Crítica nos limites

TJ-BA não vê abuso de jornalista que comparou PMs a 'capitães do mato'

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22 de maio de 2023, 21h22

Sem ofender os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, os meios de comunicação não só podem como devem criticar as instituições públicas.

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Para TJ-BA, apresentadora não se excedeu ao criticar policiais militares
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Com essa fundamentação, a 4ª Turma Recursal do Tribunal de Justiça da Bahia manteve a sentença que negou pedido de indenização por dano moral feito por um subtenente da Polícia Militar. O recorrente se sentiu ofendido em razão de uma apresentadora de TV ter chamado de “capitães do mato” os policiais militares do estado.

“Percebe-se que as falas não foram direcionadas ao próprio recorrente, mas à corporação como um todo, tendo sido apresentadas dentro de um contexto de jornalismo, em que a criticidade às instituições pode e deve ser feita, desde que respeitados os limites da razoabilidade e proporcionalidade”, observou juíza relatora, Mary Angélica Santos Coelho. O recurso inominado foi julgado em 15 de maio.

O autor ajuizou a ação contra a jornalista Jéssica Senra e a TV Bahia, emissora afiliada à Rede Globo, dando à causa o valor de R$ 41,8 mil. Na edição de 6 de fevereiro de 2020 do telejornal "Bahia Meio Dia", a apresentadora emitiu um comentário logo após ser noticiado um caso de racismo cometido por um policial militar contra um adolescente negro, em Salvador.

“Não são casos isolados, são casos frequentes, históricos. É um problema que está no colo do coronel Anselmo Brandão e também no do governador do estado, mas está no colo de todos nós. Historicamente, a polícia nasce dos capitães do mato, aqueles homens que eram pobres, mas eram livres e caçavam escravos fugidos, ou seja, eram homens que defendiam os donos de terras e os latifundiários”, disse a apresentadora.

“Quando a primeira polícia se forma há quase 200 anos, ela vem daí. Oprime pobres e negros para defender brancos e ricos. Isso te soa familiar? Não é o que continua acontecendo? Então, ou a gente encara de frente, ou a gente não vai resolver esse problema”, concluiu Senra.

A sua fala teve bastante repercussão e, na época, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) escreveu em sua conta no Twitter que as declarações dela eram “alucinações de reporterzinha lacradora da Globo”.

O subtenente alegou que, enquanto integrante da Polícia Militar baiana e pessoa de reputação e moral ilibadas, sofreu abalo em sua honra e imagem com o comentário da apresentadora. Além de indenização por dano moral, ele requereu a retratação pública da jornalista.

Em contestação conjunta, a profissional e a emissora defenderam a regularidade de sua linha editorial e, por consequência, a ausência de dano moral indenizável e do dever de se retratar.

Liberdade de expressão
A relatora registrou em seu voto que não vislumbrou “qualquer tipo de exagero” no comentário da apresentadora. Ainda conforme a julgadora, as declarações de Senra foram “justificadas pela publicação no jornal televisivo da emissora de reportagem de uma atuação policial que mostrava um suposto caso de racismo praticado por um policial militar em desfavor de um adolescente na periferia da capital baiana”.

O voto de Mary Coelho foi acompanhado por unanimidade e confirmou na íntegra a sentença do juiz Paulo César Almeida Ribeiro, da 5ª Vara do Sistema de Juizados Especiais de Causas Comuns de Salvador. A prolação da decisão de primeiro grau ocorreu em setembro de 2022.

O acórdão fixou as custas processuais e os honorários advocatícios em 20% sobre o valor da causa, mas ressalvou que a exigibilidade dessas verbas está suspensa em virtude da gratuidade de justiça concedida ao autor/recorrente.

Processo 0040790-13.2020.8.05.0001

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