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Leitura da Bíblia em Câmara Municipal viola a laicidade estatal, diz TJ-SP

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12 de maio de 2023, 11h47

A obrigação de leitura da Bíblia na Câmara Municipal viola os princípios da laicidade estatal, da isonomia e do interesse público. Assim entendeu o Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo ao anular um artigo de uma lei de Engenheiro Coelho que previa a leitura de versículos da Bíblia antes do início das sessões na Câmara.

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ReproduçãoLeitura da Bíblia na Câmara Municipal viola princípios da laicidade estatal e interesse público

Autora da ação, a Procuradoria-Geral de Justiça apontou violação ao princípio da laicidade estatal, "da qual deriva o dever subjetivo público de neutralidade governamental", e alegou que o poder público deve se abster de criar preferência por determinada religião, uma vez que a Constituição aborda a pluralidade de crenças e a liberdade religiosa.

A relatora da matéria, desembargadora Marcia Dalla Déa Barone, concordou com os argumentos e afirmou que o dispositivo violou o princípio da laicidade estatal, que decorre da liberdade religiosa disposta no artigo 5º, inciso VI, da Constituição Federal, afrontando também o artigo 19, inciso I, da Constituição, que é de observância obrigatória pelos entes federados.

"A expressão 'leitura da Bíblia Sagrada' constante no aludido dispositivo contraria os princípios constitucionais da administração pública, notadamente os da isonomia e do interesse público dispostos no artigo 111 da Constituição Bandeirante, correspondente ao artigo 37, 'caput', da Constituição Federal", afirmou a magistrada.

Segundo Barone, embora o ritual de leitura da Bíblia possa ser considerado costume na Câmara, como alegado por seu presidente, já que consta do Regimento Interno desde 1993, "é certo que a liberdade de religião abrange, inclusive, o direito de não ter religião, como bem ressaltado no parecer da Procuradoria-Geral de Justiça".

A relatora afirmou que a liberdade de crença pode e deve ser exercida pelos parlamentares livremente, mas não se pode impor determinada religião como regra dentro da Câmara Municipal, durante as sessões públicas, pois a administração pública não pode impor cultos ou igrejas ou manter com eles relações de dependência ou aliança.

"A exigência de leitura da Bíblia dentro da Câmara Municipal equivale à imposição de determinada religião a todos, em desrespeito aos que não comungam da mesma crença, o que é incompatível com a neutralidade governamental imposta no artigo 19, inciso I da Constituição Federal", concluiu Barone. A decisão foi por unanimidade. 

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Processo 2294098-90.2022.8.26.0000

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