Opinião

Supremo Tribunal Federal retoma julgamento do RE nº 609.096 (Tema nº 372)

Autores

  • Thabitta Rocha

    é advogada tributarista no Martinelli Advogados pesquisadora do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT-Jovem) e do Núcleo de Pesquisas do Mestrado Profissional em Direito Internacional do IBDT (Nupem) MBA em Gestão Tributária pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (USP/ESAlq) e especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (Ibet).

  • Renan Silva Souza

    é especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Ensino Desenvolvimento e Pesquisa (IDP).

10 de junho de 2023, 6h34

A definição do conteúdo da base de cálculo da Contribuição para o PIS e Cofins incidentes sobre o faturamento das instituições financeiras e seguradoras no regime cumulativo, é controvertido desde a edição da Lei nº 9.718/98 e permanece assim com a superveniência da Lei nº 12.973/2014. Isso porque a Lei nº 9.718/98 transpassou o conceito de faturamento, ampliando-o para alcançar todas as receitas da pessoa jurídica  o que ensejou a declaração de inconstitucionalidade do §1º do artigo 3º do diploma legal, à luz da redação original do artigo 195, inciso I, da CF, por parte do Supremo Tribunal Federal.

Considera-se que a superveniência da Lei nº 12.973/2014, editada com amparo na EC nº 20/98 que alterou o artigo 195, inciso I, alínea "a" da CF, tenha conformado sob a ótica constitucional a base de cálculo das contribuições no regime cumulativo. Dois setores econômicos ganham destaque na discussão, as instituições financeiras e as seguradoras.

Em relação à primeira, perdura sem definição a controvérsia sobre a exigibilidade do PIS e da Cofins sobre as receitas financeiras, discutida no Tema 372, suspenso em dezembro de 2022, após o voto do Relator ministro Ricardo Lewandowski.

A despeito de a Lei nº 12.973 ter ampliado a incidência das contribuições, não as fez alcançar todas as receitas auferidas pela pessoa jurídica  como permitiu a EC nº 20/1998 , mas essencialmente aquelas relacionadas com o objeto social. Permaneceu a controvérsia quanto à base de cálculo no período anterior à 2014, em virtude do descompasso entre a Lei nº 9.718/1998 e a Constituição vigente.

O STF, em diversas oportunidades, analisou os conceitos de faturamento e receita bruta, à luz da CF. Na década de 90, a ADC nº 1 foi julgada, sendo ratificado que o conceito de faturamento tinha acepção jurídica específica e consagrada pela legislação tributária como "receita bruta decorrente da venda de mercadorias, de serviços e de mercadorias e serviços". Os REs nº 150.755 e 150.864 concluíram de igual modo.

 O artigo 2º da LC 70/1991 que considerou o faturamento como "a receita bruta das vendas de mercadorias e serviços de qualquer natureza" foi confirmado como compatível com a norma constitucional. Delimitou-se o conteúdo jurídico de faturamento, utilizado na primeira redação do artigo 195 da CF. Contudo, foi publicada a Lei 9.718/1998, fruto da conversão da MP nº 1.724, por meio da qual se alargou o conceito de faturamento.

Em decorrência da mudança, o STF nos REs nº 346.084/PR, 357.950/RS, 390.840/MG e 358.273/RS declarou a inconstitucionalidade do artigo 3º, §1º da Lei nº 9.718/98, na medida em que, ao ampliar a base de cálculo para a totalidade das receitas auferidas, o referido dispositivo excedeu a competência atribuída ao legislador ordinário para fixação da base de cálculo do PIS e da Cofins.

Afastada a incidência sobre a totalidade das receitas, a discussão que passou a ser travada diz respeito à amplitude do conceito de faturamento previsto no artigo 3º, §1º da lei, havendo a corrente suscitada pela Fazenda Nacional no sentido de que a incidência recai sobre a totalidade da atividade operacional (típica) da pessoa jurídica, e a defendida pelos Contribuintes, no sentido de que somente abrangeria as receitas decorrentes das vendas de mercadorias e de prestação dos serviços.

As instituições financeiras passaram a questionar se as receitas das atividades de intermediação financeira e de outras receitas que, no entendimento delas, não corresponderiam a "venda de mercadoria" ou "prestação de serviço" deveriam se sujeitar à incidência das contribuições.

