Opinião

Opinião jurídica e ilicitude

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1 de junho de 2023, 15h16

Encontra-se na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania) da Câmara dos Deputados, com prazo para apresentação de emendas a partir de 18 de maio, o Projeto de Lei 1958/2022, que tem por objetivo alterar o artigo 2º da Lei 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil), incluindo o parágrafo 4º com o seguinte preceito: "Não será imputada responsabilidade ao advogado pela emissão de parecer ou opinião jurídica, salvo se demonstrada a existência de circunstâncias concretas que o vinculem subjetivamente a propósitos ilícitos".

Em sua justificativa, o autor do projeto, deputado federal Valtenir Pereira (MDB-MT), afirma: "Tem-se observado a proliferação de processos penais e administrativos ajuizados contra advogados, sob a alegação de terem concorrido para a prática de atos ilícitos, em razão da elaboração de parecer ou de opinião jurídica, sem que, para tanto, seja demonstrada qualquer circunstância que indique a ocorrência de dolo por parte do parecerista".

Com muita propriedade, o parlamentar argumenta que a emissão de pareceres faz parte do exercício regular da profissão de advogado, "a qual deve ser praticada sem quaisquer embaraços à liberdade técnica do causídico, com pleno respeito às suas convicções".

O acréscimo proposto, portanto, limita a responsabilização do advogado, pela emissão de parecer ou de opinião jurídica, aos casos em que forem comprovadas circunstâncias concretas que o vinculem subjetivamente a propósitos ilícitos.

Como sabemos, o artigo 133 da Constituição preconiza que "o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei". Além disso, a proposta apresentada encontra-se inteiramente de acordo com entendimento pacificado dos tribunais superiores.

O próprio deputado cita decisão do ministro Carlos Velloso nesse sentido. O STF (Supremo Tribunal Federal) vem concedendo habeas corpus, reconhecendo a impossibilidade de se responsabilizar advogado pela simples emissão de parecer ou opinião jurídica.

No mesmo sentido, diversas decisões recentes do STJ (Superior Tribunal de Justiça) fortalecem o preceito da inviolabilidade do advogado parecerista por meros atos e manifestações, no exercício da profissão.

Além do pacífico entendimento dos tribunais superiores, existe manifestação sumulada do Conselho Federal da OAB, que afirma: "Não poderá ser responsabilizado, civil ou criminalmente, o advogado que, no regular exercício do seu mister, emite parecer técnico opinando sobre dispensa ou inexigibilidade de licitação para contratação pelo Poder Público, porquanto inviolável nos seus atos e manifestações no exercício profissional, nos termos do artigo 2º, §3º, da Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da OAB)".

Vale destacar, ainda, proposição do próprio CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público), segundo a qual, "a emissão de parecer-técnico não vinculativo por advogado parecerista não constitui, por si só, crime ou ato de improbidade administrativa, pelo que se recomenda aos membros do Ministério Público que, caso entenda ser a hipótese de responsabilização do profissional, descreva e traga elementos que indiquem a presença do elemento subjetivo do dolo a justificar a sujeição passiva do advogado".

O projeto de lei em questão, portanto, encontra-se na linha da jurisprudência pacificada dos Tribunais Superiores e das orientações do CFOAB e do CNMP, sendo certo que a positivação de tal entendimento em Lei visa a sepultar definitivamente qualquer controvérsia neste tema, desafogando o Judiciário de discussões e ações inócuas.

Poder-se-ia alegar desnecessário o pretendido acréscimo à Lei 8.906/94, sob o argumento de que o proposto no PL 1.958/2022 já estaria contemplado pelo artigo 133 da Constituição e pelo próprio caput do artigo 2º do Estatuto da Advocacia e da OAB. Contudo, o grande número de acusações desta natureza enfraquece o argumento.

Além disso, tratando-se de garantia ao livre exercício profissional e do fortalecimento das prerrogativas do advogado, a repetição é muito bem-vinda. Não se trata de imunidade absoluta para o advogado, mas o parecer não pode ser por si só o elemento que vem gerar a acusação.

Como medida extremamente positiva para o livre exercício da advocacia, a proposta de alteração do Estatuto da Advocacia, para proibir a responsabilização do advogado motivada pela emissão de parecer ou opinião jurídica, recebeu o apoio do IAB  (Instituto dos Advogados Brasileiros) — entidade jurídica mais antiga das Américas, que em agosto completará 180 anos de fundação.

Autores

  • é sócio fundador do escritório Carlos Eduardo Machado Advogados, 3º vice-presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), presidente do Grupo Brasileiro da Associação Internacional de Direito Penal (AIDP) e conselheiro efetivo da Seccional do Rio de Janeiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RJ).

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