandado de segurança é incontroversa no que tange à possibilidade de compensação dos créditos reconhecidos judicialmente, após o trânsito em julgado, com débitos vincendos.

No entanto, a depender dos vultosos montantes de crédito disponível, também é comum que os contribuintes busquem por essa via a restituição em espécie do saldo disponível.

Os Tribunais Regionais, amparados na atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), têm adotado o posicionamento de que "os débitos da Fazenda Pública oriundos de decisão concessiva de mandado de segurança devem ser pagos pelo regime de precatório" (ARE 1.350.473 ED-AgR, 2ª Turma, 20/5/2022), afastando-se, com isso, a possibilidade de restituição do indébito tributário pelas vias administrativas. 

A premissa que fundamenta o entendimento da Suprema Corte é a de que "todo pagamento devido pela Fazenda Pública, em razão de decisão judicial, deve observar o regime de precatório ou de requisição de pequeno valor, conforme o valor da condenação, nos termos do artigo 100 da Constituição Federal" (RE 1405737/ AgR, 2ª Turma, 16.12.22).

Ocorre que o rito do precatório pressupõe a instauração de cumprimento de sentença, que demanda a apresentação de documentação comprobatória dos valores a serem ressarcidos, dentre diversas outras providências até que sobrevenha a sentença impondo à Fazenda Pública o dever de pagamento de quantia certa.

A jurisprudência pátria, no entanto, sempre contou com posicionamento majoritário no sentido de que o cumprimento de sentença é incompatível com o rito célere do mandado de segurança, já que este, inclusive, inadmite dilação probatória.

Este cenário, contudo, foi modificado com o advento do Código de Processo Civil de 2015, que em seu artigo 515, inciso I, conferiu às decisões declaratórias natureza de título executivo, passível de execução nos próprios autos, por meio de cumprimento de sentença.

Neste contexto, a natureza declaratória da sentença mandamental é fato incontroverso, já tendo sido reconhecida pelos Tribunais Superiores, em especial no julgamento do RESP nº 1.111.164/BA. Naquela ocasião foi firmado o entendimento de que a sentença mandamental tem como objeto declarar o direito do contribuinte à repetição do indébito, em virtude do reconhecimento da ilegalidade ou inconstitucionalidade da exigência da exação.

Embora o precedente em questão tenha feito menção específica à declaração do direito à compensação do indébito, no julgamento do RESP nº 1.114.404/MG, o STJ esclareceu que "a opção entre a compensação e o recebimento do crédito por precatório ou requisição de pequeno valor cabe ao contribuinte credor pelo indébito tributário, haja vista que constituem, todas as modalidades, formas de execução do julgado colocadas à disposição da parte quando procedente a ação que teve a eficácia de declarar o indébito".

Este entendimento é suportado, igualmente, pela Súmula STJ 461, segundo a qual "O contribuinte pode optar por receber, por meio de precatório ou por compensação, o indébito tributário certificado por sentença declaratória transitada em julgado".

Diante deste panorama, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em decisões recentes, tem se posicionado pela possibilidade de instauração de cumprimento de sentença em mandado de segurança, para fins de assegurar a repetição do indébito tributário via precatório.

A título exemplificativo, nos autos do Recurso de Apelação nº 5012404-64.2018, a 3ª Turma se posicionou, exatamente, neste sentido, utilizando dos seguintes fundamentos para firmar sua conclusão: 1) a Súmula STJ 461 autoriza o contribuinte a optar por receber o indébito tributário, decorrente de sentença declaratória transitada em julgado, via precatório ou compensação; 2) desde a entrada em vigor do CPC/15, a sentença mandamental passou a integrar o rol de hipóteses passíveis de instauração de cumprimento de sentença, dada a sua natureza declaratória; 3) o rito célere do mandado de segurança resume-se à fase de conhecimento, em razão da impossibilidade de dilação probatória; 4) uma vez proferida a sentença, desaparece a especialidade do rito; e 5) irrazoabilidade de se exigir a propositura de nova ação, de rito ordinário, para ver ressarcido o indébito via precatório.

Inclusive, em sede de embargos de declaração, a Turma rejeitou a tentativa da União Federal de aplicação ao caso concreto das Súmulas 213 STJ (o mandado de segurança não é substitutivo de ação de cobrança) e 269 STF (o mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais pretéritos).

Contudo, é importante mencionar que o entendimento do TRF-3, destacado acima, não é pacífico, havendo outros precedentes que, quando não inadmitem a instauração de cumprimento de sentença em mandado de segurança, restringem o indébito ao período compreendido entre a impetração do writ e o trânsito em julgado.

Tais precedentes, de todo modo, são excelentes indicativos de que a orientação atual dos tribunais sobre a necessidade de ajuizamento de ação ordinária em apartado para pleitear a expedição de precatório decorrente de sentença proferida em mandado de segurança tende a sofrer alterações.

Essa mudança, caso de fato ocorra, mostrará sintonia do Judiciário com o atual ordenamento jurídico pátrio, que privilegia a eficiência e a economia processual.

É primordial que os contribuintes atentem para o fato de que não devem renunciar a pagamentos indevidos discutidos no judiciário apenas em razão de marcos temporais estabelecidos pela inconsistente jurisprudência nacional, sem antes esgotar todas as hipóteses jurídicas possíveis.

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