No Carf, a 3ª Turma da Câmara Superior validou a inclusão das receitas financeiras das instituições na apuração da base de cálculo do PIS e da Cofins mesmo no período de vigência da redação original da Lei nº 9.718/98. Segundo o acórdão nº 9303-013.369 [1], as receitas de intermediação financeira de uma instituição bancária estão compreendidas no conceito de faturamento do artigo 3º, §1º, da Lei nº 9.718/98, pois abrangeria a totalidade das receitas das atividades empresariais  não se restringindo à receita de prestação de serviços e de venda de mercadorias. Nesse sentido, o acórdão nº 9303-012.580.

Ainda em 2011, o STF reconheceu a existência de repercussão geral nos autos do RE nº 609.096/RS, interposto contra acórdão do TRF-4 que assegurou o direito a não recolher sobre as receitas financeiras, posto que a exigência das contribuições estaria adstrita à venda de mercadorias ou à prestação de serviços bancários.

A PGFN interpôs Recurso Extraordinário defendendo que: 1) para as instituições financeiras, o faturamento equivaleria à receita operacional; 2) o artigo 72, inciso V do ADCT, ao prever a incidência do PIS sobre as instituições financeiras, teria remetido à legislação do IR a definição do conceito de receita bruta operacional que apresenta conceito mais amplo.

Passados mais de dez anos do reconhecimento da repercussão geral, o julgamento dos REs 609.096/RS, 880.143/MG e 1.250.200/SP foi iniciado em 09.12.2022 na sessão virtual do Plenário do STF.

O ministro Ricardo Lewandowski ressaltou que a indagação está em verificar se as receitas financeiras das instituições financeiras estão abrangidas no conceito de faturamento. Analisou diversos julgamentos que trataram desses conceitos e da receita bruta, a fim de demonstrar as oscilações do STF sobre tema, assim como a existência de correntes antagônicas.

O conceito de faturamento a ser aplicado precisa ser construído pelo cotejo dos julgamentos do RE nº 346.048/PR e da ADI nº 2591/DF. Em análise do RE, o ministro entendeu que o STF estabeleceu como sinônimos a "receita bruta" e "faturamento", por fazerem referência à venda de mercadorias, de serviços ou de mercadorias e serviços, ainda que delas não exista a obrigação legal da emissão de fatura.

Em relação à ADI, afirmou que o Plenário denominou como "consumidor" toda pessoa física ou jurídica que utiliza como destinatário final atividade bancária, financeira e de crédito. Da combinação desses entendimentos concluiu-se que as instituições financeiras oferecem produtos ou serviços, cujas receitas integram o conceito de faturamento, ainda que não demandem a emissão de fatura.

Ora, as instituições financeiras percebem receitas que se amoldam ao conceito de faturamento, oriundo da venda de bens e da prestação de serviços, já que são prestadoras de serviços. Contudo, destacou que a LC 116/2003, artigo 2º, inciso III, por não considerar a prestação de serviço, exclui da incidência do ISS o valor intermediado no mercado de títulos e valores mobiliários, o valor dos depósitos bancários e o principal, juros e mora, referentes a operações de crédito.

Concluiu que não se está eximindo integralmente tais instituições do pagamento do PIS e Cofins, mas somente reconhecendo que o conceito de faturamento não inclui a totalidade de suas receitas operacionais, por abranger apenas aquelas provenientes da venda de produtos, de serviços ou de produtos e serviços. Apenas as receitas brutas da venda de produtos e prestação de serviços poderiam ser incluídas na base de cálculo das contribuições até a edição da EC 20/1998.

Retomado o julgamento, o ministro Dias Toffoli divergiu e propôs a tese: "As receitas brutas operacionais decorrentes da atividade empresarial típica das instituições financeiras integram a base de cálculo PIS/COFINS cobrado em face daquelas ante a Lei nº 9.718/98, mesmo em sua redação original, ressalvadas as exclusões e deduções legalmente prescritas".

Aguarda-se os votos dos demais Ministros e a conclusão do julgamento.

 


[1] Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Acórdão nº 9303-013.369, publicado em 02.01.2023. Disponível em: <https://carf.fazenda.gov.br>. Acesso em: 31.05.2023.

Autores

  • é MBA em Gestão Tributária pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (USP/ESAlq) e especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (Ibet).

  • é especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP).

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!